O contrato de serviço público assinado entre o Estado e a CP vai permitir “mais transparência, qualidade e rigor e uma interação com a empresa mais saudável”, defendeu o secretário de Estado das Infraestruturas. Em entrevista à Rádio Observador, no programa Direto ao Assunto, Jorge Delgado defende que a empresa está preparada para cumprir as obrigações de serviço público. E agora passará não a ter todo o dinheiro que quer, mas o que precisa.

Jorge Delgado: “A CP tem o dinheiro que precisa de ter”

São 90 milhões de euros a partir de 2020, um valor que poderá baixar — essa é a expetativa do Governo — a partir de 2024, quando for concluído o plano de investimentos previsto. Jorge Delgado anuncia ainda mais composições, renovadas, para a Linha de Sintra já no próximo ano, e um plano em estudo para comprar novo material circulante para a Linha de Cascais. E confirma que o grupo Barraqueiro vai explorar o comboio na Ponte 25 de Abril por mais alguns anos, como forma de compensar a Fertagus por decisões do Governo que lhe retiram receitas.

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O secretário de Estado das Infraestruturas afirma ainda que alguma já mudou no estado da ferrovia. Jorge Delgado lembra que o último verão já foi melhor que o de 2018, que foi muito mau a nível do serviço ferroviário. E houve menos supressões, porque foram tomadas algumas medidas, a nível do material circulante. Este, reconhece, é o maior problema da CP. A fusão da Emef, empresa de manutenção, com a CP, está dentro do calendário e aguarda o parecer do Ministério das Finanças.

Comboios “encostados” da CP. “Podemos estar a falar de 20%” da frota total

“Temos comboios muito velhos, com 50 a 60 anos e esta frota que herdamos tinha algum abandono#. O contrato assinado com a CP inclui por isso o investimento de 45 milhões de euros, já anunciado, para reabilitar material que está “encostado”, sem utilização e é para implementar até 2023. Jorge Delgado espera que nessa data seja possível dar um salto de qualidade para “níveis que consideramos aceitáveis”. O secretário de Estado nunca viu os números escritos, mas num cálculo feito neste entrevista admite que as carruagens, locomotivas e automotoras encostadas sejam 40 a 50 num universo de 200 a 250. “Podemos estar a falar de 20%” da frota da CP indisponível.

Para além da reabertura da oficina de Guifães, o plano de reforço da capacidade de manutenção passa ainda por contratar mais pessoal para a Emef, a empresa de manutenção da CP. Jorge Delgado diz que essa contratação está em curso, mas não sabe dizer quantas pessoas já terão entrado, talvez uma dezena, admite. O secretário de Estado das Infraestruturas confirma ainda o calendário de fusão da Emef na CP, que deverá estar operacional no início do ano. O processo aguarda ainda pelo Ministério das Finanças, “mas não estamos a antever dificuldades que comprometam esse objetivo”.

E a CP tem todo o dinheiro que precisa? “Ninguém tem o dinheiro que gostava de ter , é uma realidade dura, mas  a CP tem o dinheiro que precisa de ter”, garante Jorge Delgado. Esta garantia tem como referência o contrato assinado com o Estado e que irá produzir efeitos a partir de 2020, já que até agora, as necessidades financeiras da CP eram satisfeitas “aos solavancos”.

Regulador avisa CP. Falhas graves no serviço podem levar à suspensão do contrato de serviço público

No primeiro ano serão 90 milhões de euros, mas o valor vai variar. Pode ser um até pouco maior nos primeiros anos, segundo as simulações apresentadas pela empresa, mas deverá baixar depois de executado o ciclo de investimento de 45 milhões de euros, a partir de 2024. “Esperamos que a empresa tenha muito sucesso e que estes números sejam ainda mais reduzidos”. De fora do contrato, válido por dez anos, está o investimento de 168 milhões de euros para a compra de novos comboios para o serviço regional.

O que está contratado é uma metodologia do cálculo da compensação, que permite apurar os custos de operação do serviço público que o Estado exige e a receita que é possível nos bilhetes. A fórmula vai incluir os investimentos autorizados pelo Estado e uma margem de lucro para a CP, de 5%, que é obrigatória pelas boas práticas europeias, acrescenta Jorge Delgado.

O serviço regional oferecido em linhas como Oeste, Douro ou Minho, e alguns intercidades, são os serviços públicos deficitários que serão compensados com os 90 milhões de euros. Já as linhas suburbanas de Sintra, Cascais e do Porto, bem como o Alfa Pendular, são rentáveis. Questionado sobre se os preços praticados em alguns serviços não serão demasiado baixos, o secretário de Estado refere que essa não é a questão, mas sim as opções do Governo de reforçar o transporte público, como a redução extraordinária dos passes de abril deste ano.

Houve um aumento de 40% na utilização da ferrovia, mas Jorge Delgado reconhece que também há falhas do lado da oferta e anuncia reforços do investimento para as linhas de Sintra e de Cascais. No primeiro caso, serão recuperadas seis unidades quádruplas e mais duas, o que permitirá já em 2020 aumentar a oferta em 13% na linha de Sintra. Na linha de Cascais, retoma o projeto de 50 milhões de euros — o investimento já está previsto há vários, mas só em setembro foi apresentada a candidatura ao programa de fundos comunitários PO SEUR — para mudar a tensão elétrica usada nesta linha e permitir a circulação de outros comboios. O secretário de Estado revelou ainda que está a ser estudado um plano de compra de material circulante novo, mas sem avançar datas.

“Há investimentos previstos nestas linhas. Não queremos prestar um serviço deficiente, mas temos de pedir às pessoas alguma paciência. Não conseguimos, de um dia para o outro, ir a um stand comprar comboios”.

Não chegou qualquer intenção de privados de operar outras linhas, para além do comboio na ponte 25 de abril.

Fertagus vai ter mais anos de concessão

Sobre a Fertagus, Jorge Delgado confirma que a intenção do Governo é a de prolongar o prazo de concessão atribuída ao grupo Barraqueiro, e que terminaria este ano, de forma a compensar financeiramente a empresa que explora o comboio na ponte. Em causa estão medidas do Governo que reduziram a remuneração do operador privado, como a proibição de mexer nos preços dos bilhetes, o aumento taxa a pagar pelo uso da infraestruturas ou o recente desconto dos passes sociais. O resultado da negociação com o grupo privado está no Ministério das Finanças e o secretário de Estado confirma que o prolongamento do prazo da concessão à Fertagus “é da escala dos anos”.

Confrontado com as queixas do regulador, a Autoridade da Mobilidade e dos Transportes, para a falta de recursos humanos, Jorge Delgado sublinha que a AMT até tem os recursos humanos que necessita, mas estes não são do seu quadro de pessoal, mas sim emprestados por outros organismos públicos. É um problema que é preciso resolver, mas que é menor. A AMT, acrescenta, tem feito um trabalho fantástico, “foram incansáveis” na preparação do contrato da CP e deram o parecer muito rapidamente, mas têm de se acostumar a picos de trabalho.

Jorge Delgado está na pasta das infraestruturas desde fevereiro de 2019, quando o ministério passou para as mãos de Pedro Nuno Santos. Antes foi presidente da Metro do Porto, empresa que tal como a Carris e o Metro de Lisboa, não estão debaixo da sua competência, são da tutela do Ministério do Ambiente. E que marca gostava de deixar no final da sua passagem pela pasta?

“Poder dizer que temos uma ferrovia estabilizada, com comboios que chegam, de preferência a horas, com conforto e limpos”.