A Comissão de Assuntos Constitucionais responde na quarta-feira às dúvidas manifestadas pelo presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, sobre a conformidade à Constituição do projeto do Chega que pretende instituir a castração química.
Numa carta divulgada esta quinta-feira e que foi dirigida ao presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, o social-democrata Luís Marques Guedes, Ferro Rodrigues solicitou que se esclareça “com muita urgência” se se considera que as “dificuldades manifestas” de natureza constitucional identificadas por essa mesma comissão parlamentar “são ultrapassáveis no decorrer do processo legislativo” ou não.
Ferro pede esclarecimento “muito urgente” sobre projeto do Chega de castração química
O projeto do Chega, que propõe o agravamento de penas para crimes de abuso sexual de crianças e uma pena acessória de castração química, está agendado para debate em plenário no próximo dia 28.
Na sequência desta carta de Ferro Rodrigues, o presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais requereu já à deputada socialista Cláudia Santos que faça uma adenda ao seu anterior parecer sobre as condições de admissibilidade para o diploma do Chega poder subir a plenário, respondendo objetivamente às questões formuladas pelo presidente da Assembleia da República.
Cláudia Santos, deputada do PS eleita por Aveiro, deverá entregar essa adenda ao parecer até terça-feira a todos os deputados que fazem parte da Comissão de Assuntos Constitucionais, de forma a que a discussão se faça em reunião no dia seguinte, na quarta-feira.
Na carta dirigida ao antigo ministro Luís Marques Guedes, o presidente da Assembleia da República refere que, através de um seu anterior despacho, admitiu o projeto de lei em causa, que baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
“Neste despacho, e embora reconhecendo, em linha com a prática dos presidentes que me antecederam neste cargo, que o poder de rejeição de iniciativas é absolutamente excecional, suscitei dúvidas acerca da conformidade do teor desta iniciativa com a Constituição da República Portuguesa. Por ofício de 12 de fevereiro de 2020, veio a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias enviar o parecer relativo ao Projeto de Lei n.º 144/XIV/1.ª (CH)”, relata.
Nesse parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, segundo Ferro Rodrigues, “contrariamente ao que é prática habitual”, as conclusões “não se pronunciam relativamente ao cumprimento dos requisitos constitucionais e regimentais para que a iniciativa seja discutida e votada em plenário”.
De acordo com fonte da Comissão de Assuntos Constitucionais, “do ponto de visita estritamente técnico, a inconstitucionalidade claramente presente no projeto do Chega pode ser expurgada, caso o deputado do Chega, André Ventura, aceite retirar do seu diploma a pena acessória que pretende instituir a castração química”.
“No entanto, é preciso saber se esse deputado aceita retirar essa pena acessória, mantendo as restantes normas em que propõe um agravamento generalizado das penas por crimes sexuais. Por outro lado, do ponto de vista político, importa aferir se a questão da castração química é ou não o ponto central do diploma”, referiu à agência Lusa o mesmo deputado da Comissão de Assuntos Constitucionais,
Na carta que dirigiu a Luís Marques Guedes, Ferro Rodrigues salienta que, na quarta-feira, “a conferência de líderes acordou, unanimemente, no sentido de o presidente da Assembleia República obter esclarecimentos junto da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, nomeadamente atendendo às considerações tecidas no parecer” já emitido.
Também na quarta-feira, ao fim da tarde, o deputado único do Chega, André Ventura, afirmou que iria pedir uma “reunião de emergência” ao presidente da Assembleia da República caso o diploma que prevê a castração química para agressores sexuais de menores não fosse discutido em plenário.
A reação do deputado surgiu horas depois de a conferência de líderes parlamentares ter decidido pedir uma clarificação do parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, que não concluiu pela sua inconstitucionalidade – apesar de todos os partidos ali representados terem defendido esta tese.