O dr. Dória, como era conhecido João Dória Nóbrega, morreu na madrugada desta sexta-feira, vítima de um AVC, soube o Observador junto de fontes familiares. Tinha 86 anos e fora durante décadas médico na Maternidade Alfredo da Costa, tendo continuado a realizar partos até aos 80 anos.
Ginecologista e obstetra, a sua carreira está intimamente ligada quer à introdução e ao desenvolvimento do Planeamento Familiar em Portugal, quer aos esforços para diminuir a mortalidade infantil e perinatal, que era elevadíssima na época em que começou a exercer (a taxa de mortalidade infantil em Portugal passou de 42 por mil em 1960 para apenas 3,5 em 2019, uma das mais baixas do mundo).
Numa entrevista que deu a Anabela Mota Ribeiro em 2015 diria que nessa frente a grande mudança aconteceu “doze anos depois do 25 de Abril, quando para o Ministério da Saúde foi uma mulher, Leonor Beleza. As mulheres portuguesas têm muito a agradecer a duas mulheres. A Leonor Beleza, que viu a coisa no geral. E a Maria José Nogueira Pinto, que foi directora da maternidade durante algum tempo e fez uma reviravolta naquilo.”
“O dr. Dória foi a pessoa mais moderna que conheci”
João Dória Nóbrega foi “extremamente importante na medicina materno-fetal”, começa por dizer Maria José Alves, responsável por esse departamento na Maternidade Alfredo da Costa, em Lisboa. “Não se pode falar na história da obstetrícia na MAC sem falar dele”, continua, afirmando que foi o médico quem encetou o primeiro diálogo entre obstetrícia e pediatria naquela unidade. “Ele era uma visionário, foi a pessoa mais moderna que conheci e que vou conhecer durante muito tempo. Nunca o vi rejeitar uma ideia nova ou diferente do seu tempo”, esclarece ao Observador, focando a forma como o obstetra analisava o potencial de novas sugestões sem as rejeitar à priori.
A ele, Maria José Alves atribui ainda o arranque das consultas multidisciplinares na MAC, integrando vários profissionais de saúde para uma bem-sucedida vigilância da gravidez. “Estas consultas foram reproduzidas em muitos hospitais, mas começaram com a mente visionária do dr. Dória.” A atual diretora do serviço de medicina materno-fetal, primeiramente dirigida por João Dória Nóbrega, destaca ainda a forma como este ensinou os colegas a encarar o erro, olhando para o futuro e procurando sempre refletir sobre o que correu mal.
Maria José Alves trabalhou com o ginecologista e obstetra durante uma década e assegura que, mesmo já estando reformado e em casa, continuava a atualizar-se. “Ele fez com que vestíssemos a camisola da casa [da MAC]. Ele vai ficar sempre connosco, os seus conhecimentos também.”