A defesa de João Manso Neto (ex-líder da EDP Renováveis) teve uma derrota relevante no Supremo Tribunal de Justiça (STJ). Os conselheiros Maria Simão Gomes e Nuno Gonçalves rejeitaram um recurso que pretendia anular prova indiciária fulcral para o Ministério Público (MP) por “inadmissibilidade legal.”

Ou seja, o objeto do recurso dos advogados João Medeiros, Rui Costa Pereira e Inês Almeida Costa não foi sequer apreciado pelo STJ por o mesmo não ser passível de recurso para a cúpula do poder judicial.

Apesar de a decisão ainda ser passível de reclamação para o STJ e de recurso para o Tribunal Constitucional, esta decisão faz com que seja pouco provável que os argumentos da defesa venham a ter sucesso. Logo, o despacho de encerramento de inquérito e consequente acusação ficou mais próximo num processo que tem como principais arguidos Manuel Pinho (ex-ministro da Economia), António Mexia, João Manso Neto, João Conceição (administrador da REN) e Miguel Barreto (ex-diretor-geral da Energia).

Acusação do caso EDP volta a atrasar-se devido a novo recurso

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O Observador tentou obter uma reação da defesa de João Manso Neto mas tal não foi possível até ao momento.

Acusação mais próxima

A derrota é relevante porque é mais uma tentativa sem sucesso da equipa de defesa de João Manso Neto e António Mexia de tentar anular uma das principais provas indiciárias que o Ministério Público tem usado contra os ex-líderes do Grupo EDP: os emails trocados entre os ex-homens fortes da principal elétrica nacional.

No caso em concreto, está em causa uma decisão do juiz Carlos Alexandre (então titular dos autos no Tribunal Central de Instrução Criminal em substituição de Ivo Rosa) que a 20 de setembro de 2020 deferiu uma promoção dos procuradores Carlos Casimiro e Hugo Neto que requereram a junção de mais emails de António Mexia e de João Manso Neto aos autos. Muitas outras comunicações eletrónicas foram juntas aos autos, como se pode ver aqui e aqui.

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A defesa de Manso Neto recorreu para a Relação de Lisboa, tendo os desembargadores rejeitado em janeiro deste ano os seus argumentos, como o Observador noticiou aqui. Mais: o relator Rui Teixeira colocou mesmo em causa a leitura restritiva que o juiz Ivo Rosa (o magistrado que voltou a ser o titular dos autos) faz do uso de emails no caso EDP como prova indiciária. De facto, Rosa tentou restringir ao máximo as pesquisas do MP nas caixas de correio de Mexia e de Manso Neto e chegou mesmo a rejeitar por diversas vezes desse tipo de prova indiciária.

Ora, João Medeiros, líder da equipa de defesa de Mexia e de Manso Neto, entendeu que a visão do desembargador Rui Teixeira colocava em causa jurisprudência sobre esta matéria e também outra decisão tomada pela mesma Relação de Lisboa nestes autos do processo EDP que confirmou a anulação do juiz Ivo Rosa da apreensão de emails da consultora BCG e de Rui Cartaxo, ex-presidente da REN, por falta de uma autorização prévia do próprio juiz de instrução criminal. Daí a alegação de violação de caso julgado.

Em suma: a defesa de João Manso Neto e António Mexia alega que a Relação de Lisboa não pode decidir de forma diferente sobre a mesma matéria e no mesmo processo, argumentando ainda que também no caso dos gestores da EDP não houve qualquer autorização prévia do juiz de instrução criminal.

A decisão do Supremo

Os conselheiros Maria Simão Gomes e Nuno Gonçalves nem sequer quiseram ouvir os argumentos centrais do recurso da defesa por entenderem que ele não era admissível por duas razões:

  • Estando em causa “questões processuais de natureza interlocutória” que tinham sido decididas pela Relação de Lisboa, o Código de Processo Penal não admite recurso para o Supremo;
  • Sobre a alegada violação do caso julgado, os conselheiros entenderam igualmente que a lei não permite o recurso para o STJ. Até porque tal argumento não tinha sido invocado na primeira instância ou na Relação de Lisboa. Concordando com a posição que o MP assumiu em resposta ao recurso, fizeram questão de citar a crítica de que estávamos perante “um abuso de direito, por violação do princípio da boa-fé processual.”

Resta saber se o inevitável recurso da defesa de João Manso Neto para o Tribunal Constitucional terá efeito suspensivo ou devolutivo. Se for o primeiro caso, o MP continuará impossibilitado de juntar e analisar os emails que foram autorizados pelo juiz Carlos Alexandre em setembro de 2020.

Os procuradores Carlos Casimiro e Hugo Neto já tinham defendido que o recurso para a Relação de Lisboa deveria ter efeito devolutivo e assim deve continuar a argumentar.

Com efeito suspensivo ou devolutivo, é provável que o inquérito do chamado caso EDP seja encerrado este ano.