Sempre que se fala de autonomia, os utilizadores de veículos eléctricos pensam imediatamente nos quilómetros que determinada capacidade de bateria lhes permite percorrer. Esquecem-se, contudo, que não é apenas o motor de tracção que extrai energia do acumulador, obrigando também a levar em linha de conta a electricidade necessária para alimentar todos os sistemas acessórios, do ar condicionado ao sistema de infoentretenimento, pois os processadores consomem substancialmente mais do que se pode imaginar. Já se sabe que a Tesla lidera o mercado em termos de eficiência das baterias – já o fazia com as células 2170 e com as novas 4680 a vantagem parece ser ainda maior – e dos motores, mas um estudo da consultora britânica IDTechEx veio chamar a atenção para o avanço que o construtor norte-americano possuirá igualmente no domínio dos inversores, que internamente transformam a corrente contínua (DC) em alterna (AC) e vice-versa.
Os veículos eléctricos são muito mais sensíveis em relação ao consumo de energia do que os seus rivais a gasolina ou a gasóleo. O que se percebe, uma vez que a maior bateria do mercado possui uma capacidade de 100 kWh, enquanto um automóvel com um depósito com 60 litros transporta na realidade 534 kWh de energia, se for a gasolina (1 litro equivale a cerca de 8,9 kWh), ou 600 kWh se trabalhar a gasóleo (10 kWh/litro). A vantagem para os veículos eléctricos é que os seus motores são muito mais eficientes, conseguindo transformar 97% da energia consumida em trabalho, enquanto um motor a gasolina se fica em média pelos 30%, ou pelos 40% se for diesel.
Se há muitos fabricantes de motores eléctricos no mercado que reivindicam eficiências de 97%, a novidade é esta consultora afirmar que a Tesla consegue assegurar 97%, mesmo considerando o conjunto motor/inversor, graças a mais uma das suas inovações.
O truque está no carboneto de silício
Os inversores convertem a corrente alterna da rede eléctrica nacional em corrente contínua, que é armazenada pela bateria, para depois realizarem a operação inversa quando é necessário ir buscar energia ao acumulador para alimentar o motor, se este trabalhar em AC, ou durante a regeneração de energia na travagem, que também é produzida pelo motor em AC e necessita de ser convertida em DC para ser armazenada. Esta conversão gera aquecimento e perdas de energia, limitando a autonomia. Consciente disso, a Tesla trabalhou no desenvolvimento de transístores (na realidade são MOSFET, de metal-oxide-semicondutor field-effect transistor) que permitissem conceber inversores mais pequenos e leves.
Para o conseguir, em vez de recorrer aos sistemas tradicionais, que usam transístores à base de silício (Si IGBT, de silicon insulated-gate bipolar transistors), avançou para uma solução mais sofisticada e indicada para potência elevadas, à base de carboneto (ou carbeto) de silício (SiC MOSFET). A decisão não é nova, pois foi estreada em 2017 com o Model 3, o que permitiu à Tesla exibir um inversor com apenas 4,8 kg, contra os 8,23 kg do Jaguar I-Pace ou os 11,15 kg do Nissan Leaf, com o volume do componente a variar na mesma proporção.
Em 2017, os inversores com os SiC MOSFET eram ainda muito caros, mas a segunda geração destes semicondutores, que surgiram com o Model Y em 2020, revelou-se já muito competitiva, com preços similares aos Si IGBT. E a expectativa é que os custos continuem a baixar a um ritmo acelerado (veja na galeria a evolução da curva dos custos). Mas talvez as maiores vantagens dos inversores com os transístores em SiC (em que o carboneto de silício também é possível lapidar como se tratasse de diamantes sintéticos) sejam o menor consumo de energia e a menor necessidade de refrigeração, melhorando a eficiência no carregamento e deixando mais energia na bateria para alimentar o motor e conferir mais autonomia ao veículo.