Foram precisos 41 anos de viagem. Mas faz esta terça-feira um ano que, quando estava a 18 mil milhões de quilómetros da Terra, a Voyager 2 sentiu um salto nos seus sensores. De repente, a sonda da NASA deixou de estar protegida pelo plasma quente e fraco gerado pelo vento solar e foi atingido pelo plasma frio e denso que fica além de tudo isso. Tinha entrado no espaço interestelar. O feito, único, foi notícia na altura Mas só agora a revista Nature Astronomy publicou uma série de artigos que descrevem em detalhe essa etapa histórica com as mensagens que foram enviadas desse além.

A primeira nave a passar a bolha magnética que rodeia o sistema solar, a heliosfera, foi a Voyager 1, em 2012. Mas como tinha os detetores de plasma avariados, pouco se soube de como o fez. Com o seu irmão gémeo, tudo aconteceu de forma diferente. E os artigos agora publicados na revista científica permitem aos cientistas saber ao pormenor vários detalhes sobre a pequeníssima parte do Universo em que vivemos: a heliosfera, por exemplo, essa região de fronteira, é maior que a distância que separa a Terra do Sol. Depois dessa área em que o plasma diminui, aquece e fica mais denso, aparece uma borda mais fina, que a nave superou em menos de um dia, na qual o campo magnético é mais intenso. E é, então, que o meio interestelar começa.

É possível também pôr fim a algumas ideias erradas. Por exemplo, o vento solar não se extingue à medida que entramos no espaço interestelar. E há uma fronteira clara entre o nosso sistema solar e o que fica para além dele: fluídos, incluindo plasmas, formam esses limites bem definidos.

A Voyager 1 deixou a heliosfera a uma distância de 122 unidades astronómicas do Sol (uma unidade astronómica é igual à distância que separa o Sol da Terra). Já a Voyager 2, lançada alguns dias antes – e que se tornou a sonda ativa mais veterana da exploração espacial – ficou a 119. Apesar de serem as sondas mais distantes da Terra, já que nenhuma outra chegará lá pelo menos nos próximos 25 anos, não se pode dizer ainda, de facto, que tenham deixado o sistema solar. Estão nos seus limites. A NASA acha mesmo que ainda está longe de alcançar esse feito: a fronteira, marcada pela influência gravitacional do Sol, está localizada na borda externa da Nuvem de Oort, uma região gigantesca de objetos gelados que fica a cerca de mil unidades astronómicas do Sol e se estende até cem mil. A Voyager precisará de mais 300 anos para lá chegar. Só que, nessa altura, o seu combustível nuclear estará esgotado há mais de dois séculos.

Mas os cientistas estão a extrair o máximo de informações que as Voyager 1 e 2 continuam a enviar do meio interestelar. As duas missões levam informações da civilização terrestre a bordo, caso um dia encontrem alienígenas inteligentes, e recolhem informações no terreno para reconstruir a estrutura da fronteira solar. Essas informações serão complementadas pelas observações da sonda IBEX (Interstellar Frontier Explorer), que estuda a região da órbita da Terra, ou a IMAP (Sonda de Aceleração e Cartografia Interestelar), cujo lançamento está previsto para 2024.

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