Desde a passada sexta-feira que Nelson Novais e outros trabalhadores da Mosano, uma empresa de desenvolvimento de plataformas web em Matosinhos, não têm tido mãos a medir. As horas de sono são poucas, o trabalho é muito, mas com um único objetivo: ajudar na luta contra o surto do novo coronavírus. Para isso, e fazendo uso da tecnologia, a equipa de Nelson criou a CovidApp, uma plataforma gratuita que permite a cada pessoa monitorizar os sintomas em casa e, assim, ajudar o Serviço Nacional de Saúde na distinção dos casos de risco que precisem, efetivamente, de ir para um hospital.

A ideia, explica Nelson Novais ao Observador, começou com uma preocupação vinda da comunidade médica: “Um colega que trabalha no hospital de Santo António disse-me que está bastante preocupado com o que está a acontecer a nível desta epidemia. Perguntei-lhe o que é que poderia fazer. Ele respondeu que, para controlar a gestão e a afluência das pessoas que se dirigem aos serviços de urgência num futuro próximo, teriam que fazer a monitorização dos doentes através de alguma coisa”. A partir daqui nasceu o desafio.

Nelson falou com os colegas da empresa, todos eles informáticos, e decidiu colocar todos os esforços possíveis na construção e desenvolvimento de uma aplicação que ajudasse tanto profissionais de saúde como a própria população na luta contra a Covid-19. Depois de reunir com vários médicos as informações que estes profissionais de saúde precisam de saber, nasceu a CovidApp.

Para já, a plataforma está disponível apenas online e em processo de obter autorizações das entidades públicas. Depois de fazer o registo, o utilizador deve indicar algumas informações sobre a sua saúde, como a temperatura corporal, os ciclos respiratórios, o nível de tensão arterial, se tem diabetes ou outras patologias associadas e indicar ainda a data de início dos sintomas, se possui outros sintomas ou se o estado atual melhorou ou piorou relativamente à última submissão. Ao longo do dia, os utilizadores devem indicar mais do que uma vez a evolução destes componentes.

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“Com esses dados recolhidos vai ser alimentado um algoritmo de inteligência artificial que vai começar a classificar, com base nos sintomas, o risco que as pessoas estão a correr naquele momento”, explica Nelson. De seguida, e baseado nessa informação, se o utilizador estiver em risco vai receber uma notificação para entrar em contacto com o serviço de saúde. “Ao mesmo tempo, vamos alertar os serviços de saúde que aquela pessoa está em risco”, acrescenta.

Com esta monitorização e controlo torna-se possível gerir o fluxo de pessoas nos hospitais: “Os médicos já têm poucos recursos nos hospitais e se toda a gente for para lá, eles não vão conseguir atender toda a gente e vai ser um problema. Esta plataforma é, essencialmente, para isso: para gerir este fluxo, conseguir monitorizar as pessoas em casa e, no caso de estarem a correr algum risco, serem contactadas e serem ajudadas pelos meios de saúde”.

Esta é uma doença que afeta mais as pessoas a partir de determinada idade e esta é uma plataforma para também evitar que se dirijam ao hospital, porque elas podem gerir a doença em casa, fazendo uma quarentena e colocando lá os seus sintomas. Assim, vamos fazer com que a afluência aos hospitais seja menor e que não se tornem num foco da epidemia”, explica ao Observador o responsável pela CovidApp.

Os dados e a procura de apoios institucionais

Quando o utilizador se regista nesta plataforma, e além de algumas informações sobre o estado de saúde, são pedidos alguns dados pessoais como o número de telemóvel e o número do cartão de cidadão. O facto de serem dados mais sensíveis pode tornar a tarefa mais difícil. No entanto, garante Nelson, estas informações são solicitadas apenas para permitir que os sistemas de saúde consigam entrar em contacto com o utilizador caso exista algum tipo de risco.

Nós, como empresa e como entidade que desenvolveu o projeto, não queremos fazer nada com os dados. Temos acesso à base de dados, mas de uma forma encriptada: só sabemos o número de registos. Podemos providenciar aos médicos um acesso de administrador para eles verem os relatórios e depois também ligamos às entidades para enviarem notificações a dizer que um determinado doente está com problemas e para entrarem em contacto. E eles começarem a tomar decisões”, clarifica o responsável.

O próximo passo desta plataforma passa precisamente por conseguir apoios institucionais para expandir a app para a Play Store (Android) e a AppStore (Apple): “Queremos fornecer os dados à Direção-Geral da Saúde e ao Serviço Nacional de Saúde. A Google a Apple vão rejeitar qualquer app ligada ao Covid 19 que não tenha um cunho de uma entidade pública. Com o cunho de uma entidade pública as pessoas estão seguras daquilo que estão a fazer”, explica.

A CovidApp tem também um guia prático para os utilizadores saberem como agir nas várias situações

Além da ajuda para os hospitais, o objetivo é que os dados fornecidos pelos utilizadores relativamente aos sintomas sirvam também para um estudo epidemiológico, uma vez que “quanto mais dados existirem da população, ao longo do tempo vai ser possível detetar padrões na doença e perceber como é que ela progride na faixa etária das pessoas, com base nas patologias associadas”.

A CovidApp tem também um guia prático para os utilizadores saberem como devem orientar-se em casa quando estão isolados, o que não fazer, dicas de higiene e como devem contactar as pessoas. O trabalho está a ser desenvolvido por nove colaboradores da empresa, juntamente com médicos de várias unidades de saúde do norte. “Estamos a fazer um bem de utilidade pública que sirva os portugueses, para que os portugueses que estão a precisar vão à plataforma e sintam um pouco mais de apoio”, termina Nelson.