A Assembleia da República aprovou esta sexta-feira, em votação final global, o diploma que fixa um “período de nojo” de três anos entre o exercício de funções na banca comercial e a administração do Banco de Portugal.

O texto final aprovado esta sexta-feira- com votos contra do CDS-PP e a favor de PS, PAN, Chega e Iniciativa Liberal (abstenções das restantes bancadas e deputados) – , não inclui propostas do PAN e do PSD para que também fosse existisse um limite temporal entre o exercício de certos cargos governativos (primeiro-ministro e os relacionados com as Finanças) e funções de administração do Banco de Portugal (BdP).

O PAN, o autor original da iniciativa, e o PSD voltaram a obrigar à votação desses artigos esta sexta-feira em plenário – que tinham sido chumbados na quarta-feira em comissão -, mas voltaram a ser rejeitados por PS, BE, PCP, PEV e pelas duas deputadas não inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues. Continuará, assim, sem existir na legislação a obrigação de um intervalo temporal entre o exercício de cargos políticos e a ida para governador ou administrador do Banco de Portugal, tema que gerou polémica na recente nomeação do ex-ministro das Finanças Mário Centeno para dirigir o banco central. Passará a vigorar na lei que regula as regras de nomeação e dos demais membros do conselho de administração do BdP um “período de nojo” de três anos (o PAN propunha cinco, mas o PS introduziu uma alteração para três) para quem tenha exercido funções no setor privado (que até agora não existia).

O PCP ainda avocou para plenário a alteração da data de entrada em vigor da lei prevista no texto final – 01 de janeiro de 2021 -, mas essa pretensão foi ‘chumbada’ por PS e PSD.

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No debate das avocações em plenário, repetiram-se as trocas acusações entre as várias bancadas que existiram antes da nomeação de Mário Centeno.

O deputado do PSD Duarte Pacheco admitiu que, se no passado também governantes do seu partido passaram diretamente para o Banco de Portugal, “a democracia evoluiu e os procedimentos têm de ser alterados”.

“Há aqui um bloco de todas as esquerdas para continuar a permitir que os membros do Governo passem diretamente para a governação do Banco de Portugal”, criticou.

Pelo PS, Fernando Anastácio considerou que se o parlamento tivesse aprovado uma lei “ad hominem”– antes da nomeação de Mário Centeno – tal “envergonharia o regime parlamentar”.

“Não temos dúvidas que o interesse público deve ser defendido no exercício de cargos políticos, na administração pública, na administração do Banco de Portugal, não há aqui qualquer incompatibilidade, há sim entre quem vem dos regulados e o BdP”, defendeu, considerando que foi feita “uma boa lei que permite mais escrutínio e transparência”.

A líder parlamentar do PAN, Inês Sousa Real, concordou que existiu “um enorme avanço”, mas lamentou que tenha ficado de fora o ‘período de nojo’ para o poder político.

“A porta giratória também funciona entre Governo e Banco de Portugal”, disse, apelando a BE e PCP para que não “façam este jeito ao Bloco Central”, antes de serem rejeitadas as alterações. Inês Sousa Real criticou igualmente que o diploma apenas preveja a entrada em vigor em 01 de janeiro de 2021, considerando que tal significa “dar ao Governo um kit de mãos livres” para as nomeações que ainda falta fazer para a administração do banco central.

Duarte Alves, pelo PCP, concordou com este último ponto, por permitir que às nomeações feitas nas próximas semanas não se apliquem as novas regras, mas defendendo que “não existe qualquer conflito de interesses entre o exercício de cargos públicos e o Banco de Portugal, mas sim entre o setor que é regulado e o que o regula”.

Na mesma linha, a deputada do BE Mariana Mortágua defendeu que o partido não alterou “um milímetro” a sua posição, rejeitando igualmente que haja incompatibilidade “entre quem defende interesse público e quem defende interesse público”. A deputada lamentou que tenha sido rejeitada a proposta do BE para que a nomeação do governador do Banco de Portugal passasse a depender de um parecer vinculativo do parlamento.

Pelo CDS-PP – único partido que votou contra o texto final -, a deputada Cecília Meireles classificou como “uma triste história” a desta legislação. “O PS conseguiu que tudo o que seja aprovado hoje não se aplique a Mário Centeno”, lamentou, responsabilizando quer BE e PCP, mas também o PSD por não se ter oposto à nomeação do ministro das Finanças antes da discussão das novas regras.

O deputado único e líder do Chega, André Ventura, lamentou igualmente que a lei não tenha sido aprovada antes da nomeação de Centeno, enquanto João Cotrim Figueiredo, da Iniciativa Liberal, considerou que este processo “mostra muita das coisas que estão mal na política em Portugal” e deixou críticas ao PSD.

“O PSD não fica isento de responsabilidades, não permitiu que se discutisse este caso antes de se fazer a nomeação de Mário Centeno e temo que esta história da entrada em vigor da lei tenha a ver com interesses que tenham nos próximos administradores do Banco de Portugal”, alertou.