Desde o início da pandemia de Covid-19, e numa altura em que a maior parte dos países europeus fechava portas e mantinha a população em casa para evitar mais casos de infeção, a Suécia surgia como um caso de exceção e foi tema de muita conversa — desde as medidas mais leves aos estabelecimentos como restaurantes e ginásios que permaneceram abertos. Para Anders Tegnell, epidemiologista que lidera a Agência de Saúde Pública e uma das principais figuras por detrás da resposta sueca à Covid-19, a conclusão é simples: “O modelo sueco está a mostrar que se pode ir muito longe com medidas voluntárias”.

Em entrevista ao Centro Internacional para Jornalistas, (ICFJ, na sigla em inglês), Tegnell explicou e detalhou a tática da Suécia, que esta terça-feira registou mais de 27 mil infetados e 3.313 mortos, afirmando que o país agiu cedo e permitiu restrições menos severas, ainda que compreenda o bloqueio decidido por alguns países onde se verificou um aumento muito rápido de novos casos de infeção.

Comparado com os países vizinhos, como a Dinamarca e a Finlândia, os números suecos podem mostrar uma taxa de transmissão do vírus maior (o que gerou muitas dúvidas relativamente à resposta da Suécia), mas a grande diferença, acredita o epidemiologista, vai estar na altura do desconfinamento dos países. Aí, refere, será difícil manter os valores de transmissão tão baixos, enquanto a Suécia terá uma maior imunidade de grupo (que garantiu que seria atingida durante este mês).

Tegnell diz não acreditar que surjam novas terapias e uma vacina num futuro próximo e questiona a eficácia da utilização de máscaras sociais, uma vez que “a ciência por detrás disso não é muito forte” e há o medo de que se esteja a promover uma falsa sensação de segurança.

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Na Suécia, uma das nossas políticas mais fortes é que, se te sentires um pouco doente de manhã, ficas em casa. E temos medo de que, se começarmos a introduzir máscaras, as pessoas, em vez de ficarem em casa, coloquem a máscara e saiam para ir trabalhar e fazer compras. E isto vai certamente espalhar-se muito mais nestas pessoas do que nas pessoas que ficaram em casa e decidiram isolar-se”, acrescenta Tegnell ao ICFJ.

“Começamos por usar os métodos que sempre usamos na saúde pública”, explica Anders Tegnell quando questionado sobre a abordagem que a Suécia escolheu para gerir a pandemia. A chave, refere, passou por três pontos essenciais: “Conversar, de certa forma, com a população; depositar muita confiança nela; e dar um pouco de responsabilidade às pessoas”.

“A parte fraca”: mortes nos lares

Segundo o epidemiologista, o objetivo sempre foi conseguir manter o nível de transmissão baixo o suficiente para não sobrecarregar o sistema de saúde mas, ao mesmo tempo, não bloquear totalmente a economia e garantir que “a sociedade como um todo continuava a funcionar a um bom nível”, ainda que o país também tenha adotado algumas medidas, como o encerramento de escolas secundárias e universidades. Tegnell acredita que a fórmula sueca teve sucesso, mas diz ter consciência do elevado número de mortes registados no país, uma “triste exceção” que atribuiu à situação dos lares de idosos na Suécia, a “parte fraca”.

“Descobrimos que a grande explicação por trás disto eram as muitas mortes nos nossos lares de idosos. E estes não são para qualquer tipo de pessoa idosa. São pessoas que estão a sofrer, que estão realmente doentes e muito velhas”, explica, acrescentando que Estocolmo foi a cidade onde o vírus mais chegou aos lares, muitos deles com algumas dificuldades a nível de procedimentos de higiene. “Isto representa mais de 50% de todas as mortes que sofremos na Suécia”, acrescenta.

Apesar de admitir que a taxa de letalidade do vírus pode ter sido maior do que em outros países, o investigador fala também na importância da imunidade de grupo quando se fala numa segunda onda: “Estamos a ver resultados que mostram que talvez 1 a 2% da população dos nossos vizinhos nórdicos está agora imune, enquanto a estimativa para a Suécia é de cerca de 25%”.

Anders Tegnell acredita que, “a longo prazo, apenas um nível de imunidade na população vai manter a propagação a um nível razoável até que exista uma vacina”, algo que, acrescenta, “está bastante distante”. E a imunidade está mesmo garantida para quem já foi infetado pelo novo coronavírus? A pergunta ainda está por responder, mas “é certo que existe imunidade e há muitas provas disso”. “Em todos os casos que tivemos na Suécia não houve uma única pessoa que teve esta doença duas vezes. E nós temos um sistema de identificação muito rigoroso. Portanto, não há como não detetar uma pessoa que o teve duas vezes”, referindo que o mesmo se passou em outros países.

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“O problema é dizer se um indivíduo ficará imune até ao ponto de se poder dizer a essa pessoa que nunca terá esta doença. E é aí que ainda não sabemos porque não temos observação suficiente, porque ainda não estamos prontos para dizer qual o nível de anticorpos protetor. Talvez haja outras partes do sistema imunológico que forneçam proteção que os anticorpos não têm e durante quanto tempo essa imunidade duraria. Os nossos virologistas disseram pelo menos três a seis meses. Eles dizem que é um mínimo, mas ninguém sabe”, acrescenta o epidemiologista.