Na sequência do artigo “Médica ‘pela Verdade’ divulga receita para possíveis infetados testarem negativo ao coronavírus“, publicado a 23 de novembro, recebemos de Maria Margarida Gomes de Oliveira o seguinte Direito de Resposta, que publicamos ao abrigo da Lei nº.2/99, de 13 de Janeiro:

“Ex.mo Sr.Director:

Aos 23 de Novembro de 2020 foi publicado no jornal Observador uma peça jornalística que no seu todo, incluindo o título, assenta num argumento ou raciocínio construído com o objetivo de produzir a ilusão da verdade que, embora simule um acordo com as regras da lógica, apresenta na realidade, uma estrutura interna inconsistente, incorrecta e deliberadamente enganosa.

A dita “receita” para a lavagem das fossas nasais e da orofaringe a fim de “eliminar todos os restos virais” é na sua essência uma recomendação de higiene e de hábitos de vida saudável a que qualquer médico está obrigado na mesma proporção das recomendações duma alimentação saudável ou de um sono reparador. No caso concreto recomenda-se uma, dentre várias fórmulas
possíveis, para a limpeza de resíduos decorrentes da fisiologia do organismo os quais, com a lavagem da orofaringe e das fossas nasais, são assim eliminados com maior celeridade contribuindo para uma melhor saúde oral e respiratória.

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No contexto epidémico actual e como refere a própria notícia, “a ideia é eliminar restos virais dos locais onde é colhida a amostra por zaragatoa” uma vez que em qualquer técnica diagnóstica por esfregaço a limpeza da área a estudar pode aumentar a sensibilidade do teste ao proporcionar o contacto mais íntimo do algodão com a mucosa, dada a prévia eliminação de detritos. A lavagem não altera a especificidade do teste não induzindo falsos negativos pelo que o afirmado na notícia é falso pervertendo a intenção do que é recomendado.

Se os autores tivessem formação em saúde compreenderiam que se trata de uma precaução elementar de limpeza da área a examinar. Mas, porque ignorantes na matéria, fundamentam-se no “ouvir dizer”, com o entusiasmo dos desconhecedores, fazendo juízo de assuntos que nunca estudaram nem têm habilitações para avaliar e, certamente, porque a boa-fé não terá estado presente, inferindo (erradamente) que o procedimento recomendado teria um fim exactamente inverso ao seu propósito. Tal insinuação é ridícula. Os próprios técnicos de colheita, no caso de inflamação visível, procedem à lavagem das vias aéreas antes da mesma.

Pretende-se passar a mensagem que a médica tem por intenção, com a simples recomendação de higiene, ludibriar com dolo os casos positivos de Covid-19. Na realidade não são “falsos negativos” que a recomendação pretende gerar mas sim evitar a ocorrência de eventuais “falsos positivos” com a limpeza prévia da área de colheita.

É evidente, para quem não seja boçal, que uma vez o organismo limpo do lixo viral, se o indivíduo estiver infectado pelo SARS-Cov2 continuará sempre a testar positivo como aliás foi deixado claro na troca de mensagens. A lavagem das fossas nasais e da garganta com desinfectantes não afecta a detecção de doentes Covid19 pelo que afirmá-lo é cair no erro de Donald Trump quando sugeriu o uso de lixívia para tratar a infecção.

O que se intenta é diminuir a probabilidade de, alguém sem infecção, poder vir a testar positivo dada a, cientificamente comprovada, incapacidade dos testes Rt-PCR distinguirem o vírus íntegro – capaz de contagiar e de causar doença, de partículas virais remanescentes da acção do sistema imunitário, incapazes de causar doença tampouco de contagiar, facto que a própria DGS recentemente reconheceu, modificando os critérios de alta após a quarentena dispensando inclusive o “teste de cura”.

A noticia corrompe, quiçá intencionalmente, o propósito da médica, lançando-se num entusiástico coro de condenações e processos disciplinares, gravemente atentatórios da sua honra e dignidade e que envergonham a discussão científica e o bom senso, ao trazer à discussão questões bizarras como “a indução de falsos negativos”. Esta matéria será tratada pela respondente em sede penal apropriada contra os autores da noticia.

Os casos, referidos na peça, são tão só recomendações com valor equivalente às emitidas, por exemplo, pela DGS que, obviamente, não bulem com o segredo profissional por serem conselhos de higiene elementar a observar no dia a dia, permitindo facilitar a clearance de resíduos insalubres e desnecessários favorecendo a saúde e o bem estar dos visados e criando, por acréscimo e na presente conjuntura, um terreno optimizado para uma colheita fidedigna.

Crê a respondente que tampouco Galileu terá sido confrontado com tamanha deturpação. Vivemos de facto um século único e surpreendente. Pela negativa…

Sem outro assunto

Lisboa, 25 de Novembro de 2020

Maria Margarida Gomes de Oliveira”