Foi ilegal a tentativa forçada de despejar um centro de apoio a carenciados, em Arroios, durante a madrugada, acusa o vereador da Ação Social da Câmara Municipal de Lisboa. Em tempo de pandemia, “todos os despejos estão suspensos” e Manuel Grilo, vereador do Bloco de Esquerda, diz não ter visto qualquer ordem do tribunal a autorizar a ação. O bloquista confirma que sabia da existência daquele centro de apoio, mas não tinha conhecimento de que estava a operar de forma ilegal. Para já, aos microfones da Rádio Observador, garante que a autarquia vai encontrar uma solução.

Várias pessoas ficaram feridas durante os protestos que se seguiram à tentativa de despejo do edifício e já ao final da noite de segunda-feira, por volta das 23h30, o prédio começou a ser emparedado por ordem do proprietário. Nenhuma pessoa vai pernoitar naquele local, apesar de três terem sido autorizadas a passar lá a noite.

[Ouça aqui o vereador Manuel Grilo]

Câmara de Lisboa vai arranjar solução para centro de apoio em Arroios, diz vereador Manuel Grilo

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“A ocupação do edifício será provavelmente ilegal, mas a forma como entraram será tudo menos legal.” Manuel Grilo, que esteve no local durante a manhã de segunda-feira, diz que falou com o proprietário do prédio ocupado pelo centro de apoio. “Pude dialogar com alguém que se apresentou como proprietário e com o chefe daquela milícia armada que por ali entrou a aterrorizar aquelas pessoas. Pelo que me apercebi não havia nenhuma ordem do tribunal.”

Manuel Grilo conta que a tentativa de despejo aconteceu de madrugada. “De manhã, às 5 da manhã, houve uma entrada de uma milícia privada, contratada seguramente pelo fundo imobiliário proprietário do edifício.  Foi uma enorme violência psicológica, verbal e com coação à mistura.” Entrevistado pela Rádio Observador, o vereador bloquista diz-se perplexo com a situação.

“Estamos em tempo de pandemia, de crise, não consigo compreender como é que alguém que está a dar apoio social a pessoas carenciadas é posta fora para dar lugar à especulação imobiliária”, sublinhou. “Sabemos que os desejos estão suspensos enquanto durar a pandemia. Não faz sentido que num tempo de pandemia se ponha na rua pessoas que precisam de respostas sociais, que se ponha na rua uma associação que está a dar essas respostas sociais, numa altura em que os despejos estão suspensos.”

Edifício emparedado com tijolos

De acordo com Bernardo Valares, um dos voluntários do Seara — Centro de Apoio Mútuo de Santa Bárbara, citado pela Lusa, uma equipa começou “a emparedar o edifício com tijolos”. Questionado sobre as três pessoas que tinham permissão para pernoitar no edifício, na sequência de um entendimento alcançado com os proprietários, o voluntário explicou que essas pessoas apenas poderiam dormir no interior do prédio sob supervisão “de oito seguranças” e que optaram por não o fazer porque “sentiram-se intimidadas”.

A agência Lusa contactou o Comando Metropolitano de Lisboa da PSP para confirmar o emparedamento do edifício, informação que a polícia não conseguiu confirmar, remetendo quaisquer esclarecimentos para um comunicado que será, entretanto, divulgado.

PSP identificou várias pessoas no local

Horas antes, várias pessoas ficaram feridas, incluindo três agentes da PSP, segundo contou Bernardo Alvares à Lusa, explicando que algumas pessoas “que pertenciam ao coletivo que estava a gerir o espaço” tentaram entrar no edifício, mas que o fizeram “de forma pacífica”.

O voluntário acrescentou que viu duas pessoas ficarem feridas por causa de “uma investida” da polícia quando estavam a tentar entrar no edifício. Nesta ação foi usado gás pimenta. Essas duas pessoas, segundo Bernardo Alvares, “seguiram numa ambulância” para uma unidade de saúde. As pessoas começaram, entretanto, a sair do centro de apoio a carenciados e “a ser identificadas” pela PSP, acrescentou o voluntário.

Contactada pela Lusa, o porta-voz do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP, comissário Artur Serafim, referiu que três agentes ficaram feridos, assim como, pelo menos, duas pessoas, mas foram todos “assistidos no local”.

A polícia explicou que algumas pessoas “descobriram uma entrada lateral” do edifício e “forçaram a entrada” para abrir as portas às restantes pessoas que aguardavam no exterior. O voluntário contactado pela Lusa disse, no entanto, que tal não aconteceu.

Os feridos, explicou a PSP, resultaram da tentativa de entrada no edifício e da ação da polícia para o impedir. Os elementos destacados vão continuar “a aguardar no local”, porque este “vai ser um jogo de paciência”, considerou o porta-voz do Cometlis.

A PSP promoveu um cordão policial junto ao centro apoio a carenciados, em Arroios, Lisboa, que foi alvo de um despejo durante a madrugada. Pouco antes das 18hoo de segunda-feira, um grupo de ativistas forçou a entrada no edifício devoluto que fica no Largo de Santa Bárbara por trás do Banco de Portugal. Cá fora estiveram 100 a 200 manifestantes a demonstrar o seu apoio aos que ocuparam este prédio, sendo vigiadas por uma unidade especial das forças de segurança.

Os proprietários do edifício mandaram cortar a água e a luz, de acordo com Bernardo Alvarez. Já segundo fonte da PSP, três pessoas iriam continuar no Seara — Centro de Apoio Mútuo de Santa Bárbara, após um acordo, sendo que o acesso ao edifício ficará “vedado a outros”. Entretanto, a PSP não soube precisar por quanto mais tempo as pessoas irão ficar naquele lugar, adiantando que a Proteção Civil disse que podiam “pernoitar lá esta noite”.

Cerca de uma dezena de seguranças privados entraram às 5h desta segunda-feira naquele centro de apoio a carenciados, para tentar despejar as pessoas que ali se encontravam, porque o espaço foi ocupado ilegalmente.

Seguranças tentam despejar voluntários de centro de apoio a carenciados em Arroios

De acordo com Bernardo Alvarez, encontram-se dentro do edifício quatro pessoas que se recusam a sair, bem como cerca de uma dezena seguranças privados e a advogada dos proprietários.

O Seara – Centro de Apoio Mútuo de Santa Bárbara, em Arroios, foi criado por um grupo de pessoas que ocupou um antigo infantário abandonado e o transformou num centro de apoio de ajuda a pessoas carenciadas, incluindo sem-abrigo.

Quando ocuparam o espaço, os voluntários não sabiam quem eram os proprietários do imóvel, mas mais tarde descobriram que foi vendido a uma empresa de imobiliário e depois em parcelas a três pessoas que vivem no estrangeiro.

Os voluntários enviaram email a várias entidades, entre as quais a Câmara Municipal de Lisboa e a PSP, a informar de que iriam ocupar o espaço e os motivos. Esta segunda-feira, pelas 5h, foram alvo de um despejo.