Nos primeiros três meses de 2021, as receitas da Farfetch cresceram 46% para 485 milhões de dólares, quando comparadas com o mesmo período do ano passado. O volume de negócios subiu 50% (quando comparado com o trimestre homólogo) para 916 milhões de dólares. E os resultados operacionais, o EBITDA [lucros antes de juros, impostos, depreciações e amortizações], que tinham sido pela primeira vez positivos no final do ano passado (10,376 milhões), desceram agora para 19 milhões negativos — uma melhoria face ao resultado que a empresa tinha tido no mesmo trimestre de 2020 (22 milhões negativos).

Além deste crescimento, a Farfetch também apresentou um lucro depois de impostos de 516,7 milhões de dólares. É a primeira vez que acontece desde que a empresa foi admitida na bolsa de Nova Iorque, em setembro de 2018. Nos resultados divulgados esta quinta-feira, a empresa justifica que este resultado positivo é impactado por “660 milhões de dólares em “benefício non-cash [não monetários] originado pelo impacto de um preço de ação mais baixo, nos itens detidos a um valor justo e a redimensionamentos”. Ou seja, o lucro deste trimestre foi causado pela desvalorização das ações da empresa desde dezembro.

Ao Observador, Luís Teixeira, responsável pelas operações da Farfetch, explica que, tal como aconteceu com os prejuízos de trimestres passados, estes lucros são apenas “contabilísticos”, existem para efeitos de contabilidades, mas, na prática, não são reais.

“Tivemos lucros de 516 milhões, devido a 660 milhões de itens não monetários, que têm a ver com a questão das nossas obrigações convertíveis e, tal como no passado já tínhamos dito que não dávamos muita importância aos prejuízos, da mesma forma que agora dizemos que esses mesmo lucros têm o mesmo valor para nós. O que temos a ressalvar é o EBITDA e entregámos um EBITDA negativo de 19 milhões, que está dentro daquilo que eram as nossas estimativas e para o ano continuamos a reiterar o nosso compromisso de break-even [atingir a rentabilidade]”, explicou o COO.

Quanto à descida do preço das ações, que teve impacto nas obrigações convertíveis, Luís Teixeira diz que se deveu a “todo um contexto estrutural e macroeconómico”, que acabou por provocar “flutuações nos mercados”, mas que a empresa se manteve sempre “muito focada” naquela que é a sua missão e compromissos com os  investidores.

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“Houve contextos de mercado que são estruturais e macroeconómicos que afetaram varias empresas, entre as quais a Farfetch. E continuamos muito focados naquilo que é a nossa missão, no negócio e no que entregamos. E estamos não só a entregar, como a bater aquilo que são as expectativas“, acrescentou.

No mesmo trimestre de 2020, a plataforma online de moda de luxo tinha apresentado perdas na ordem dos 79 milhões. E, no último trimestre de 2021, os prejuízos tinham disparado para 2,3 mil milhões de dólares. Para este ano, Elliot Jordan, responsável financeiro da Farfetch diz que está “ainda mais otimista” com as expectativas de crescimento para este ano” e diz que a empresa continua focada em chegar ao final de 2021 com lucro.

As perspetivas para o ano também foram atualizadas. A empresa estima agora chegar ao final de 2021 com a plataforma a faturar 3,865 mil milhões de dólares e com uma margem nos resultados operacionais positiva entre 1% e 2%.

“A Farfetch teve um tremendo arranque em 2021, com uma aceleração do negócio mais forte do que o esperado, no primeiro trimestre, com expectativas de crescimento anuais maiores do que o inicialmente previsto. As nossas parcerias de marca nunca foram tão fortes e as nossas iniciativas para a construção de clientes e marcas estão a ecoar bem para impulsionar o conhecimento existente sobre o nosso valor e a retenção dos nossos valiosos consumidores”, afirmou o fundador e presidente José Neves, no relatório e contas.

Em fevereiro, Luís Teixeira já tinha explicado ao Observador que os prejuízos eram “puramente contabilísticos”. Ou seja, não diziam respeito a dinheiro que estivesse a sair da empresa, mas ao valor das ações que estavam alocadas aos mais de 5 mil colaboradores da Farfetch (fazem parte dos benefícios dos trabalhadores) e ao investimento de 1,2 mil milhões que a Alibaba e a Richemont fizeram em 2020 na tecnológica, através de obrigações convertíveis. Com a desvalorização das ações, a lógica inverte-se e estes itens não monetários refletem-se em lucros.

“É puramente contabilístico.” Como a Farfetch conseguiu ter lucros e prejuízos num só trimestre

Para o resto do ano, Luís Teixeira diz que o foco é “muito simples”: “continuar a crescer e a capturar quota de mercado, fazer crescer a plataforma digital de 35% a 40% — “o que representa um crescimento entre 90 a 100% em dois anos”. Além disso, a empresa quer reforçar as parcerias de luxo na China, o Luxury New Retail, “que é o retalho do futuro” e a marca Farfetch. “Adquirimos quase mais 500 mil novos clientes este trimestre, que compram a um valor superior e que compram mais”, diz.

Sobre a recuperação da pandemia e uma eventual aceleração das viagens e do turismo, o COO está confiante de que não vai ter impacto no desempenho da Farfetch. “Acreditamos que vamos ainda crescer mais rápido, por isso é que revimos o guidance em alta e esperamos que a pandemia passe e passe rápido. Efetivamente, houve uma aceleração da penetração do online para aquilo que já era esperado a médio prazo. Mas os nossos clientes não só nos dizem que vão continuar a comprar como, efetivamente, o comportamento deles nos diz que vão continuar a comprar. O online veio para ficar”, refere.

Recentemente, a Farfetch foi distinguida como uma das 100 empresas mais influentes pela revista Time, naquele que foi o primeiro ranking da empresa para o setor presencial.

No último trimestre de 2020, as receitas da Farfetch cresceram 41% no último trimestre do ano (quando comparadas com o período homólogo) para 540 milhões de dólares e, pela primeira vez na história, a empresa atingiu resultados operacionais positivos (lucro) — o EBITDA [lucros antes de juros, impostos, depreciações e amortizações] ajustado passou do vermelho para o verde, ou seja, de 18 milhões negativos em 2019 para 10,376 milhões de dólares positivos em 2020. O volume de negócios também cresceu 43% e ultrapassou os mil milhões de dólares.

Farfetch teve lucros operacionais pela primeira vez. Valorização das ações fez disparar os prejuízos

A par do crescimento das receitas no último trimestre do ano, a dos prejuízos, que dispararam para 2,3 mil milhões de dólares. No entanto, mais de 91% (2,1 mil milhões) destas perdas diziam respeito a um “impacto não monetário”, ou seja, estavam relacionados com a valorização do preço das ações da Farfetch e com o financiamento que foi negociado em obrigações convertíveis. No mesmo período do ano anterior, as perdas foram de 110 milhões de dólares. Ao todo, em 2020, o grupo acumulou um prejuízo de 3,3 mil milhões de dólares. Em 2019, as perdas tinham sido de 373,6 milhões (cerca de 10 vezes menos).

*Atualizado na sexta-feira com declarações de Luís Teixeira