O presidente da Associação de Oficiais das Forças Armadas estava, na terça-feira, a chegar à Assembleia da República para ser recebido na comissão de defesa quando soube da diretiva da tutela: um documento que tece várias recomendações para que os militares comuniquem entre si e para fora da instituição em respeito pela igualdade de género. “A primeira reação foi: vamos ignorar por ser uma patetice e mais uma tentativa de distrair as pessoas”, recordou ao Observador. Agora, a associação admite vir para a rua manifestar-se.
É que quando, nesse dia, abandonou a AR e o seu telefone começou a tocar. “As mulheres militares reagiram de uma forma violenta. E obrigaram, uma tomada de posição, porque se sentem discriminadas com aquilo”, explica o tenente-coronel António Mota. E “se há setor na sociedade portuguesa onde há maior equidade entre setores é nas forças armadas, porque permitem que já existam mulheres generais”, defende o oficial, que viu as mulheres entrarem nas instituições militares ainda na década de 90 e assistiu à luta para que homens e mulheres fossem considerados iguais. “Ascendem aos postos mais elevados da hierarquia, ganham exatamente o mesmo que os homens, porque auferem por posto” e desempenham as mesmas funções.
A diretiva enviada pelo Ministério da Defesa aos três ramos das Forças Armadas recomenda que a linguagem usada entre os militares e para fora da instituição respeite os dois géneros. Para tal devem os militares usar conceitos neutros que não definam o masculino e o feminino, como por exemplo: “sejam bem-vindos” deve ser trocado por “boas vindas a todas as pessoas”, coordenador por coordenação, entre múltiplas outras expressões. Um verdadeiro “acordo ortográfico”, ironiza o militar que representa a classe de oficiais.
A Associação pensou então em aproveitar esta diretiva para se fazer ouvir. É que nas últimas semanas os militares têm-se desdobrado em encontros com grupos parlamentares, já tentaram o ministro, mas querem mesmo é chegar ao primeiro-ministro António Costa para fazer ouvir as suas reivindicações. E este assunto, tomar agora esta prioridade, chega a ser, para os militares, chocante. “A grande preocupação [do Governo] não é resolver os grandes problemas, mas vir cá para fora com problemas destes”, critica.
“Estamos a ponderar fazer qualquer coisas mais ruidosa, mais mediática”, diz mesmo. “Uma manifestação?”, pergunta o Observador. “Não queremos fazer figuras de patetas. No cumprimento do nosso objetivo, de defender os nossos direitos, vamos ter que fazer mais qualquer coisa. O mais qualquer coisa poderá ser o sair à rua”, diz a pouco tempo de começar a reunião com o Conselho Nacional para o decidir e de onde “é pouco provável que não saia uma bomba”. E um dia antes da reunião com as associações de sargento e de praças que ainda desconhecem estas intenções.
Da Associação Nacional de Sargentos das Forças Armadas, pela voz de José Pereira, ainda não saiu uma decisão de manifestação. Mas a opinião de que há medidas “mais prementes” a tomar é a mesma. “Compreendemos que a Igualdade de Género é uma preocupação, mas que não merece um relevo como o que se está a dar. Há matérias com mais premência e que as pessoas estão mais preocupadas”, diz, lembrando os vencimentos congelados há dez anos, as promoções atrasadas e o estatuto do militar. “As forças armadas estão a definhar”, afirma, para mostrar que estão cada vez menos atrativas, ainda assim muito “mais à frente de problemas linguísticos”.
Já Paulo Amaral, que recentemente tomou posse como presidente da Associação de Praças da Armada, acrescenta que, além de todos os problemas numa instituição onde garante que homens e mulheres são tratados de forma igual, as associações sindiciais nem sequer foram ouvidas para esta diretiva. Quanto a juntar-se aos oficias na rua, decidirá esta quinta-feira, depois da reunião mensal entre todas as associações.