Rui Roque, o militante que apresentou uma moção sobre a remoção dos ovários na II Convenção Nacional do Chega, foi suspenso do partido por ordem da direção nacional. A decisão surge dias depois de Roque ter apresentado uma lista para ser delegado na próxima Convenção, mais de cinco meses após a apresentação da polémica moção. A direção do Chega diz ter existido um “ato ilícito” que levou à suspensão provisória do militante e fonte do partido confirmou ao Observador que o que está em causa é a moção relativa à remoção dos ovários. O processo segue agora os trâmites normais no Conselho de Jurisdição, que pode decidir pela expulsão — a punição máxima para os militantes.

No Regulamento Disciplinar do Chega, nomeadamente no artigo 21 referido na informação relativa a Rui Roque, pode ler-se que a suspensão provisória de um militante pode acontecer “perante factos de notória gravidade” e é aprovada por maioria na direção, sendo que a decisão final do Conselho de Jurisdição “deve ser precedida obrigatoriamente de audição do militante visado, podendo este facultar ao CJN todos os elementos probatórios considerados relevantes para aquela decisão, até 15 dias após a referida audição”.

O militante é causa é Rui Roque, gestor de 44 anos. Antes do Chega, fez parte do PNR entre 2007 a 2014 no PNR, partido em que foi cabeça de lista pelo Algarve em Legislativas em 2009 e 2011 e também candidato ao Parlamento Europeu em 2009 e 2014. Em 2019 esteve com Pedro Santana Lopes e foi o diretor de campanha distrital no Algarve do partido Aliança nas eleições Legislativas. Rui Roque tem ainda ligações à associação Portugueses Primeiro, de cariz nacionalista.

A moção polémica que levou o próprio Chega a demarcar-se e a suspender um militante

Às mulheres que abortem no Serviço Público de Saúde, por razões que não sejam de perigo imediato para a sua saúde, cujo bebé não apresente malformações ou tenham sido vítimas de violação, devem ser retirados os ovários, como forma de retirar ao Estado o dever de matar recorrentemente portugueses por nascer, que não têm quem os defenda no quadro atual.”

A frase fazia parte da moção apresentada por Rui Roque na Convenção Nacional do Chega, nos dias 19 e 20 de julho, em Évora, e que foi chumbada pelos militantes com 216 votos contra, apenas 38 a favor. O que significa que só 15% dos delegados que votaram (de braço no ar) concordaram com a proposta.

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Logo nessa altura, o Chega demarcou-se da proposta, dizendo que “ataca de forma ostensiva, não só o bom nome do partido e os seus princípios e valores, como também todas as mulheres do país na sua dignidade e direitos, tal como prevê a lei em vigor”. André Ventura garantiu que ia propor a “suspensão imediata do militante com vista à sua consequente expulsão” e esta acaba por acontecer vários meses depois.

Fact Check. Chega rejeitou moção para retirar ovários a mulheres que abortam?

Na passada sexta-feira, Rui Roque recebeu um e-mail a informar da “suspensão provisória do seu estatuto de militante”, que tem “efeitos, entre outros, quanto à capacidade eleitoral, ativa e passiva, e bem assim quanto a cargos ou funções, eletivos e de nomeação, até conclusão do processo”. O militante irá ter acesso à participação disciplinar mais tarde, mas o processo segue para o Conselho de Jurisdição, após a decisão da direção nacional do partido.

Rui Roque acredita que a comunicação da decisão foi espoletada pela candidatura à Convenção Nacional do Chega, sendo que encabeçava uma das listas de Faro para eleição de delegados — que foi conhecida no dia 26 de fevereiro. “André Ventura disse-me que pessoas como eu (mais radicais) nunca vão ter possibilidade de ter cargos dentro do partido, seja a nível local, seja a nível nacional”, referiu ao Observador.

O militante não quer ser “nenhuma pedra no sapato” para o partido, mas lamenta este tipo de processo num “partido que pretende ser contra o sistema”. Esta suspensão foi, na visão de Rui Roque, um “método legal” para o impedir de ir à III Convenção Nacional, o que diz ser “lamentável” e um processo para “bloquear a participação democrática”.

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