Uma equipa de investigadores da Universidade de Trás os Montes e Alto Douro identificou como é que a ligação entre duas moléculas serve de interruptor para a multiplicação das células ou a seu suicídio (apoptose), processos “basilares para a origem do cancro”, explica ao Observador Raquel Chaves, a coordenadora da investigação.

A descoberta, já publicada na revista científica Cellular and Molecular Life Sciences, pode vir a abrir mais um caminho para se perceber como é que as células cancerígenas são tão bem sucedidas a proliferar no organismo.

No centro da descoberta está um complexo celular que, quando junta informação genética com uma proteína específica, age sobre a multiplicação das células e sobre o seu “suicídio programado”, ou apoptose. O suicídio das células é uma característica que lhes permite ter um “tempo de vida”, evitando que se multipliquem e proliferem sem controlo — evitando, assim, que se formem tumores.

O que é que se descobriu de novo?

A equipa do grupo de Citogenómica e Genómica Animal já sabia que a sequência de ADN estudada estava bastante repetida em várias espécies, desde a mosca da fruta até ao ser humano, passando pelo rato e pelo gato. Também sabia que a sequência dava origem a um RNA (molécula temporária e instável para a qual é traduzia informação do ADN) que, por sua vez, interagia com uma proteína específica chamada PKM2. Não sabia, no entanto, qual era a função e o processo a que estava associado esse “casamento”, o complexo RNA-proteína.

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Veio a determinar, com experiências feitas em células humanas e de gato, que o complexo atua sobre a multiplicação celular e sobre o suicídio programado das células.

“Quando temos a proteína associada a esse RNA, a célula multiplica-se. Quando inativamos este RNA, a célula entra em apoptose” e, portanto, morre, explica ao Observador Raquel Chaves, a coordenadora da investigação.

Para já, não está comprovada a associação deste “casamento” RNA-proteína com o cancro, mas sabe-se que age diretamente com processos que são “uma via extremamente importante no cancro”, conclui Daniela Ferreira, outras das investigadores do estudo.

Se assim for, existe a possibilidade de poderem contribuir para tratar a doença, no futuro. Por isso, a equipa já começou a estudar as implicações que o processo poderá ter no surgimento de um tumor.

Desde janeiro que o objetivo é “tentar perceber se a célula entra em apoptose (suicídio) quando desativamos um dos elementos” do “casamento”, seja ele a proteína ou a sequência de RNA, refere a investigadora e professora de genética Raquel Chaves. Agora a equipa concentra-se apenas em células humanas cancerígenas de vários tipos de tumor, como o da mama, o do fígado ou o do útero.

“A parte mais difícil da descoberta já está feita”, sublinha Raquel Chaves, a chefiar a equipa dedicada aos estudos sobre evolução e cancro. O trabalho teve ainda a colaboração do grupo do Centro de Neurociências da Universidade de Coimbra, liderado pelo investigador Bruno Manadas.