Ronald Koeman mais relaxado, mais falador, mais expressivo. Essa mudança no estado de espírito do técnico holandês foi destacada por toda a imprensa, que viu nos dois triunfos consecutivos do Barcelona para a Liga frente a Levante e Real Sociedad pela margem mínima um balão de oxigénio para uma equipa que andou em muitos jogos à deriva. À 14.ª jornada, e só à 14.ª jornada, os catalães podiam alcançar pela primeira vez esta época uma série de três vitórias seguidas na receção a um Valencia que ainda esta semana se conseguiu safar nos descontos para a Taça do Rei diante do Terrasa, passando com dois golos de Gonçalo Guedes no prolongamento tendo pela frente um adversário do quarto escalão. Todavia, bastaram 45 minutos para os fantasmas voltarem a Camp Nou.

Apesar dos recentes resultados e de um acordo fundamental para a solvabilidade do clube com os jogadores a aceitarem não receber o salário de janeiro (e verem adiado o pagamento de alguns prémios em atraso), este Barça continua a viver num turbilhão de emoções. Em termos financeiros, a quebra abrupta de receitas sem a necessária redução das despesas mantém um cenário complicado e no vermelho; em termos institucionais, entre algumas provocações de Juan Laporta ao Real Madrid, a campanha eleitoral para o sufrágio de janeiro começa a mostrar que pode haver lavagem de muita “roupa suja” do passado; em termos desportivos, a polémica com Riqui Puig, apontado pelo técnico como o “bufo” de algumas informações que saiam para a imprensa. Daí que a vitória fosse tão importante para serenar ânimos e começar a construir um futuro que está agora preso no presente.

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“Os bons jogadores sabem sempre jogar bem e não dependem de quem está ao seu lado para o fazerem. Têm visão, têm qualidade, percebem o futebol. Vi sempre um bom ambiente no balneário, mesmo depois dos jogos em que perdemos. Foi muito importante o jogo que fizemos sem bola contra a Real Sociedad. Queremos continuar a dominar, a roubar bolas, a jogar na frente. É essa a ideia mas às vezes o jogo sai de uma forma diferente”, dizia Koeman no lançamento do encontro. E saiu mesmo, com mais uma exibição e um resultado a sair ao lado com culpas próprias não só na equipa inicial mas também, ou sobretudo, nas substituições que foi fazendo na partida.

Com mais posse mas grandes dificuldades em entrar na defensiva contrária, o Barcelona conseguiu nos primeiros 15 minutos controlar o encontro até sem bola mas começou depois a ter outros problemas bem aproveitados pelo Valencia, que aos poucos foi subindo no terreno e criou perigo com dois remates de meia distância do sempre ativo Gonçalo Guedes. A equipa de Javi Gracia sentia-se cada vez mais confortável num terreno que chegou a ser temido por qualquer adversário mas que hoje é fértil em surpresas e foi isso que aconteceu mais uma vez: depois de uma extraordinária defesa de Ter Stegen a remate de Soler, Diakhaby aproveitou o canto para inaugurar o marcador de cabeça sozinho na área (29′). As coisas já estavam complicadas para o Barça, podiam ter ficado ainda piores com o guarda-redes alemão a travar mais uma chance de Maxi Gómez mas aconteceu um “milagre”.

Numa grande penalidade muito duvidosa por alegado empurrão de Gayà sobre Griezmann que ao ser revisto valeu apenas a troca do vermelho direto pelo amarelo na ação disciplinar, Jaume Doménech ainda conseguiu travar a tentativa de Lionel Messi utilizando a estratégia que está a entrar na moda de começar por ficar de joelhos na linha (e que começou num guarda-redes dos juvenis do Racing) mas, no seguimento do lance, Jordi Alba assistiu para o desvio de cabeça do argentino na pequena área. Aos 33 anos, o número 10, El D10s da Catalunha, igualou o número recorde de golos por um só clube que pertencia a Pelé no Santos (643). Mas nem por isso aquele sorriso largo de alguém que anda bem com a vida se viu. E a segunda parte mostrou o porquê.

Depois de uma grande oportunidade falhada por Cheryshev sozinho na área após cruzamento de Gonçalo Guedes (49′), Ronald Araújo foi à área do Valencia fazer a remontada que tinha um herói improvável mas que colocava mais próxima a terceira vitória seguida, fundamental não só para serenar a equipa mas também para não deixar fugir na frente os adversários mais diretos de Madrid (e o Atlético já tinha ganho antes ao Elche, recuperando a liderança da Liga). No entanto, os visitantes mostraram que tinham ainda mais uma vida por gastar, chegando ao empate por Maxi Gómez em mais uma jogada iniciada nos pés de Gonçalo Guedes (69′). Com o jogo partido, a vitória podia cair para os dois lados mas não foi para nenhum e o Barcelona, que se perdeu ainda mais nas trocas de Koeman (tirou Coutinho para lançar o central Lenglet e trocou pouco depois Pedri por Pjanic) continua sem ganhar três encontros seguidos na Liga, estando a oito pontos do Atl. Madrid tendo mais um jogo.