O tema era o desafio das democracias, e Adolfo Mesquita Nunes, ex-vice-presidente do CDS e um dos políticos mais próximos de Assunção Cristas, avisou desde logo que não iria fazer comentários sobre o seu partido ou a campanha eleitoral que está em curso — caso contrário não teria aceitado participar como orador na universidade de verão de um partido que não é o seu. Mas, ao lado de Miguel Poiares Maduro, com quem partilhou o executivo no tempo em que um era Secretário de Estado do Turismo e outro ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional, o adversário comum aos ex-parceiros de coligação não escapou a críticas: o PS e o governo de António Costa que, a avaliar pela mais recente sondagem divulgada pelo JN e TSF, pode mesmo estar em vias de ter uma maioria absoluta. Ali não há “boa memória” da única maioria absoluta do PS e, ao contrário do que acontecia até há pouco tempo, o nome de José Sócrates ouviu-se várias vezes na sala.

“O PS exerce absolutamente o seu poder. Sempre [com ou sem maioria absoluta]. Com maioria absoluta, exerce duplamente de forma absoluta o seu poder. E é para mim surpreendente a possibilidade de se ver com candura ou complacência uma maioria absoluta do PS, que já exerce de forma absoluta mesmo quando não tem maioria”, disse Adolfo Mesquita Nunes na sequência de uma pergunta de um jovem social-democrata sobre como a corrupção afeta a democracia, e já depois de Miguel Poiares Maduro ter “nacionalizado” o debate ao criticar o facto de não haver hoje consequências políticas (à parte das judiciais) da Operação Marquês (processo em que José Sócrates foi acusado de corrupção). Estava lançado o rastilho para ambos recordarem a “má memória” da maioria absoluta do ex-primeiro-ministro socialista.

No mesmo dia em que José Sócrates escreve um artigo no jornal Expresso a acusar a atual liderança socialista de “diabolizar os seus próprios governos”, tanto o ex-dirigente centrista como o ex-ministro social-democrata partilharam da opinião de que a “soberba” de António Costa na forma de governar não pode trazer vantagens para a democracia. Poiares Maduro foi cuidadoso na escolha das palavras: “António Costa não é um grande político, é um político com muito sucesso”, e as duas coisas são diferentes. Porquê? Porque “a habilidade na política pode ser uma vantagem mas não deve ser confundida com uma virtude”, disse, defendendo que o propósito último de um político não deve ser apenas o sucesso da vitória eleitoral.

Também Poiares Maduro, professor universitário e amigo próximo de Passos Coelho, alertou contra “qualquer projeto de poder que implique domínio do Estado”, seja à esquerda ou à direita. E também aí levou para a mesa o nome do ex-ministro José Sócrates. “A democracia não existe sem verdade. Mas mesmo em democracia pode haver uma corrosão da democracia na medida em que há corrosão no processo de definição da verdade e do pluralismo, seja através de processos de ocupação do Estado, ou seja através de monopólios da comunicação social, como tivemos em Portugal, penso que hoje já é claro, na época de Sócrates”, afirmou.

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Segundo Adolfo Mesquita Nunes, a culpa é também de quem foi cúmplice ou complacente perante um conjunto de práticas ditas duvidosas: “A única maioria absoluta que o PS teve não é de boa memória, e não o é apenas pelo caos financeiro em que ficou o país. Não é de boa memória porque quem devia ter denunciado não denunciou, quem devia ter falado não falou, e quem devia ter travado não travou”, disse.

Para Adolfo Mesquita Nunes, que deixou recentemente a vice-presidência do CDS para assumir um cargo nao-executivo na Galp, há outro fator a ser tido em conta no combate aos comportamentos corruptos na democracia: a “exigência dos eleitores deve aumentar”. “Para que as instituições democráticas trabalhem e funcionem, é essencial que haja um aumento da exigência dos eleitores, que tenham capacidade de rejeitar determinado tipo de comportamentos”, disse, sublinhando que esta mudança tem de começar nos partidos mas também passa pelos eleitores. “Há coisas em Portugal que se passam porque as pessoas não se importam, e é por isso que o nível de exigência tem de subir”, insistiu ainda.

A universidade de verão do PSD decorre esta semana em Castelo de Vide e termina este domingo com uma intervenção do presidente do partido Rui Rio. Antes, este sábado, Rui Rio estará na festa do Pontal, em Monchique, onde fará um discurso político de arranque da pré-campanha eleitoral.