O fruto proibido – uma história cultural da vulva

Bertrand Editora, julho de 2021. 15,50 euros

A forma como a novela gráfica está construída deixa a descoberto os sentimentos da autora sobre o tema: Liv Strömquist consegue ser divertida, irónica, sempre honesta, e ficar zangada (muito zangada). As sequências por ela criadas — sobre os homens que se interessam demasiado pelos órgãos sexuais femininos, sobre as falácias em torno do orgasmo e até sobre o período — reúnem informações curiosas, como o impacto que John Harvey Kellog (o mesmo que inventou os corn flakes) teve na sexualidade feminina, ele que chegou a defender a “aplicação de ácido fénico puro no clitóris das mulheres” como método de “mitigar o excesso de excitação”, isto é, de maneira a impedi-las de se masturbarem.

A forma como a vulva, a vagina ou o clitóris têm sido representados pela sociedade ao longo das décadas ajudou a moldar a saúde das mulheres, defende Strömquist, mas também os direitos e liberdades inerentes à própria sexualidade. A autora, que é também ativista e podcaster, além de uma das mais respeitadas cartunistas da Suécia, deixa a descoberto teorias e diagnósticos masculinos e os seus impactos sobre o corpo da mulher, recorrendo a personagens da história mais e menos recente. O tom satírico com que apresenta factos e as respetivas fontes é omnipresente no livro que chegou ao mercado português em julho.

A novela gráfica — pontualmente a cores, mas com desenhos maioritariamente a preto e branco — é usada para colocar perguntas e despertar respostas no leitor. Exemplos disso são as seguintes interrogações: porque é que a anatomia ginecológica feminina é um assunto tabu na sociedade (ao ponto de, na cápsula Pioneer que a NASA lançou no espaço em 1972, a imagem da mulher nua não ter os órgãos genitais representados, ao contrário do que acontece na figura do homem) ou porque é que a menstruação continua a ser estigmatizada na sociedade (de uma forma bastante mordaz, Liv Strömquist reflete sobre como os anúncios de tampões e pensos higiénicos enfatizam continuamente a necessidade de uma mulher se sentir “fresca e segura”). A derradeira pergunta que a autora parece querer fazer é, no entanto, esta: afinal, qual o motivo para a sexualidade feminina ser tão politizada?

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Clube do Prazer

Nascente, julho de 2021. 17,69 euros

“Copulei dia e noite para encontrar as melhores técnicas de uso de dedos, de sucção e afins”, começa por escrever a autora Jüne Plã, ilustradora e designer francesa, sobre aquele que é um manual de educação sexual dirigido a todos. O fenómeno de vendas em França chegou a Portugal no último mês com a promessa de orientar o leitor por técnicas de prazer — para si e para os outros — através de desenhos explícitos, mas sempre elegantes, dedicados a explorar a anatomia feminina e masculina, incluindo uma espécie de cartografia das múltiplas zonas erógenas, além de fornecer um inventário de movimentos orgásticos.

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Escrito de forma leve e divertida, e sem qualquer pudor, a autora — que em 2018 criou a conta de Instagram Jouissance Club, um espaço onde se fala abertamente sobre a sexualidade e que já conta com mais de 800 mil seguidores — fala de tudo um pouco, como se o leitor estivesse numa aula de educação sexual com direito a slides divertidos que ilustram praticamente todos os tópicos. A predominância da penetração, a cadência “aborrecida” e convencional das relações sexuais, o consentimento, o clitóris, o orgasmo e a masturbação são alguns exemplos dos temas que ocupam o livro, onde o humor sarcástico vai muito além dos preliminares. “A sexualidade é um assunto de que não se fala. No entanto, as palavras andam por aí, em todo o lado, nos jornais, na televisão, nos jantares entre amigos/as, mas, muitas vezes, são palavras que mascaram, ocultam e silenciam discursos complexos e singulares”, escreve também.

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Foder?

Pergaminho, outubro de 2020. 14,39 euros

O paradoxo presente atualmente, de que a sexualidade é algo privado e digno de ocultação ao mesmo tempo que se fazem canções e piadas sobre ela, abre este livro, que rapidamente incide — uma vez mais — na obsessão com os genitais, a qual “dessexualiza o resto do corpo”. “Acabamos por acreditar que a única fonte de prazer sexual são os genitais, precisamente porque o prazer sexual é privado, e tudo o mais pode ser mostrado e tocado, publicamente sem sanções”, escreve Bel Olid, que também é tradutora e professora na Universitat Autònoma de Barcelona.

A premissa do livro é descomplicar o sexo (ou, como prefere a autora, as sexualidades), deitar por terra tabus e preconceitos, convidando o leitor a desaprender tudo o que pensa que sabe para ouvir o próprio corpo e os próprios desejos. Porque, defende Olid, facilmente aceitamos estereótipos como realidades indiscutíveis e o que é cultural eventualmente torna-se normal, sem ser questionado. Identidade de género, orientação sexual, pornografia ou consentimento são temas abordados num livro que pretende calar as vozes que condicionam sexualmente, mesmo que as dos pais, dos amigos, da televisão ou das redes sociais, só para dar alguns exemplos. As ilustrações, ao contrário dos dois livros acima referidos, são mais pontuais, sempre a preto e branco, mas cumprem o seu propósito.

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