A EDP Produção, dona das barragens da elétrica nacional, travou uma batalha judicial para suspender a obrigação de pagar uma multa de 48 milhões de euros aplicada pela Autoridade da Concorrência, enquanto a ação de impugnação que contesta a condenação não fosse julgada. O processo chegou ao Tribunal Constitucional, que indeferiu o recurso da elétrica. A empresa liderada por Miguel Stilwell de Andrade aguarda agora a indicação sobre se tem mesmo de pagar já a coima decidida em 2019 ou se a pode substituir por caução ou fiança. O julgamento do recurso da condenação propriamente dita deverá avançar este ano.

A multa foi aplicada em 2019 quando a Autoridade da Concorrência condenou a elétrica por abuso de posição dominante na produção de energia elétrica, na sequência de uma auditoria a ganhos vistos como excessivos no mercado de serviços de sistema. Na altura, a Autoridade da Concorrência considerou que os consumidores de eletricidade terão sido prejudicados em 140 milhões de euros.

EDP condenada a multa de 48 milhões por abuso de posição dominante na produção de energia

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Um mês depois, a elétrica ainda liderada por António Mexia apresentou recurso da decisão da Autoridade da Concorrência para o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão. O recurso foi aceite, mas o Tribunal de Santarém considerou que teria um efeito “meramente devolutivo”. Ou seja, a empresa seria reembolsada da multa se ganhasse a ação de impugnação. Foi por isso determinado que a EDP devia pagar a coima aplicada — uma das mais pesadas das até então decididas pela Autoridade da Concorrência — no prazo de 20 dias. Mas a EDP Produção fez tudo para procurar suspender este pagamento,

Segundo o relatório e contas semestral, a empresa foi até ao Tribunal Constitucional para tentar evitar o pagamento da multa. Em maio do ano passado, a EDP recorreu ao Tribunal da Relação, tendo invocado factos supervenientes para demonstrar o “prejuízo considerável associado a um putativo pagamento da coima, e arguiu vícios da decisão que determinou a atribuição de efeito meramente devolutivo ao recurso de impugnação judicial”.

A ordem de pagamento antecipado da coima foi suspensa em julho do ano passado pelo Tribunal da Concorrência. Mas em novembro a EDP Produção foi notificada do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que deu razão ao recurso apresentado pelo Ministério Público e que revogou o despacho anterior que tinha suspendido o pagamento da coima. A elétrica voltou a recorrer, desta vez para o Tribunal Constitucional, em novembro do ano passado. Neste recurso questionou a constitucionalidade da interpretação feita pela Relação da norma que define o regime aplicável à decisão que determinou o efeito do recurso de impugnações judiciais das decisões condenatórias da Autoridade da Concorrência.

Mas, já em fevereiro deste ano, a EDP Produção foi notificada de que o recurso foi indeferido. Agora, e segundo a descrição feitas no relatório do primeiro semestre, a empresa aguarda que o Tribunal da Concorrência se pronuncie sobre a necessidade de pagar já a coima ou a possibilidade de prestar uma caução ou garantia para o valor em causa. A EDP acrescenta que o julgamento da impugnação da condenação da Concorrência deverá arrancar este ano, estando agendadas para setembro as audições da primeiras testemunhas. Fonte oficial da empresa acrescenta ao Observador que não houve entretanto desenvolvimentos sobre este processo.

A empresa conclui ainda, a propósito desta condenação, “que a EDP Produção não praticou qualquer abuso de posição dominante, tendo atuado estritamente de acordo com o enquadramento legal em vigor”.

Os factos investigados e sancionados pela Autoridade da Concorrência na sequência de uma auditoria encomendada pelo Governo de Passos Coelho tiveram também desenvolvimentos no campo administrativo e regulatório. Por despacho do ex-secretário da Energia, Jorge Seguro Sanches, a EDP foi notificada em 2017 para devolver 73 milhões de euros da compensação atribuída ao abrigo dos custos de manutenção do equilíbrio contratual, fundamentada na sobrecompensação que as barragens receberam até 2013. Esta dedução só foi executada pelo Governo no ano passado e depois de o atual secretário de Estado João Galamba ter recebido um parecer do conselho consultivo da Procuradoria-Geral da República. O despacho que materializa esta devolução foi objeto de impugnação administrativa já este ano.

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Os alegados ganhos excessivos das centrais não são o único caso que opõe a elétrica à Autoridade da Concorrência. O grupo EDP foi condenado em 2017 a coimas de 28,7 milhões de euros no quadro de um processo que envolveu também a Sonae e por causa de uma campanha comercial para captar clientes no mercado liberalizado da eletricidade. Esta condenação também foi impugnada, tendo as empresas entregue uma caução relativa a metade das coimas até à decisão do Tribunal da Concorrência que confirmou a condenação em 2020, mas reduzindo as coimas aplicadas em 10%.

Em novo recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, o processo foi suspenso e enviado para o Tribunal de Justiça da União Europeia já este ano.