As emissões globais de metano atingiram valores nunca registados e não abrandaram com a pandemia de Covid-19, impulsionadas pela extração do carvão, produção de petróleo e gás natural, criação de gado e aterros sanitários.

O alerta surge em dois artigos divulgados esta terça-feira nas publicações científicas “Earth System Science Data” e “Environmental Research Letters”, e é da responsabilidade dos investigadores do Projecto Carbono Global, uma iniciativa criada em 2001 e que junta diversas instituições, sendo liderada pelo cientista da Universidade de Stanford Rob Jackson.

Entre os anos 2000 e 2017 as emissões metano, gás com poderoso efeito de estufa, subiram para limiares que os cientistas admitem que provoquem um aquecimento de três a quatro graus celsius antes do fim do século, provocando desastres naturais, de incêndios a secas e inundações, e perturbações sociais como fome e migrações em massa.

Em 2017, o último ano de dados globais completos e disponíveis sobre metano, a atmosfera terrestre absorveu quase 600 milhões de toneladas de gás metano, que tem um efeito de estufa 28 vezes mais potente do que o dióxido de carbono, ao permanecer na atmosfera durante mais de 100 anos.

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De acordo com os investigadores, mais de metade das emissões de metano provêm atualmente de atividades humanas e aumentaram 9% (50 milhões de toneladas) por ano desde o início do ano 2000.

Em termos de potencial de aquecimento, dizem, colocar tanto metano na atmosfera equivale a colocar mais 350 milhões de carros nas estradas ou duplicar as emissões totais de gases com efeito de estufa da Alemanha ou da França.

Globalmente, nas palavras de Rob Jackson, professor de Ciências da Terra na Universidade norte-americana de Stanford, os grandes emissores de metano são as fontes de combustíveis fósseis e as vacas. “As emissões de metano dos bovinos e de outros ruminantes são quase tão grandes como as da indústria de combustíveis fósseis”, disse o responsável, acrescentando que quando as pessoas brincam com os gases das vacas não percebem a real dimensão do problema.

Segundo os dados agora revelados, as emissões de metano provenientes da agricultura chegaram a 227 milhões de toneladas em 2017, quase 11% acima da média de 2000-2006. O metano proveniente da produção e utilização de combustíveis fósseis atingiu 108 milhões de toneladas em 2017, quase 15% acima da média do mesmo período anterior.

Notam os responsáveis que se a pandemia de Covid-19 fez cair a pique as emissões de dióxido de carbono tal não aconteceu com o metano, porque as casas continuaram a ser aquecidas e a agricultura continuou a crescer.

No período de estudo, até 2017, as emissões de metano aumentaram mais acentuadamente em África, no Médio Oriente, na China e no Sul da Ásia e Oceânia, incluindo Austrália e muitas ilhas do Pacífico. Cada uma das regiões aumentou as emissões em cerca de 10 a 15 milhões de toneladas por ano. Os Estados Unidos aumentaram as emissões em 4,5 milhões de toneladas por ano.

Neste caso, segundo Rob Jackson, especialmente pelo aumento da produção e consumo de gás natural, que reduz as emissões de dióxido de carbono, mas aumenta as de metano.

A Europa destaca-se como a única região do mundo onde as emissões de metano diminuíram ao longo das últimas duas décadas, quer pela redução das emissões no fabrico de produtos químicos, quer pelo cultivo mais eficiente de alimentos.

As políticas e uma melhor gestão reduziram as emissões dos aterros sanitários, estrume e outras fontes aqui na Europa. As pessoas também estão a comer menos carne de vaca e mais aves e peixes”, disse Marielle Saunois, da Universidade de Versalhes, França, autora principal do artigo na revista “Earth System Science Data”.

Apesar dos receios de que o degelo do solo congelado (‘permafrost’) no Ártico possa aumentar desmesuradamente as emissões de metano, os investigadores não encontraram provas de que tal tenha ocorrido até 2017. Mas segundo Rob Jackson não é fácil determinar as emissões de metano provenientes de fontes naturais.

De acordo com Rob Jackson e os restantes especialistas a redução de emissões de metano exige uma redução do uso de combustíveis fósseis e mudanças na forma de alimentar o gado, de cultivar arroz e na própria alimentação humana.

Em resumo, segundo Rob Jackson, é preciso comer menos carne e substituir o petróleo e o gás natural nas casas e nos transportes. E tudo isso é possível, diz.