Naquela que deve ter sido a última intervenção de Clotilde Delbos enquanto CEO interina da Renault, uma vez que será substituída a 1 de Julho por Luca de Meo, o construtor francês revelou o plano para os próximos três anos, durante o qual tem como objectivo reduzir os custos em 2000 milhões de euros, como forma de incrementar a rentabilidade.
Partilhando o palco com Jean-Dominique Senard, chairman do grupo francês que inclui, além da Renault, a Dacia, a Alpine, a Lada e a Samsung Motors, Clotilde Delbos ajudou a delinear a estratégia com que o grupo se propõe enfrentar a crise da indústria automóvel provocada pela Covid-19. Um contributo importante veio do Governo francês (que detém cerca de 15%) e que, à semelhança de outras empresas do país, permitiu à Renault negociar com a banca um empréstimo de 5000 milhões de euros em condições vantajosas, por beneficiar de garantia do Estado.
Uma das poupanças vai ser conseguida à custa da redução da produção, que deverá cair até 2023 dos actuais 4 milhões para 3,4 milhões de veículos. Não que queiram vender menos carros, pois mais carros transaccionados significa menores custos unitários e potencialmente margens de lucro mais generosas. O que o grupo francês pretende é reduzir o excesso de esforços comerciais – vulgarmente conhecidos como descontos, que chegam a atingir 40% nas vendas a rent-a-car, a frotistas ou a empresas de leasing – para ajudar a escoar o alegado excedente de produção, que acaba por consumir as margens de lucro em vez de as incrementar.
Esta redução de produção não foi associada ao fecho de fábricas, sendo que o grupo anuncia que o Alpine A110 vai continuar até ao final do ciclo de produto, não sendo evidente que continue a partir daí. Com a Renault a ser dos construtores tradicionais que mais tem investido nos veículos eléctricos e com a marca a possuir apenas uma fábrica adaptada à produção do Zoe, é provável que o futuro passe por uma viragem em que a Alpine troque os motores de combustão pelas baterias.
Com a partilha de tecnologias pelos três construtores da Aliança (Renault, Nissan e Mitsubishi), anunciada na quarta-feira, o grupo francês pensa economizar 800 milhões de euros, a que pretende juntar mais 650 milhões fruto da redução dos custos de produção, que passam pela maior partilha de soluções dentro do grupo e por travar o incremento da capacidade fabril nas instalações em Marrocos, Roménia e, provavelmente, Rússia. Isto passa pela racionalização da construção de componentes como caixas de velocidades, que são também produzidas em Cacia, Portugal.
Outra das áreas em que vão incidir os cortes nos custos é no esforço comercial e de marketing, ou seja, nos já mencionados descontos, promoções e publicidade, onde o Grupo Renault pretende poupar 700 milhões de euros, para o que também vai contribuir a racionalização da organização com a transferência da percentagem que a Renault detém na Dongfeng Renault Automotive Company para os chineses. A Renault sai dos automóveis com motor a combustão no mercado chinês, concentrando-se apenas nos veículos eléctricos.
Dos 15.000 despedimentos, quantos calham a Portugal?
Um dos anúncios mais preocupantes para os portugueses, entre os avançados na conferência de imprensa do Grupo Renault, prende-se com o corte de cerca de 15.000 postos de trabalho, cerca de 8% dos 180.000 trabalhadores da empresa. O anúncio especificou que 4600 desses empregos serão cortados em França, com os restantes cerca de 10.000 a serem divididos pelo resto do globo.
Em Portugal, o grupo francês possui a Renault Portugal SA, a empresa que gere a importação dos veículos das marcas para o nosso país, uma sucursal, ou seja, uma concessão pertença da marca, e a fábrica de Cacia, onde se produzem caixas de velocidade e várias peças para os motores, como por exemplo, bombas de água. Segundo o Observador apurou, não estão previstos cortes a nível do pessoal em Cacia.
Cacia produz hoje uma das caixas de velocidades mais populares na Aliança, além das peças para os motores, pelo que a menos que exista uma importante quebra de vendas na Renault ou na Nissan, não é de esperar uma redução importante da produção.