Um post escrito no domingo passado, onde Paulo Pedroso dizia de passagem que já não era militante do PS, enquanto criticava a falta da presença sindical no partido, fez levantar dúvidas sobre o seu posicionamento político nesta fase. Houve bruaá q.b., tanto que o antigo ministro veio esta terça-feira explicar que não tem segundas intenções e que não quer ver crescer o “facto político” que surgiu depois da sua publicação. Eduardo Ferro Rodrigues, presidente da Assembleia da República e de cuja direção socialista Pedroso foi porta-voz, lamenta a decisão.
“Não entrei em ruptura com o líder do PS nem em divergência ideológica global com o partido”, garante Pedroso, novamente através da sua página no Facebook. O que tem, garante, são “diferenças de opinião”, no caso concreto sobre a relação do partido com os sindicatos. E agora que vai regressar a Portugal, deixando a administração do Banco Mundial, decidiu expor as suas opiniões “individuais, livre de qualquer fidelidade ou disciplina partidária”. No entanto, admite ter tido “tentações de voltar à política”. Ao Observador, confirma que deixará o Banco Mundial a meio de fevereiro, porque se tinha “comprometido a ficar dois anos”. Explica que sai “um mês antes porque começam as aulas do segundo semestre no ISCTE”, onde é professor.
Aquele que é considerado por muitos um pai político de Pedroso — afinal, foi sob a sua batuta ministerial que Paulo Pedroso se estreou em funções governativas, como seu secretário de Estado do Emprego e Formação — lamenta a saída do partido. Ao Observador, Ferro Rodrigues, atualmente presidente da Assembleia da República, não fala sobre a opinião expressa por Pedroso sobre o caminho atual do PS, nem sobre a decisão de sair do partido — a qual só conheceu esta segunda-feira, garante. “Lamento e espero que tenha muitas felicidades no futuro. E isto não é uma fórmula, é o meu desejo profundo”.
Quanto ao futuro de Pedroso — que já algumas contas apontavam ser de distanciamento com o PS, onde militou, foi dirigente e ministro no segundo Governo de António Guterres — é o próprio ex-socialista que vem garantir: “Fui, sou e serei um socialista democrático, não estou em trânsito para nenhum outro espaço político nem desconfortável com este espaço”.
“Não há nenhuma ruptura, nenhum drama, apenas a decisão de que não é no quadro partidário nem balizado por ele que tenho a intervenção que decidir ter“. Isto depois de duas críticas de rajada à linha de António Costa. A primeira foi no final da semana passada, altura em que comentou o parecer do Tribunal de Contas que contrariou uma decisão do ex-ministro socialista Vieira da Silva e de Fernando Medina pelo acordo para a venda de 11 imóveis abaixo do valor das avaliações da própria Segurança Social, para arrendamento acessível.
Ex-ministro socialista critica Vieira da Silva e Medina por negócio de venda de imóveis
A outra surgiu no domingo, na reação à saída de Carlos Silva da liderança da UGT, desta vez mais direta a António Costa, nomeando-o sem rodeios: “O desinteresse do PS pelo sindicalismo que se agravou desde que António Costa é secretário-geral e primeiro-ministro é motivo para quem não quer a desinstitucionalização das relações laborais pensar que via socialista é esta que a direção do PS de António Costa adotou, mas que ainda está muito a tempo de corrigir, no partido e no governo, embora já não na representatividade parlamentar.” Foi neste post que pareceu lançar uma ponte para outra empreitada, longe do PS. Mas agora diz que foi antes o atravessar de “uma ponte para outro tipo de intervenção cívica”. “Nada mais, para alívio de alguns e desilusão de outros”, deixa ainda em jeito de provocação.
Na atual ala mais à esquerda do PS — que Paulo Pedroso também já representou em tempos e, em 2010 (bem antes da “geringonça”), até foi a umas jornadas parlamentares do partido defender que o PS tem que saber manter aliados à esquerda — a saída do partido foi vista com curiosidade. Um socialista dessa ala comentou com o Observador parecerem-lhe “pouco” as “matérias identificadas” no post para justificarem a decisão de sair. “Não é claro que seja esta a razão de saída do PS”, acrescentou. No regresso a Portugal, Pedroso diz que se dedicará “essencialmente” à vida académica.