Um jornal online de Ovar, concelho sujeito a 31 dias de cerco sanitário devido à Covid-19, ultrapassou nesse período 1,1 milhões de visitantes, num aumento de procura que a direção atribuiu esta quinta-feira ao interesse pela evolução da doença.

Fundado em 2016, sediado nesse município do distrito de Aveiro com 55.400 habitantes e registado oficialmente na Entidade Reguladora para a Comunicação Social, o “OvarNews” vinha motivando uma fidelidade modesta até ao início da pandemia, mas teve que reforçar a capacidade dos seus servidores informáticos à medida que as primeiras reportagens sobre a crise epidemiológica passaram de uma média habitual de 5 mil leitores em janeiro para valores que, em março, já ultrapassavam os 20 mil acessos por artigo, em apenas duas a três horas.

Nos primeiros dias o site chegou a ‘crashar’ algumas vezes porque não conseguia dar resposta a tantas pessoas ao mesmo tempo”, revelou à Lusa o diretor do jornal e seu principal redator, Luís Ventura, que tem carteira profissional há mais de 20 anos e, enquanto residente em Ovar, esteve ele próprio impedido de sair do concelho durante a quarentena geográfica.

A estatística informática aponta agora 1,1 milhões de visitantes acumulados desde janeiro e um tempo médio superior a dois minutos de permanência no site. A página mais visitada é a de entrada, pela qual se distribuem mais de 40 títulos com fotos e pequenas sinopses, abrangendo rubricas diversas como economia, sociedade, cultura, desporto e opinião.

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Luís Ventura afirma que “os temas mais procurados costumam ser os relacionados com crime”, mas, na conjuntura atual, inclui no ranking de artigos mais lidos uma reportagem sobre famílias que estiveram em isolamento domiciliário com crianças (com quase 30 mil leituras), uma notícia sobre problemas com as remunerações a pagar pela Segurança Social aos trabalhadores impedidos de laborar devido ao controlo de fronteiras (com cerca de 26 mil acessos) e uma peça sobre o recente encerramento de unidades de saúde locais (com mais de 24 mil leitores).

Essa oferta noticiosa “só não foi ainda mais extensa e detalhada porque o jornal continua a ser sobretudo um projeto pessoal sem grandes apoios”, disse.

A equipa fixa é constituída apenas por uma delegada comercial, um webdesigner e o próprio Luís Ventura, que admite que o aumento da produção de noticiário nos últimos meses se deveu não só “às circunstâncias excecionais de Ovar”, mas também ao facto de ele mesmo ter sido colocado em “layoff” pelo seu empregador a tempo inteiro – que é um jornal impresso da região.

Durante o pico local da pandemia, o OvarNews proporcionou ainda o que o seu diretor define como “outro tipo de serviço público”, no que se refere não apenas a anúncios sintéticos sobre legislação de confinamento e alterações de atividade em espaços municipais, por exemplo, mas também ao “apoio prestado a uma comunidade com mais dúvidas do que certezas”.

O jornalista explica: “Atendemos imensas pessoas que queriam esclarecimentos sobre vários assuntos e não sabiam a quem recorrer ou não tinham quem os atendesse. O jornal foi uma espécie de confidente e, a certa altura, quase não havia tempo para redigir notícias, tal era a quantidade de mensagens e telefonemas com todo o tipo de questões e também com muitas denúncias sobre coisas que estavam a correr menos bem”.

Luís Ventura acredita que esse aumento de procura se deveu “à confiança que as pessoas depositam no jornal, tanto pela credibilidade da informação que divulga como pela proximidade que têm com as fontes locais”, e só lamenta que o tecido empresarial de Ovar ainda não tenha despertado para o potencial publicitário da comunicação online e de um órgão de comunicação “que já está bem implantado” no território.

Os elevados números de leituras que atingimos demonstram que a população é sensível às notícias online, em especial às que, como as nossas, continuam a ser disponibilizadas de forma gratuita, claro! Mas, para a sustentabilidade do projeto, é preciso que tenhamos publicidade da qual possamos retirar alguma receita e o que acontece é que a maioria das empresas continuam a privilegiar anúncios em papel, por uma questão de conservadorismo e desatualização, quando essas edições têm tiragens minúsculas comparativamente às audiências de um jornal online”, defende Luís Ventura.

O diretor do Ovar News realça, por isso, que, também depois da pandemia, será preciso “dar o exemplo, promover novas dinâmicas e reforçar a motivação da comunidade vareira como um todo”. Se o comércio local “está agora em crise aguda”, o contributo para “uma imprensa livre e próxima, de base local”, deve partir “das grandes empresas do concelho”, mesmo que isso implique novas estratégias de comunicação e de responsabilidade social para multinacionais “que empregam milhares de pessoas em Ovar, alimentam milhares de famílias no concelho e depois só privilegiam os órgãos de abrangência nacional na sua distribuição de publicidade e outros apoios”.