Só esta segunda-feira, na Assembleia-Geral da Liga, é que ficou decidido de forma definitiva que, a partir da segunda jornada da retoma da Primeira Liga, seria possível realizar cinco substituições ao invés das habituais três e ter nove suplentes no banco e não sete, como é normal. O que quer dizer que Gil Vicente e Famalicão, as duas equipas que esta terça-feira começavam a 26.ª jornada, só souberam que deviam convocar 20 jogadores, e não 18, a menos de 24 horas do apito inicial.
E Vítor Oliveira, treinador do Gil Vicente, foi um dos primeiros a lembrar isso mesmo. “Há muitos condicionalismos. Estamos a menos de 24 horas do jogo e não sabemos se vamos fazer três ou cinco substituições. Isto é absolutamente errado e não faz sentido nenhum. Não é uma situação normal. Não sabemos se vamos convocar 18 ou 20 jogadores (…) Isto é brincar ao futebol. É uma brincadeira”, disse o técnico da equipa de Barcelos na conferência de imprensa de antevisão da partida. Certo é que, esta terça-feira, Gil Vicente e Famalicão eram as primeiras equipas portuguesas a beneficiar da exceção que permite realizar cinco substituições ao longo de três paragens durante os 90 minutos regulamentares.
Duas equipas que, aliás, se cruzavam vindas de experiências muito diferentes na jornada de regresso. Se o Gil Vicente perdeu em Portimão, contra o penúltimo e num jogo onde foi claramente superior mas não soube ser eficaz, o Famalicão ganhou em casa ao FC Porto e aproveitou os deslizes de V. Guimarães, Rio Ave, Sporting e Sp. Braga para saltar para um quinto lugar europeu e aproximar-se da quarta posição. O que significava que, esta terça-feira, a equipa de Vítor Oliveira precisava de pontuar para não se afundar na segunda metade da tabela e o conjunto de João Pedro Sousa podia igualar o Sporting em caso de vitória, já que os leões só jogam na sexta-feira.
Pouco antes do apito inicial, o Famalicão ficou a saber que não poderia contar com o guarda-redes habitualmente titular, Defendi. O brasileiro teve um resultado inconclusivo na ronda de testes a que o plantel foi submetido e a DGS, que numa primeira fase chegou a dar luz verde ao guarda-redes, acabou por recomendar que este ficasse fora da partida, por já ter testado positivo anteriormente. Na baliza do Famalicão, por isto mesmo, estava esta terça-feira Vaná.
De forma natural, e até por aquilo que está visível na classificação, a equipa de João Pedro Sousa tomou o controlo da partida desde os instantes iniciais, tentando desde logo chegar perto da baliza de Denis. Com os setores muito estendidos e com a habitual largura, com os dois laterais muito adiantados no terreno e a oferecer soluções, não demorou muito tempo até que o Famalicão criasse oportunidades de golo — e foi num desses momentos, numa aproximação à baliza adversária, que Toni Martínez acabou por sofrer a grande penalidade que originaria o inaugurar do marcador. O avançado espanhol entrou na grande área pela esquerda, tentou puxar para dentro e foi derrubado em falta por Edwin. Na conversão, Fábio Martins — que na ausência de Defendi era o capitão do Famalicão — bateu Denis e fez o primeiro golo da partida (12′).
A partir do golo, até porque o Famalicão recuou no terreno e concentrou mais atenções no setor defensivo do que no mais adiantado, o Gil Vicente foi conquistando metros e criando perigo, principalmente a partir da ala direita e da mobilidade de Kraev. O jogador búlgaro é o grande foco de criatividade da equipa de Vítor Oliveira e ia sendo a principal dor de cabeça dos defesas do Famalicão. Nesta altura, dividiu-se uma grande oportunidade para cada lado: Fábio Martins viu Denis, com uma enorme defesa, roubar-lhe o segundo golo no jogo depois de um bom remate de fora de área (24′) e Sandro Lima, ao falhar o remate, não conseguiu encostar para a baliza deserta depois de um bom movimento ofensivo do Gil Vicente (34′). Mas acabou por ser o Famalicão, com maior eficácia e discernimento nas zonas de finalização, a aumentar a vantagem. Diogo Gonçalves, com um grande remate cruzado de primeira depois de uma assistência de Toni Martínez a partir da esquerda, voltou a bater Denis e colocou o Famalicão a ganhar confortavelmente ao intervalo (42′).
Na segunda parte, Vítor Oliveira tirou Arthur Henry, que tinha estado a jogar no lado direito do meio-campo, para colocar o avançado Samuel Lino. O Gil Vicente procurou tomar a iniciativa do jogo, a colocar a primeira linha de construção mais adiantada e tentar exercer uma pressão mais eficaz ao portador da bola, mas pouco ia conseguindo fazer. A ganhar por dois golos de diferença — e graças àquilo que são dois meses de paragem –, o Famalicão não quis acelerar muito, não investiu em grandes arrancadas e não lutou para chegar ao terceiro mas raramente descurou nas tarefas defensivas e foi controlando as ocorrências. Defendeu sempre de forma compacta, atacou sobretudo através de transições rápidas ou bolas paradas e só falhou mesmo no lance do único golo do Gil Vicente: o lateral Henrique Gomes cruzou da esquerda e Hugo Vieira, que entretanto tinha entrado, cabeceou praticamente sem oposição (77′). A equipa de Barcelos relançou a partida mas já não conseguiu chegar ao empate, ainda que tenha passado os últimos dez minutos em cima da baliza de Vaná, acabando até por sofrer o terceiro golo, por intermédio de Edwin na própria baliza (90+1′).
No final do jogo, em que Vítor Oliveira se tornou o primeiro treinador da história da Liga a fazer cinco substituições, o Famalicão venceu, igualou o Sporting no quarto lugar à condição e conquistou uma histórica 12.ª vitória na Liga, já que nunca o clube tinha vencido tantos jogos no principal escalão do futebol português. E por isso, esta terça-feira e não só, muito tem de agradecer a Fábio Martins.
Na semana passada, o jogador português recorreu ao Twitter para condenar o apedrejamento do autocarro do Benfica — sem nunca nomear os encarnados e referindo até que estava a falar do “estado do futebol português” e da “mentalidade de todos” e não de “nenhum clube em específico”. “É suposto um jogador sentir-se mais motivado para ajudar o clube a chegar a vitórias depois de ver a casa vandalizada, ter cabeças partidas, vidros nos olhos ou ser alvo constante de ameaças e assobios? Comentem, sem aquela conversa do eles ganham milhares, têm de se sujeitar”, escreveu Fábio Martins. E esta terça-feira, quase como resposta a si mesmo, marcou pelo segundo jogo consecutivo, voltou a ser um dos melhores do Famalicão e tornou-se mesmo o melhor marcador da equipa esta temporada, com nove golos. O rapaz de Mafamude foi a Barcelos, com a braçadeira de capitão em riste, mostrar que tem talento para voar mais alto.