A Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) afirmou na passada quinta-feira que as propostas do PS e PSD sobre o enriquecimento ilícito em altos cargos públicos “mantêm os alçapões que impedem que a lei funcione”.
À saída de uma audiência com o Presidente da República, o presidente da ASJP, Manuel Soares, disse ter transmitido a Marcelo Rebelo de Sousa a “ideia” da Associação Sindical para legislação sobre o enriquecimento ilícito dos titulares de altos cargos públicos, bem como a “dificuldade” que está a ter a com os projetos do PS e PSD. A ASJP entregou aos grupos parlamentares em abril uma proposta de alteração à lei com vista a uma “punição mais eficaz” de titulares de funções públicas, em caso de ocultação intencional de riqueza.
No preâmbulo da proposta, a que teve acesso, a ASJP refere que o objetivo é uma “punição mais eficaz do ato de ocultação intencional de riqueza adquirida no período correspondente ao exercício dos cargos previstos na LOD [Lei de Obrigações Declarativas], independentemente da licitude da sua fonte de aquisição”, através da alteração de normas da referida lei que, desde 2019, abrange os magistrados judiciais.
Desde abril, o debate foi aberto e os partidos têm apresentado diferentes propostas de resolução sobre o tema. Questionado pelos jornalistas, Manuel Soares esclareceu que tanto o PS como o PSD pretendem perpetuar “a necessidade de haver notificação prévia [do Tribunal Constitucional] para haver um crime”. “Manter a notificação é quase um truque porque o dinheiro que está escondido é desconhecido e, por isso, nunca haverá notificação”, afirmou.
Face à situação atual que estabelece que os titulares de altos cargos públicos têm de entregar a última declaração de rendimentos três anos depois do fim do cargo, “todos os grupos parlamentares à exceção do PS e PSD”, apontou Manuel Soares, “acrescentaram à obrigação declarativa, o dever de apresentar promessas de vantagens económicas”.
Estes factos levam o presidente da ASJP a considerar que os dois maiores partidos com assento parlamentar estão a revelar um “comportamento problemático de risco evidente”. Em abril, a ASJP solicitou à Assembleia da República algumas alterações à LOD, nomeadamente a introdução da descrição de promessas de vantagens patrimoniais futuras que possam alterar os valores declarados, num montante superior a 50 salários mínimos mensais recebidas entre a data de início do exercício das funções e os três anos após o seu termo.
Foi também proposto que, nas declarações, conste a indicação dos factos geradores das alterações que deram origem ao aumento dos rendimentos ou do ativo patrimonial, à redução do passivo ou à promessa de vantagens patrimoniais futuras. Os juízes defenderam ainda um agravamento das penas para o incumprimento, de um a cinco anos de prisão, moldura penal igual à dos crimes de falsificação de documentos por funcionários no exercício de funções.
Na lei atual o titular pode declarar um aumento patrimonial superior a 50 salários mínimos mensais – por exemplo, a aquisição da propriedade de um bem ou a liquidação de um empréstimo bancário – sem ter de explicar a sua proveniência o que não assegura a fiscalização da aquisição de riqueza no exercício de funções públicas. A LOD também não obriga os sujeitos a declararem vantagens patrimoniais futuras cuja promessa de aquisição ocorra no período do exercício do cargo.