Ao final da manhã, o primeiro-ministro esteve num “momento histórico” para a GNR, a condecoração e entrega da espada de oficial-general ao primeiro brigadeiro-general da Guarda. Mas o foco estava longe daquela sala do quartel do Carmo, em Lisboa, mas antes em Budapeste, onde está o Presidente da República a acompanhar a seleção nacional de futebol. As duas figuras desentenderam-se em declarações públicas sobre o desconfinamento, e António Costa veio tentar pôr água na fervura, embora assuma que nem sempre concordam — e neste momento concreto, não estão perfeitamente alinhados.

Abordado pelos jornalistas, António Costa começou por se mostrar desentendido. “Desautorizar o Presidente da República?” Mas sabia o que lhe estavam a perguntar e tinha ouvido bem Marcelo Rebelo de Sousa dizer, no dia anterior, relembrar os poderes presidenciais face ao primeiro-ministro, no caso um que tinha acabado de dizer que não se podem dar as garantias que Marcelo tinha dado sobre o processo de desconfinamento.

Um pingue-pongue duro entre os dois que começou depois de o Presidente ter afirmado que com ele o desconfinamento não volta tarás. Numa altura em que Lisboa já furou a linha vermelha do número de casos por cem mil habitantes (240) e pode mesmo vir a dar um passo atrás no desconfinamento, as palavras de Marcelo contrariaram todas estas dúvidas: “Já não voltamos para trás. Não é o problema de saber se pode ser, deve ser, ou não. Não vai haver. Comigo não vai haver. Naquilo que depender do Presidente da República não se volta atrás”.

Ora, no dia seguinte António Costa foi mais comedido. Aliás, confrontado com as certezas presidenciais, o primeiro-ministro afirmou: “Se alguém pode garantir [que não se volta atrás no desconfinamento]? Não, creio que nem o senhor Presidente da República seguramente o pode fazer, nem o fez”. Mas Marcelo tinha feito e Costa assumiu esta terça-feira que nem sempre estão de acordo. Não era sequer a primeira vez no tempo da pandemia — ainda que jure a pés juntos que “nunca houve uma ação desarticulada entre o primeiro-ministro e o Presidente da República sobretudo em relação ao combate à pandemia”.

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Marcelo. “Comigo não vai haver” volta atrás no desconfinamento

“Nem sempre pensamos o mesmo”, assumiu perante os jornalistas falando da sua relação com o Presidente e desvalorizando que exista um problema. “Não vale a pena andarem a criar romances, deixemos para a ficção porque a realidade já é suficientemente densa para nos poder ocupar”.

Costa considera que o que Marcelo respondeu, relembrando o poder presidencial de nomear o primeiro-ministro, foi “uma coisa óbvia. Por natureza o primeiro-ministro não desautoriza o Presidente. Deve haver aí uma confusão qualquer”. Admitiu que as palavras eram para si,  mas garantindo ao mesmo tempo: “Nunca me passaria pela cabeça desautorizar o Presidente da República. É tudo um equívoco entre as perguntas que foram feitas e as respostas que foram dadas”.

“Entre intriga, confusão, mal entendimento, há alguma coisa, agora não há seguramente qualquer conflito como aliás não tem existido”, voltou a garantir saindo do quartel do Carmo sem responder a mais perguntas dos jornalistas.