“Não me recordo se passou na minha caixa de e-mail”, “é possível” ou “não tenho recordação”. As testemunhas do Sporting ouvidas esta quarta-feira naquela que é foi a 12.ª sessão do julgamento do Football Leaks mostraram alguma dificuldade em lembrar-se se os documentos alegamente roubados por Rui Pinto estavam ou não nas suas caixas de email, que terão sido acedidas pelo alegado hacker. Duas das três testemunhas foram mesmo confrontadas com alguns desses documentos, mas não os conseguiram reconhecer.

Otávio Machado, ex-dirigente do Sporting, foi a primeira testemunha a ser ouvida na sessão deste manhã. Apesar de reconhecer que o pré-contrato do clube com Andre Carrillo, divulgado no site Football Leaks, “poderia ter passado por lá”, pelo seu email, também admite que “outras pessoas poderão ter acesso” ao documento. “Percebo pouco dessas coisas”, acabou por comentar. Quanto ao acordo de compromisso do jogador peruano, as dúvidas foram as mesmas.

Também Rui Caeiro, ex-administrador da SAD leonina, não soube dizer ao tribunal se os documentos divulgados no Football Leaks, “foram tirados” da sua caixa de email. “Não me apercebi [da intrusão]”, explicou. A testemunha foi depois confrontada com quatro documentos, mas questionado pela Procuradora da República Marta Viegas sobre se eles estavam na sua caixa de email, não conseguiu dar essa garantia: “Não me recordo e não tenho a certeza que esteve na minha caixa de email”, disse em relação ao pré-contrato de Andre Carrillo. “Não me recordo se passou na minha caixa de correio. Estando assinado por mim, li-o certamente”, disse em relação a outro documento. Mas qual era a probabilidade de estar? “É possível. Muito provável e muito plausível”, acabou por dizer.

Otávio Machado sentiu-se “extremamente mal”. Augusto Inácio disse que Rui Pinto era um “denunciante das batotas do futebol português”.

O ex-dirigente do Sporting relatou também ao tribunal que se sentiu “extremamente mal” quando soube pela polícia que o seu email tinha sido acedido. “Jamais pensei que alguém tivesse interesse [no email]. No meu computador não passava nada”, disse. Otávio Machado explicou que se sentiu “magoado” com o facto de alguém poder suspeitar que podia estar a fazer “algo ilegal”.

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Senti-me…como hei-de dizer…violado no meu direito de privacidade e que era suspeito para um cidadão qualquer. Isso chocou-me profundamente e não admito a ninguém”, acrescentou.

Durante a tarde foram ainda ouvidas mais três testemunhas, que fizeram breves depoimentos maioritariamente para confirmar perante o tribunal que não estiveram em Budapeste na altura dos ataques e que, por essa razão, não foram eles a aceder aos seus próprios emails através da Hungria. Um deles, Augusto Inácio, ex-treinador do Sporting, confessou ao tribunal que “sinceramente“, não sentiu “nenhuma invasão”. Antes de entrar para o tribunal, o ex-treinador tinha defendido que Rui Pinto era um “denunciante das batotas do futebol português”.

Um discurso semelhante teve o antigo vice-presidente da modalidades do Sporting, José Vicente de Moura que admitiu que o alegado ataque ao Sporting passou “completamente despercebido”.

Percebi que houve problemas com os emails porque não conseguia entrar. Depois deram-me outra password, mas isso passou-me completamente despercebido”, explicou.

José Laranjeira, antigo membro do departamento de prospeção de jogadores do Sporting, também pareceu desvalorizar o ataque e explicou que fazia pouco uso do seu email — alegadamente acedido por Rui Pinto.

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O julgamento ainda tem mais uma sessão esta semana: esta quinta-feira deverá ser ouvido o ex-presidente do Sporting, Bruno de Carvalho, Virgílio Lopes e Pedro Almeida. Também Jorge Jesus poderá ser ouvido durante a tarde, mas o tribunal está ainda a tentar confirmar a sua presença.

Rui Pinto, o principal arguido, responde por 90 crimes — todos relacionados com o facto de ter acedido aos sistemas informáticos e caixas de emails de pessoas ligadas ao Sporting, à Doyen, à sociedade de advogados PLMJ, à Federação Portuguesa de Futebol, à Ordem dos Advogados e à PGR. Entre os visados estão Jorge Jesus, Bruno de Carvalho, o então diretor do DCIAP Amadeu Guerra ou o advogado José Miguel Júdice. São, assim 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por tentativa de extorsão ao fundo de investimento Doyen.

Aníbal Pinto, o seu advogado à data dos alegados crimes, responde pelo crime de tentativa de extorsão. Isto porque, segundo a investigação, Rui Pinto terá exigido à Doyen um pagamento entre 500 mil e um milhão de euros para que não publicasse documentos relacionados com a sociedade que celebra contratos com clubes de futebol a nível mundial. Aníbal Pinto, então advogado do hacker, terá servido de seu intermediário. E é por isso que se sentam os dois, lado a lado, em frente ao coletivo de juízes.

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O alegado pirata informático esteve em prisão preventiva desde 22 de março de 2019 e foi colocado em prisão domiciliária a 8 de abril deste ano, numa casa disponibilizada pela PJ. Na sequência de um requerimento apresentado pela defesa do arguido, a juíza Margarida Alves, presidente do coletivo de juízes — que está a julgar Rui Pinto e que tem como adjuntos os juízes Ana Paula Conceição e Pedro Lucas — decidiu colocá-lo em liberdade. O alegado pirata informático deixou as instalações da PJ no início de agosto e a sua morada atual é desconhecida.