O antigo diretor-geral da Saúde Constantino Sakellarides destaca a importância de se fazer uma análise dos dados regionais e locais, e não apenas nacionais, para perceber o que está a acontecer na segunda vaga da covid-19.
“Temos de passar destes números (…) nacionais para uma análise mais detalhada, não só da evidência regional e local, mas das características de transmissão. Isso é particularmente importante neste momento”, defende o professor catedrático de Saúde Pública, em declarações telefónicas à agência Lusa.
Portugal registou este sábado o maior número de casos de infeção com o novo coronavírus desde o início da pandemia, em março, e o número de novos casos no país situou-se acima dos mil pelo terceiro dia consecutivo.
“Nestas circunstâncias, é muito importante não realizar só números nacionais, mas utilizar a situação regional e local”, frisa Constantino Sakellarides, realçando que “o equilíbrio entre a proteção e a necessidade de viver” tem de ser buscado numa análise abrangente.
O especialista não prevê um novo confinamento geral nacional, mas antecipa “a necessidade de fazer restrições a nível limitado, local, de vários tipos”.
Ora, a intervenção nas regiões com mais casos não pode ser baseada “nos somatórios nacionais”, porque o retrato que traçam “é muito incompleto e muito pouco elucidativo em relação ao que é preciso fazer”, frisa o professor.
“Uma coisa é um somatório nacional, outra coisa é a situação local e regional e as características dessa transmissão. É isso que nos permite defendermo-nos, mais ou menos, equilibrar melhor esta balança entre a proteção e a necessidade de continuarmos a viver”, insiste.
“Este agravamento em Portugal está em linha com o que está a acontecer na Europa Ocidental e na Europa Central”, observa Constantino Sakellarides. “Temos de olhar à volta”, recomenda.
“Os agravamentos [em Portugal] são regionais e locais, não há uma homogeneidade nacional”, sublinha, acrescentando ainda que os países não estão a revelar o mesmo fenómeno “ao mesmo tempo”.
Portanto, é preciso contextualizar os números e também analisá-los em função do que se passa nos países em redor de Portugal.
Reconhecendo que parece estar a verificar-se “uma aceleração” da segunda vaga da pandemia, à entrada no mês de outubro, o especialista nota que estas evoluções são “assíncronas, têm tempos diferentes”, nos vários países da Europa.
“Não temos padrão para saber como vai evoluir de facto”, admite o antigo diretor-geral da Saúde. “O capital de conhecimento acumulado sobre pandemias é muito pequeno e nunca [houve] uma pandemia de coronavírus. Sabemos muito pouco e, portanto, as nossas expectativas são frequentemente equivocadas. Esperávamos todos pelo outono/inverno e, no fim do verão, ou no pico do verão, tivemos o início da segunda onda”, observa.
“Não somos capazes de prever” como esta pandemia vai evoluir, reflete, recordando que no verão pensava-se que os casos iam diminuir e que depois, quando o tempo arrefecesse e as pessoas ficassem mais em casa, iriam aumentar. “Agravou-se muito antes, em pleno verão. Em Espanha, foi notório”, assinala.