Foi uma visita que puxou às boas recordações. Marcelo Rebelo de Sousa só tinha estado no Oceanário de Lisboa “uma vez”, com os netos, e já não se lembrava de todas as curiosidades do mundo marinho, aquele onde “se perde a noção do tempo”. O Oceanário faz este ano 22 anos de vida, e Marcelo lembra-se bem onde estava quando o Oceanário (e a Expo 98) surgiram: era ele líder da oposição, António Guterres era primeiro-ministro e Jorge Sampaio era Presidente. Em tempos houve também um cherne no mundo político, mas agora chernes só mesmo no aquário, e Marcelo não percebe porque é que o termo é pejorativo, se o peixe é “tão dócil”. Vinte e dois anos depois, os papéis mudaram: Marcelo é Presidente e António Costa é primeiro-ministro, mas a “harmonia”, essa, mantém-se tanto no reino animal como na cena política.
“Esse é um bom retrato daquilo que tem sido o enfrentar da pandemia nos últimos tempos, tem havido harmonia entre o governo, o líder da oposição, os partidos, o Presidente da República, o Presidente da Assembleia da República, tem havido um debate franco, e uma aprendizagem de um caminho comum”, disse aos jornalistas no final da visita, depois de ter sido questionado sobre se a “harmonia entre espécies” que se verifica no Oceanário pode ser um ensinamento para o plano político.
Em causa estão as declarações desta quinta-feira do ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, que disse, ao podcast do PS, que o Presidente da República e o primeiro-ministro “combinam harmoniosamente” e que Marcelo pode muito bem vir a encaixar nos três critérios que o PS definiu para um candidato presidencial vir a ter o apoio dos socialistas. Recusando-se a comentar “declarações de protagonistas da cena nacional” e “posições tomadas por membros do governo”, Marcelo limitou-se a “verificar que tem havido um esforço muito grande, desde final de fevereiro até agora, de conversação e parceria perante as crises a pensar nos portugueses”.
Ou seja, em equipa que ganha não se mexe. Pelo menos, disse Marcelo, “para vencer a pandemia é preciso esta unidade” e esta “harmonia” A ideia de um prolongamento da co-habitação entre o primeiro-ministro socialista, António Costa, e o ex-líder do PSD, Marcelo Rebelo de Sousa, tem vindo a ganhar força desde que foi o próprio António Costa a estender a passadeira vermelha da recandidatura de Marcelo e a quebrar o tabu do eventual apoio socialista a esta candidatura (formal ou informal), em declarações surpreendentes numa visita conjunta à fábrica de automóveis Autoeuropa.
Marcelo prefere chamar-lhe “unidade de diálogo”, e diz que esse foi um instrumento fundamental para “pôr de pé o estado de emergência” pela primeira vez em democracia e para o “renovar duas vezes”, e diz que esse continua a ser um instrumento importante para “continuar o combate à uma pandemia que não desapareceu”, apesar de o confinamento já estar a ser aligeirado.
Depois de uma visita longa, de cerca de duas horas, ao Oceanário, Marcelo Rebelo de Sousa quis mostrar aos portugueses que podem voltar a fazer visitas a museus, que podem voltar a sair à rua, podem voltar a fazer a sua vida mais ou menos normal. Prova disso é o facto de a visita do Presidente ter sido feita com o Oceanário aberto ao público, estando ao mesmo tempo pais e filhos e a comitiva presidencial.
Surpreendido pelo facto de quem “manda no Oceanário” é a “garoupa” e não o tubarão, como lhe foi explicado lá dentro, para surpresa do Presidente, o chefe de Estado usou da sua posição de chefia para apelar ao bom comportamento dos portugueses. “Ontem fui a um restaurante almoçar, hoje almocei num restaurante aqui ao lado, tenho visitado instituições, livrarias, monumentos, e posso testemunhar que, a pouco e pouco, os portugueses estão a saber compatibilizar a passagem do confinamento para a reabertura, com segurança”, disse, defendendo até que desejaria que a economia acelerasse mais rápido.
Mas a “transição” tem de ser suave. “A transição psicológica não se faz de um dia para o outro”, admitiu.