António Costa volta a segurar a ministra da Justiça e já definiu os alvos a atacar no âmbito da polémica da nomeação do procurador europeu. São o eurodeputado Paulo Rangel e o ex-ministro social-democrata Miguel Poiares Maduro que, no entender do primeiro-ministro, estão a aproveitar a presidência portuguesa da União Europeia para “fazer campanha internacional contra Portugal”. E estão, para isso, a usar um caso que “não é sequer tema”, “não tem relevância nenhuma”. Além de Paulo Rangel e de Poiares Maduro, também o deputado do PSD responsável pela pasta da saúde, Ricardo Batista Leite, lidera “outra frente, a frente sanitária”, de campanha internacional contra Portugal.

Foi isto que disse António Costa na conferência de imprensa no final do Conselho de Ministros quando questionado sobre se mantinha a confiança na ministra da Justiça em relação ao caso da nomeação do procurador europeu José Guerra, sobretudo depois de ontem, no debate frente a André Ventura, Marcelo Rebelo de Sousa ter dado a entender que, se lhe competisse a ele, deixaria cair a ministra. Costa não só reafirmou a confiança em Francisca Van Dunem, que “agiu corretamente”, como explicou, passo a passo, o que aconteceu no processo e como, em alternativa, os culpados eram outros. “À exceção de Paulo Rangel e Poiares Maduro que lideram uma campanha internacional contra Portugal em que participa também, numa outra frente sanitária, o deputado Ricardo Baptista Leite, este tema não tem a menor relevância política”, afirma António Costa frisando que, até para o presidente do Conselho Europeu, com quem esteve há dois dias em Lisboa, este é “um não tema”.

António Costa não se poupou nas palavras e garantiu que não teria a “menor complacência” contra quem está por detrás destas campanhas difamatórias com o intuito de manchar a imagem do país lá fora. “As tentativas de alguns de quererem transformar a presidência portuguesa num palco de oposição ao Governo português é um precedente gravíssimo e com o qual não colaboraremos minimamente. Estamos totalmente de consciência tranquila”, disse António Costa Costa notando ainda que o Executivo podia ter “escolhido o procurador que bem lhe apetecesse”, mas que alterou a lei para que o procurador fosse escolhido por um órgão independente — o Conselho Superior do Ministério Público.

O primeiro-ministro terminou a conferência de imprensa a afirmar que o Governo não terá “menor complacência” contra quem “quer utilizar a presidência portuguesa para fazer campanha contra Portugal”. “Disse aqui os nomes porque sei bem quem anda a organizar esta campanha internacional”, rematou o primeiro-ministro.

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Poiares Maduro acusa Costa de ser “profundamente anti-democrático”. Rangel diz que “tom ameaçador não intimida”

Em reação às declarações de António Costa, Paulo Rangel enviou um comunicado às redações acusando o primeiro-ministro de estar a usar “um tom ameaçador para distrair atenções”, mas afirmando que isso não “apaga falsidades” nem “intimida”. “É lamentável que o primeiro-ministro confunda o exercício legítimo de escrutínio da ação do Governo com uma campanha para denegrir a imagem externa do país”, diz.

“Manterei o exercício democrático de oposição e fiscalização do governo, lutarei sempre e em todas as instâncias pela verdade e dignidade do Estado português, porei sempre os interesses de Portugal – incluindo na presidência portuguesa – na linha da frente da atividade política e cívica”, diz o eurodeputado social-democrata.

No entender de Paulo Rangel, o Governo está apenas a querer “gerar confusão, cirando a ilusão de que é nacional uma competência que é europeia”. E tudo visa apenas esconder uma coisa: “Que o Governo português mentiu objetivamente ao Conselho da União Europeia”. Paulo Rangel cita mesmo o artigo 16.º do Regulamento 2017/1939 da Procuradoria Europeia para, ponto por ponto, mostrar que o Governo está a faltar à verdade. Primeiro, porque o regulamento diz que compete ao Conselho da UE e não aos governos nacionais nomear o procurador europeu; depois, porque a ordenação dos 3 candidatos cabe ao comité de seleção europeu e não ao Ministério Público, e depois porque, ao contrário do que Costa diz, o comité de seleção é um órgão “independente”.

No Twitter, Miguel Poiares Maduro já reagiu à acusação de António Costa classificando-a de “uma atitude inaceitável para um primeiro-ministro”. “Confundir uma crítica ao governo com uma crítica ao país é profundamente anti-democrático”, diz o ex-ministro, lembrando que não tem atualmente nenhum cargo público pelo que não é mais do que um cidadão a ser acusado publicamente pelo primeiro-ministro de uma coisa tão grave como de ser um dos líderes de uma campanha contra o país.

Em declarações à Lusa e ao Observador, Poiares Maduro insiste que é “profundamente antidemocrático” confundir crítica com traição. “Acho que confundir uma crítica ao Governo, ou a um ministro do Governo ou a uma decisão da ministra da Justiça, com uma crítica ao país ou com um ato de traição contra o país é dificilmente qualificável”, disse.

Também a socialista Ana Gomes se pôs ao lado do ex-ministro do PSD e criticou a atitude de António Costa, dizendo que é “errada e inaceitável”. “Não vale tudo”, diz a ex-eurodeputada socialista que não tem o apoio formal do PS na sua candidatura a Belém.

Para António Costa, a ministra da Justiça agiu corretamente por ter posto a decisão nas mãos de um órgão independente e equaciona um outro cenário: se Portugal tivesse ignorado a escolha do CSMP e, em vez disso, tivesse aceitado a escolha do Conselho Europeu “o que seria?”. “Imagino a polémica que não iria em Portugal se em vez de termos designado o candidato do CSMP, escolhêssemos o candidato que fosse escolhido pelo Conselho Europeu. Imaginam o que era?”, atirou.

O único erro, no entender do primeiro-ministro, foi haver “dois erros” na carta enviada ao embaixador português junto da União Europeia. Que foi resolvido. “Quando detetamos, a ministra fez o que lhe competia, deu indicações ao embaixador para corrigir os erros que se verificavam na carta de novembro de 2019. São dois lapsos, que não deviam ter acontecido, mas aconteceram e o diretor geral da política de justiça assumiu-os e apresentou a sua demissão”. Dito isto, Costa reafirma a confiança nos seus ministros e deixa um recado a Marcelo nas entrelinhas: “Compete ao primeiro-ministro indicar e escolher os ministros, e é perante o primeiro-ministro que cada um responde”.

Costa segura Van Dunem e reafirma “total confiança política” na ministra da Justiça