Portugal deve decidir o que quer fazer dentro da NATO, mas deve manter a sua diplomacia de aproximação estratégica à Aliança, concluíram três analistas num debate organizado esta quinta-feira, pelo Instituto de Defesa Nacional (IDN).

Portugal deve estar de corpo inteiro na NATO. Mas temos de definir a nossa geografia de interesses dentro da Aliança”, defendeu Nuno Lemos Pires, sub-diretor-geral de Política de Defesa e professor da Academia Militar, um dos intervenientes no debate ‘online’ sobre “Portugal e a Cimeira da NATO”, organizado esta quinta-feira pelo IDN, a que a Lusa assistiu.

Lemos Pires lembrou a centralidade atlântica de Portugal, para salientar a importância estratégica da Aliança para os interesses nacionais, tirando proveito do posicionamento geográfico do país e do seu largo espaço aéreo e naval.

Miguel Monjardino, colunista e especialista em política de Defesa, considerou que, para Portugal, a NATO é, antes de tudo o mais “uma questão política”.

Nas intervenções ao longo do debate ‘online’, Monjardino argumentou que, se a NATO foi importante para Portugal durante a Guerra Fria, muito mais importante se torna agora, em termos estratégicos, no momento em que “tudo está a mudar e vai mudar ainda mais”.

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“Mas o papel de Portugal dentro da NATO começa dentro de casa”, acrescentou o colunista, dizendo que é preciso que o país “melhore a sua base económica”, dando especial atenção ao seu sistema educativo, para ganhar relevo e ser uma voz relevante dentro da Aliança.

Na mesma linha de pensamento esteve Patrícia Daehnhardt, assessora do IDN, que tal como o seu homólogo Carlos Gaspar, que moderou o debate, salientou o facto de “Portugal ter sido sempre um aliado fiável”.

Daehnhardt defendeu que Portugal deve manter a mesma aposta na diplomacia de proximidade aos seus aliados da Aliança Atlântica, mas sem esquecer a importância de articular essa diplomacia com os interesses da União Europeia (UE), a que também pertence.

A relação entre a UE e a NATO foi, de resto, abordada por várias vezes, pelos três intervenientes na discussão, todos eles relevando a questão da articulação entre os interesses das duas organizações, especialmente pelo facto de haver 21 países que são, simultaneamente, membros das duas entidades.

Por isso mesmo, lembrou Miguel Monjardino, é importante que a Alemanha (país considerado vital para a afirmação da NATO e da UE) defina a sua agenda de política externa, nomeadamente esclarecendo o seu posicionamento perante a Rússia e perante a China.

Como argumentou Patrícia Daehnhardt, a Alemanha não pode querer “o melhor de dois mundos”, referindo-se à forma como Berlim beneficia do “guarda-chuva nuclear” dos EUA e beneficia das boas relações comerciais com a China.

No dia em que a chanceler alemã, Angela Merkel, visita a Casa Branca do Presidente norte-americano, Joe Biden, os três intervenientes trataram o papel da Alemanha no futuro da Aliança Atlântica, realçando a necessidade de este país ajudar a encontrar rumos para a conjugação de esforços entre a os EUA e a UE no reforço da posição da NATO.

No debate cujo pretexto foi a recente cimeira da NATO, durante a visita de Joe Biden à Europa, em junho, os analistas discutiram os mecanismos de articulação entre as várias organizações internacionais para que a Aliança se reinvente, a pensar no Novo Conceito Estratégico da NATO, que definirá a sua evolução até 2030. “A Aliança não é messiânica. Ela é pragmática”, insistiu Lemos Pires, para quem a NATO tem revelado “objetivos concretos”, não precisando já de provar a sua eficácia.

A questão está em saber de que forma deve evoluir, num mundo em profundas transformações, mantendo a sua “postura de dissuasão”, elemento crucial para a sobrevivência da organização. Esse novo futuro da NATO deve passar, por isso, consensualizaram os três intervenientes, por uma aposta na vanguarda tecnológica, não ficando para trás em áreas fundamentais de inovação e desenvolvimento, como a Inteligência Artificial ou a Nanotecnologia.

Contudo, recordou Miguel Monjardino, não será fácil um consenso sobre o investimento militar dentro da Aliança, como não são pacíficas, acrescentou Patrícia Daehnhardt, as posições acerca da ameaça que constitui a China, para os aliados.

“Não foi por acaso que, durante a cimeira da NATO, se mencionou muito mais a Rússia do que a China”, disse a investigadora do IDN, interpretando isso como o resultado de ser consensual a ameaça que constitui Moscovo, mas sendo muito pouco ou nada consensual como a organização se deve comportar perante Pequim.

No final os três palestrantes concluíram que é importante que a NATO se reinvente, à luz das transformações globais em curso, nas suas várias dimensões, que não se podem limitar à dimensão política e militar, mas também albergar a económica, cultural, etc.

“O que acho interessante é que, no meu tempo, quem queria questionar o futuro da NATO eram quem a queria destruir. Quinta-feira, quem questiona o futuro da NATO é quem a quer proteger”, ironizou Carlos Gaspar.