O rapper e produtor musical português Allen Halloween, cujo nome de batismo é Allen Pires Sanhá, anunciou esta sexta-feira o fim de carreira na música. Num post publicado nas redes sociais, entretanto apagado no Instagram juntamente com a conta, Halloween, que tinha anunciado nos últimos anos por diversas vezes a intenção de vir a deixar de fazer música, começa por dizer: “Durante anos, tentei fazer música e servir a Jeová ao mesmo tempo mas isso…isso sempre foi uma tarefa impossível para mim. Eu amo demais! Não consigo fazer nada por metade. Não consigo estar envolvido em nada que não seja a 100%”.
Então entendi que nenhum escravo pode servir a dois senhores ao mesmo tempo; ele acabará sempre por apegar-se mais a um e desprezar o outro. Eu tenho vindo a desprezar o meu Pai há muito tempo e não o farei mais. Anuncio aqui, o fim da carreira de Allen Halloween“, aponta de seguida.
Admitindo que este é um assunto no qual tem “pensado muito” ao longo de “todos estes anos”, o rapper prossegue dizendo: “Finalmente tenho coragem e fé para resolvê-lo. Peço a todos que respeitem a minha decisão e que quando me virem por aí, não me chateiem mais com coisas do Halloween. O Halloween morreu. Acabou! Tornarei-me um homem simples e humilde, com um emprego humilde e guardarei todo o meu tempo para pescar almas para o meu Senhor. Agradeço a Deus por Ele me ter dado tempo para fazer tudo o que quis fazer e por nunca me ter abandonado”.
Aos ouvintes, o autor de discos como Projecto Mary Witch, A Árvore Kriminal, Híbrido e Unplugueto, deixou uma palavra de agradecimento: “Agradeço a todos aqueles que sempre me apoiaram, desde o primeiro dia. Aqueles que faziam centenas e centenas de km para me ver, para me ouvir. Foi forte! Foi puro! Foi lindo! Sem esquemas, sem truques! E que ninguém fique triste porque eu estou feliz. Eu vou para um lugar muito melhor, melhor do que todos aqueles que os meus olhos viram até hoje. Um lugar onde eu realmente me sinto em paz”. A mensagem termina com as frases: “Rapazes e raparigas, abraço grande do Original KAPPA, esta é a minha paragem. Fui. ‘ESTÁ CONSUMADO’”.
Quer a publicação quer a página do rapper e produtor musical na rede social Instagram foram entretanto apagadas. Allen Halloween tinha editado recentemente um livro com as suas letras (intitulado Livre Arbítrio, também título de uma canção sua, e apresentado na Galeria Zé dos Bois, em Lisboa, ainda este mês) e um disco semiacústico chamado Unplugueto. Tendo começado a escrever rimas ainda nos anos 1990, Halloween editou o primeiro álbum, Projecto Mary Witch, em 2006.
Com uma sonoridade crua e descritiva daquilo que viveu e a que assistiu enquanto crescia no bairro degradado do Barruncho, em Odivelas, com influências do hip-hop mas também do rock e grunge, Halloween foi depurando a linguagem e a produção musical nos discos seguintes, mantendo a voz rouca e cavernosa mas contando também a história de como foi passar de uma vida de marginalidade e crime para uma vida de fé e exemplo, sem esconder as tensões permanentes da mudança e as tentações do regresso à antiga vida.
A Árvore Kriminal, editado no início da década (2011) e Híbrido, lançado em 2015, figuraram em várias listas de melhores discos de 2011 e 2015 de publicações musicais de especialidade e de jornais generalistas, como a Blitz e o Público, que elegeu Híbrido como o 5º melhor disco de 2015, a seguir a To Pimp a Butterfly de Kendrick Lamar, Sometimes I Think… de Courtney Barnett, Romance(s) de Aldina Duarte e At Least For Now de Benjamin Clementine.
Este verão, o rapper atuou no festival NOS Primavera Sound, no Porto. Em Lisboa, chegou a atuar em festivais como o Vodafone Mexefest (hoje Super Bock em Stock) e o Iminente, em Monsanto, mas também em salas como a Galeria Zé dos Bois, Cinema São Jorge e Musicbox. Para além disso, foi atuando na última década e meia um pouco por todo o lado, de norte a sul do país, granjeando uma popularidade nacional e obtendo reverência também dos seus pares, como Sam the Kid, que chegou a elogiá-lo publicamente pelo talento de escrita.