“A reabertura das escolas na Alemanha sob medidas estritas de higiene combinadas com quarentena e medidas de contenção não aumentou o número de novos casos de infeção por SARS-CoV-2.” A conclusão é de três investigadores do Instituto de Economia do Trabalho (IZA, em Bona) e da Universidade de Bona.

Os resultados agora conhecidos vêm reforçar um relatório do Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC), do início de agosto, que, com base nos dados conhecidos na altura, concluía que ainda não tinha sido demonstrado que a reabertura dos estabelecimentos de ensino estivessem associados a aumentos significativos na transmissão comunitária (fora da escola).

O relatório do ECDC, baseado em vários estudos realizados até à data, dizia ainda que os surtos nas escolas eram raros — relembre-se que ter vários casos, não relacionados, não é um surto —, que a transmissão entre crianças nos estabelecimentos escolares era rara e que, quando as crianças apresentam sintomas na escola, muitas vezes a infeção aconteceu em contexto familiar ou social.

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A Alemanha foi dos primeiros países europeus a iniciar o ano letivo de 2020/2021. No início de agosto, alguns dos 16 estados alemães iniciaram as aulas presenciais, com as devidas medidas de higiene implementadas. Foram reportados casos de infeção entre alunos e funcionários e algumas escolas chegaram mesmo a encerrar, mas os investigadores consideram, no relatório do IZA, que a atenção dada ao assunto pelos media foi “desproporcional”.

Um outro estudo, realizado entre 11 de agosto e 15 de setembro, concluiu que menos de 1% das creches e jardins de infância fecharam, total ou parcialmente, devido a infeções com o novo coronavírus. Os dados foram reportados pelos estabelecimentos participantes (cerca de 10.000) e foram apresentados no relatório do projeto Corona KiTa, conduzido pelo Instituto da Juventude Alemão (DJI) e apoiado pelo Instituto Robert Koch.

No relatório do IZA, os investigadores dizem que, mesmo depois de analisar grupos mais pequenos e de testar a robustez dos resultados,  não encontram evidência de que a reabertura das escolas fizesse aumentar o número de novos casos. Muito pelo contrário, foram capazes de identificar até uma ligeira redução. As medidas de higiene, uso de máscara e a testagem e quarentena de casos suspeitos podem justificar estes resultados.

Outra razão apontada pelos investigadores é o facto de as crianças não poderem frequentar as aulas se tiverem qualquer sintoma que possa ser associado com uma infeção pelo novo coronavírus: são obrigadas a ficar em casa e os pais, muitas vezes, têm de faltar ao trabalho. Isto terá funcionado como uma espécie de incentivo para os pais terem mais atenção ao distanciamento social e às medidas de higiene de forma a que os filhos não ficassem doentes, segundo a hipótese dos investigadores.

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A equipa liderada por Ingo E. Isphording, especialista em Economia da Educação, analisou o número de novos casos em cada dia para os mais de 400 distritos alemães, divulgados pelo Instituto Robert Koch, nas duas semanas que antecederam o início das aulas e nas três semanas depois da reabertura. Como em alguns estados as escolas abriram mais tarde, as escolas que estavam encerradas quando outras já estavam abertas serviram de controlo. Ou seja, comparando locais com escolas abertas e escolas fechadas, os investigadores puderam verificar se havia variação no número de novos casos (ajustado ao número de habitantes).

Os autores do relatório do IZA admitem, no entanto, que o estudo apesar de importante também apresenta limitações. Desde logo porque, nas semanas avaliadas, a transmissão na comunidade era muito mais baixa do que o que se veio a verificar em setembro e outubro — com a Alemanha a bater vários recordes diários. Depois porque, as temperaturas mais frias do inverno vão reduzir a quantidade de atividades no exterior e o recomendado arejamento das salas, que podem potenciar os surtos em contexto escolar.

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O que os investigadores pretendem reforçar é que é necessário avaliar os custos e benefícios de encerrar ou reabrir os estabelecimentos de ensino. Por exemplo, o encerramento das escolas por causa da pandemia de Covid-19 afetou mais de mil milhões de crianças em todo o mundo, segundo dados da Unicef.

Esta medida, intensificou as diferenças entre crianças com níveis sócio-económicos distintos e colocou muitas crianças em risco de fome — porque a única refeição que tinham era na escola —, pobreza — porque os pais foram impedidos de trabalhar para ficar com os filhos —, violência física e sexual e isolamento social, alertou a UNESCO. Além disso, não poder frequentar a escola pode provocar problemas de desenvolvimento nas crianças e causar (ou agravar) problemas de saúde mental.