Exploradores gastronómicos, sabemos que estão connosco: chegou a altura de voltar a visitar, a conhecer, a explorar, o melhor das tradições gastronómicas portuguesas, no centro do país. Mas desta vez, vamos à procura do que é diferente. É esta a nossa proposta: vamos descobrir as receitas da avó confecionadas com sofisticação e inovação? Eis uma rota imperdível.
A primeira surpresa: começamos por Linhares da Beira, uma bonita aldeia medieval que pertence à rede 12 Aldeias Históricas de Portugal, e, sem grandes demoras, vamos até ao Restaurante Cova da Loba. Somos atraídos pela magia deste museu ao ar livre e ficamos fãs desta aldeia assim que entramos neste restaurante da terra, que em tempos foi habitação do proprietário e da sua família. Como é que um restaurante destes, onde a sofisticação e o ambiente familiar se fundem de forma inesperada, existe numa aldeia com ruas de pedra, escondida entre montanhas? Existe, e a visita é obrigatória, pela excelente ementa e propostas surpreendentes do chef Valdir Lobav. Arrisque nos clássicos, que primam pela originalidade: falamos no borrego e no cabrito da Beira, confecionados com ingredientes locais que respeitam a sazonalidade dos alimentos, e são especiais pelo sabor extraordinário e apresentação inovadora do prato.
Um pouco mais abaixo: Aveiro. Ora, queremos pratos que saibam a mar, mas não da forma que estamos habituados a saborear. Queremos ter o mar à mesa como uma experiência única e, nesta cidade, é no Cais do Pescado que se deve sentar e esperar pelo momento em que terá uma explosão de sabores na boca. Aqui, o marisco e o peixe fresco são a grande atração – e é com eles que vamos despertar os nossos sentidos. Experimente o famoso arroz de línguas de bacalhau com gambas ou a tempura de polvo e arroz do mar – temos a certeza de que não se vai arrepender de pedir estes pratos. E, claro, para os amantes de marisco, haverá sempre a sapateira recheada para nos aconchegar a alma nos dias mais frios que aí vêm. Ficou com água na boca? Calma, ainda temos mais uma sugestão em Aveiro: vá ao restaurante Mugasa, que já foi um segredo em tempos bem guardado, é muito reconhecido pela qualidade dos seus produtos. Junto a uma rotunda e à beira da estrada, o Mugasa é, para quem gosta de ambientes familiares, aquele local onde somos tratados com simpatia e como se fôssemos “da casa”. Falamos neste local e no leitão porque é aqui que pode saborear as famosas iscas de leitão , servidas em cebolada e com batata cozida, ou ainda provar a cabidela de leitão ou a magnífica feijoada de leitão. Essas é que não vai conseguir esquecer.
Continuamos a viagem pelas Aldeias do Xisto. Em Janeiro de Cima, à beira do Zêzere, o contemporâneo Restaurante Fiado, que deve o seu nome à atividade costumada da tecelagem do linho realizada na região, é uma referência gastronómica no concelho do Fundão, e conhecido por aliar gastronomia tradicional, sofisticação nos sabores e bom gosto no empratamento, de forma despretensiosa e original. Ora, “viemos de tão longe para quê?”, pergunta o leitor. Veio de tão longe para experimentar os deliciosos maranhos, que se primam pelo sabor a hortelã e cozedura no ponto, e acompanham com batatinha no forno com ervas aromáticas. Nesta rota gastronómica, o importante é partilhar consigo os espaços que estão a fazer a diferença na forma como utilizam alimentos tradicionais de forma original, e, por isso, queremos deixar-lhe mais uma sugestão: não se esqueça de experimentar o pastel folhado de chanfana.
Aviso à navegação: quem aqui vem uma vez, quer sempre regressar. É no Xisto Restaurante Louçainha, na Praia Fluvial da Louçainha, Espinhal, Penela, que temos à nossa espera o melhor do mar e da serra. Neste espaço, os produtos da Beira Litoral e da Beira Serra ganham ainda maior brilho pela forma como são tratados pelo chef João d’Eça Lima, um adepto fervoroso da comida de conforto e da slow food. Destacamos a mistura de sabores e excelência na confeção em especialidades, como a manteiga de alheira do chef, as crocantes pataniscas de chouriço e cogumelos, sem esquecer a açorda de bacalhau com berbigão e mexilhão, típica da freguesia das Gândaras e, já agora, o arroz de salpicão e javali, da região da Sertã. Neste refúgio fluvial abraçado pela montanha, a vista é extraordinária e imperdível. Outro aviso, o último: reserve mesa antecipadamente.
Em Proença-a-Nova, na Aldeia do Xisto de Figueira, que tal almoçarmos na casa (da) Ti’Augusta? Neste restaurante, conhecido pelas iguarias Beirãs, confecionadas com produtos fresquíssimos e locais. Aqui, todos os pratos tradicionais têm um ingrediente em comum, a inovação que respeita a tradição na confeção, daí a proposta desta experiência: sente-se à mesa e deleite-se com as sugestões gastronómicas: ora, além do já conhecido cabrito assado no forno a lenha e dos maranhos de excelência, sugerimos ainda o afogado da boda, um guisado de cabra, tipicamente servido nas festas de casamento locais. E do plangaio, já ouviu falar? Um enchido que não parece um enchido, recheado com massa de farinheira e “ossos do espinhaço”. Fique a saber que é um dos pratos mais requisitados na Casa Ti’Augusta, que já foi considerado o melhor restaurante no distrito de Castelo Branco.
E, já que estamos por estes lados, não deixemos de fazer uma paragem na Covilhã para visitarmos o afamado Alkimya. O próprio nome indica que este não é um restaurante típico e que terá aqui uma experiência gastronómica. Comecemos, então, pelos petiscos: ceviche de corvina, linguiça com abacaxi e escabeche de truta. Parece-lhe bem? A nós também. Depois, vamos aos pratos principais: lombinho de bacalhau confitado, coentrada de feijocas, grelos, areia de broa e ovo BT ou veado guisado com cerveja artesanal dunkel, chocolate negro, batata aromatizada com alecrim e grelos. Calma, veado com chocolate negro? Sim, sim, garantimos que é uma combinação de sabores especial e que não merece ser colocado de parte. E, depois, as sobremesas: Arroz doce de coco e alfazema com chocante de bolacha. Inspirado o suficiente?
Esperemos que esteja a ler este texto de barriga cheia, senão, a possibilidade de ligar aos amigos e à família e convidá-los para jantar no Restaurante Tia Alice, em Fátima, será extremamente alta. Um clássico imperdível, a cozinha tradicional portuguesa da Tia Alice já funciona há mais de 30 anos. Não precisamos de nos alongar sobre este tão conhecido restaurante para a vontade de lá ir aparecer. Essa nunca desaparece quando falamos no Tia Alice. E, já que está por estes lados, vá à Casa da Nora, em Leiria, e experimente o crepe de queijo de cabra com chutney de abóbora, frutos secos e rúcula. Ficou com água na boca? Ainda agora começámos… Depois, não deixe de pedir o lombo de robalo com sementes de sésamo, hummus de beterraba e folhado de legumes ou, ainda, a caldeirada de cabrito.
Indo eu, indo eu, a caminho de Alcobaça, porque o Restaurante Frei Bernardo existe e só isso é suficiente para justificar esta deslocação. É uma referência incontornável no Oeste. Aqui, a maçã de Alcobaça, um produto de origem portuguesa com Indicação Geográfica Protegida pela União Europeia, é o toque especial em algumas propostas gastronómicas deste restaurante. Adaptada cuidadosamente a cada prato, o sabor desta maçã completa de forma inovadora as especialidades confecionadas. Falamos do peixe à D. Pedro, com amêijoas e maçã de Alcobaça, do frango na púcara também com pedaços desta maçã, da maravilhosa carne de porco frita com maçã (tudo envolvido numa grande côdea), e, por fim, no famoso bacalhau à D. Inês com a “dita cuja”.
De Alcobaça, até à baía de São Martinho do Porto, onde a garra da juventude toma as rédeas da cozinha do restaurante Granada, e trata o mar com propostas irreverentes. É aqui que aprendemos a gostar ainda mais do peixe da nossa costa. Aponte nas notas do seu telefone o seguinte: “Disseram-me para provar os vossos saborosos camarões, o bacalhau confitado com puré de chícharo e gema confitada, o robalo com arroz de ervilhas, camarão e miolo de amêijoa, os filetes de dourada comaçorda de camarão e ervas e o arroz do mar com camarão, bacalhau, polvo, mexilhão e miolo de amêijoas”. Eles vão entendê-lo. Trata-se de um espaço maravilhoso, com ótima relação qualidade/preço, a não perder.
Chegámos ao Bombarral, o coração da região Oeste, que deslumbra pelas suas paisagens rurais e agrícolas, onde as vinhas e os pomares de pêra-rocha criam um cenário romântico e idílico. Ora, mas passemos ao que importa: gastronomia. É no Restaurante Dom José, que somos convidados a experimentar o melhor da tradição, num ambiente familiar e caloroso. Este espaço emblemático inova pela forma moderna como confeciona os produtos locais, sempre mantendo um toque caseiro. A ementa não é grande mas isso não é problema quando temos à nossa disposição dois pratos, que são confecionados desde que o restaurante abriu em 1992: falamos da feijoada de porco ibérico com feijão-branco, couve e arroz branco, e dos panadinhos de peixe. Para terminar, e porque estamos no Bombarral, reserve um espaço para o tatin de pêra-rocha. Aqui entre nós: fique a saber que o Dom José recebeu, neste ano tão atípico, o Prémio Travellers’ Choice 2020.
Chegou a altura de voltar a conhecer o melhor da nossa tradição gastronómica com um twist, as especialidades que respeitam a terra, as suas gentes e as receitas típicas, mas que são confecionadas de forma inovadora e criativa. Porque há sempre espaço para mais um petisco, há sempre espaço para celebrar o que é diferente.
Saiba mais sobre este projeto em
https://observador.pt/seccao/centro-de-portugal/