O único deputado português na Assembleia Legislativa (AL) de Macau disse esta segunda-feira à Lusa que pediu ao líder do parlamento local uma “magistratura de influência junto do governo” do território na defesa do futuro da língua portuguesa.

No momento em que se discutem na AL três propostas de lei que colocam “a língua inglesa numa posição de nítida supremacia face à portuguesa”, José Pereira Coutinho salientou que “está em causa a singularidade de Macau e o papel de ponte entre a China e os países lusófonos”.

Por outro lado, aquele que é também conselheiro das comunidades portuguesas em Macau sublinhou que espera “boa vontade e sensibilidade” da parte do presidente da AL, a quem enviou uma carta na sexta-feira.

“Tem contactos regulares com o chefe do executivo, Ho Iat Seng, e foi deputado no tempo da administração portuguesa, pelo que terá a compreensão para o facto de a singularidade de Macau passar pela língua portuguesa, fundamental para marcar a diferença entre o território e as províncias adjacentes”, sustentou.

Na carta, Pereira Coutinho frisou que as opções sobre o uso das línguas “é também suscetível de violar (…) a Lei Básica da RAEM (Região Administrativa Especial de Macau), que estabelece a língua portuguesa como língua oficial” e, por isso, de “comprometer a ligação de Macau ao mundo lusófono”.

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Na prática, reforçou, está preocupado com “a possível perda das características” do território “enquanto ‘farol’ da lusofonia no Oriente”, bem como com “o futuro dos milhares de jovens que se têm dedicado a aprender a língua portuguesa em Macau e no interior do continente que, com o aprofundamento deste rumo, poderão ver o seu futuro pessoal profissional comprometido”.

A carta do deputado surge depois de algumas posições públicas nas quais alertou para a qualidade da formação de tradutores e no ensino português no território.

Pereira Coutinho afirmou que não faltam professores, dinheiro e procura, mas as autoridades continuam a não dar uma resposta às exigências qualitativas do ensino: “Até contraria a política da República Popular da China, a de ter jovens a aprender a língua portuguesa e, por isso, não percebo qual a razão de se continuar a remar ao contrário”.

No final de novembro de 2019, o governo de Macau avançou com dados que apontavam para o facto de o ensino do português ter crescido em Macau nas escolas, em alunos e professores nos últimos 20 anos, sob administração chinesa. Os números indicavam um aumento dos estudantes locais em cursos lecionados em português no ensino superior e para um crescimento dos alunos em mobilidade em Portugal.

O total de alunos com português no ensino primário e secundário no ano letivo de 1999/2000, aquando da passagem da administração portuguesa do território para a China, era de 6.838. No ano letivo 2018/19 eram oito mil. Nos primeiros dez anos deste século, o número de alunos com português registou uma descida acentuada, mas a partir de 2011/2012 tem vindo a aumentar. Em 2018/19 assistiu-se mesmo a um crescimento na ordem dos 20%.

Ainda no ensino primário e secundário, o total das escolas com oferta de português subiu quase para o dobro, enquanto o número de docentes subiu 119% nos mesmos níveis de ensino.

Já no ensino superior, os dados do governo da RAEM contabilizavam nos últimos 20 anos um crescimento de 374% no número de alunos nos cursos lecionados em português entre os anos letivos 1999/2000 e 2019/2020. Se antes eram pouco mais do que 300, agora chegam quase aos 1.500.

O português é falado por mais de 260 milhões de pessoas nos cinco continentes, ou seja, 3,7% da população mundial. É língua oficial dos nove países-membros da CPLP (Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste) e Macau, bem como língua de trabalho ou oficial de um conjunto de organizações internacionais como a União Europeia, União Africana ou o Mercosul.

Após mais de 400 anos sob administração portuguesa, Macau passou a ser uma Região Administrativa Especial da China a 20 de dezembro de 1999, com um elevado grau de autonomia acordado durante um período de 50 anos.