A professora Daniela Campelo, da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (FGV/EBAPE) considera que existem esta quinta-feira condições políticas no Brasil para a destituição (“impeachment”) do Presidente, se as Forças Armadas se mantiverem fiéis à lei.
“Se as Forças Armadas se mantiverem no lugar que sempre deveriam ter ocupado”, de “Forças Armadas e não de governo, e que não se envolvam na política de Bolsonaro, a gente vai ter possivelmente um ‘impeachment'”, e a seguir “virá um governo provisório”, chefiado pelo vice-presidente, Hamilton Mourão, afirmou a professora universitária brasileira e analista de política económica.
O “impeachment” é um processo político e criminal instaurado por denúncia no Congresso para que se apure a responsabilidade de Presidente da República, governador, prefeito, ministro do Supremo Tribunal ou de qualquer outra figura com responsabilidades, por grave delito ou má conduta no exercício de suas funções, cabendo ao Senado aplicar ao infrator a pena de destituição do cargo.
Na opinião de Daniela Campello, “quem quer que seja eleito depois disso” vai permitir ao Brasil ter alguma recuperação económica, só “pelo simples facto de ter alguma previsibilidade política”, que o país não teve desde 2015.
Porém, numas próximas eleições, a alternativa política a Jair Bolsonaro, atual Presidente do Brasil, não passará por um candidato de um partido, defendeu. “Acho difícil que venha a ser um candidato de partido, a não ser que venha alguém do PT com uma coligação de esquerda”, afirmou.
Para a analista, antes da pandemia, as “condições para o ‘impeachment’ [processo que conduz à suspensão do mando do Presidente da República] já estavam dadas” como certas. Até porque a popularidade de Bolsonaro, que “estava muito resistente, apesar do que se vinha passando”, resultava de uma “certa expectativa que a população tinha de que as coisas iam melhorar”.
Mas essa expectativa terminou no final do ano, quando “se percebeu que todos os indicadores [económicos] eram péssimos”.
Com o declínio da economia, havia todas as condições dadas para o ‘impeachment’, se não existisse uma sinalização das Forças [Armadas] de que não aceitariam o ‘impeachment’ de Bolsonaro”, afirmou. “A pandemia [da Covid-19] veio baralhar tudo”, sublinhou. Até porque este contexto poderia ter sido “uma oportunidade para Bolsonaro, de se mostrar um líder diferente, de juntar forças, de gerar união”.
Mas “não foi o que ele fez. A estratégia dele foi minimizar consistentemente a pandemia, o sofrimento e a saúde, e jogar para cima dos governadores [estaduais], que estão garantindo o isolamento das pessoas, a responsabilidade pela economia”, acusou.
A analista de política e economia e académica vai ser um dos oradores que esta quinta-feira participam numa mesa redonda on-line, organizada conjuntamente pelo ICS – Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e o Clube de Lisboa e que tem como tema “Haverá Bolsonarismo sem Bolsonaro”, um evento que tem por objetivo debater a situação política no Brasil.
Os outros dois oradores são Octávio Amorim Neto também da (FGV/EBAPE) e Marisa von Bulow, da Universidade de Brasília. A conferência será transmitida entre as 14h30 e as 16h, na plataforma Zoom.
Para Daniela Campello, “existe hoje mais Bolsonaro do que bolsonarismo. E existe um imenso potencial para isso que se chama de bolsonarismo deixar de existir à medida em que não haja a figura do Bolsonaro.”
Na sua opinião o que existe, “são pelo menos um pedaço das Forças Armadas que foi um apoio forte a Bolsonaro”, com a figura do general Augusto Heleno a ser “o grande facilitador” dessa relação, há um outro grupo de pessoas “que votaram em Bolsonaro, muito em função da sua agenda económica”.
E entre os apoiantes mais pobres, a maioria são evangélicos, de valores conservadores, que, noutras ocasiões, estiveram ao lado do PT. Além destes, há ainda “aquele grupo ‘lavajatista’, que neste momento ficou sem pai nem mãe, porque o juiz Sérgio Moro, ministro da Justiça [e antigo juiz do processo contra a corrupção], saiu do Governo”, explicou.
Assim, esta quinta-feira, “no Congresso, a grande base de Bolsonaro passou a ser o que a gente chama de ‘centrão’, esse conjunto de partidos amorfos que não têm uma preferência ideológica”, resumiu.