O trânsito está caótico no Porto por estes dias. São longos minutos para distâncias curtas e carros que não avançam nas mais importantes vias da cidade. Perante tanto tempo passado no carro, e se há uns anos muito do pulso da população se media dentro de um táxi, o Observador adaptou esse barómetro aos condutores de Uber. Durante as duas semanas de campanha eleitoral as deslocações dos jornalistas no Porto foram feitas de através de Uber, o que permitiu perceber como se vivia as autárquicas naquele pequeno universo, fora das campanhas eleitorais, longe dos candidatos, das bandeiras e dos slogans.
O Uberómetro do Observador (conseguido com testemunoas anónimas e dos quais vamos usar apenas o primeiro nome) é quase unânime: Rui Moreira é o melhor entre os candidatos que estão na corrida, o caso Selminho deixa alguns condutores de pé atrás e o crescimento do turismo é a grande crítica apontada ao atual presidente de câmara e recandidato ao cargo.
A pergunta repetiu-se ao longo de vários dias e de várias viagens: “Então, como o que acha das eleições autárquicas aqui no Porto?”
Vasco foi um dos que respondeu com mais certezas: “Rui Moreira é excelente, desenvolveu o Porto de uma forma que ninguém tinha conseguido fazer”, começa por apontar, ao dizer que é “apolítico” por não gostar da “guerra de partidos”. Aliás, o motorista acredita que o atual presidente da câmara do Porto só conseguiu mudar o Porto “por não estar agarrado a partidos”.
A mesma ideia transmite Fortunato, que “não confia em políticos”. Mas a ideia sobre o atual presidente da câmara do Porto é outra: “Não gosto muito do Moreira porque a cidade deves ser para portugueses e não para estrangeiros.”
A cidade do Porto cresceu exponencialmente em termos turísticos, o comércio adaptou-se aos estrangeiros, o alojamento local começou a surgir em muitas zonas históricas da cidade e muitos portuenses sentem que estão a ser expulsos do centro. Aliás, esse é um dos grandes temas da campanha, tendo em conta que os vários candidatos à autarquia têm visões muito diferentes sobre o turismo na cidade.
Ao volante de um carro mais de nove horas por dia, Fortunato sente que “não há portugueses no Porto”, apenas “hotéis e hostéis”, até porque, questiona, “como é que se pode morar no Porto com salários de 600 e tal euros e apartamentos T1 a 600 e 700 euros?”
A pergunta fica no ar e na viagem seguinte, Pedro encontra outros problemas no Porto, nomeadamente pelo facto de ser uma “cidade envelhecida”, em que “há pessoas que vivem miseravelmente”. “Se lhes derem um pão, votam nele”, atira, referindo-se ao candidato-presidente. Ao Observador, confessa que teve de sair do Porto por necessidade, foi morar para Vila Nova de Gaia porque não suportava o preço da vida na cidade Invicta e desde aí está de costas voltadas com a política. Não entende o porquê de “quem chega a ter mais privilégios do que quem ali nasceu”.
Mas mais do que uma análise ao estado da cidade, os motoristas com que nos cruzámos acreditam que Moreira vence também pela falta de adversários à altura. “Vladimiro é fraquinho, não tem hipóteses. O do PS é um miúdo e tem discurso de papagaio”, enumera outro Pedro, que vai ao encontro da opinião de João, ao considerar que “não existem candidatos à altura” nesta corrida autárquica em que o recandidato acaba por ser a “única opção válida”.
No carro de Fábio terá andando Vladimiro Feliz. “Conheci-o pelos óculos através do espelho”, conta, sem ter confirmação se era ou não o candidato social-democrata no banco de trás. Mas não perguntou e Feliz também não esteve para grandes conversas: estava mais “preocupado com o trânsito no Porto” do que em falar de política. O motorista não tem uma boa relação com os políticos, sente que “só querem o poder” e que “trilham o caminho por interesses”.
Porém, o motorista que transportou Vladimiro Feliz realça que “Rui Moreira tem feito muito pelo Porto” e que “nem queria votar”, mas vai só mesmo para garantir que “o Chega não ganhar força”. O cliente que por ali passou não é uma opção para o próximo domingo porque “não apresenta nada de novo para a cidade” e, por isso, “não vale a pena mexer quando está a correr bem ou quando não está a correr mal”.
Se a falta de candidatos é um problema no momento de colocar uma cruz no boletim de voto, há outro tema que muitos dos motoristas com quem falámos não esquecem: o caso Selminho. António “nunca votaria em Moreira” por estar a braços com a justiça. “Acho que usou a posição para o negócio”, refere em conversa com o Observador. Apesar de “não querer votar em alguém que está envolvido na justiça”, António confessa também não encontra uma “alternativa clara”. É um dos indecisos a poucos dias das eleições.
E nem sequer é o único no leque de motoristas com quem nos deslocámos no Porto. Pedro pensa o mesmo, prefere um voto nulo do que um voto em Moreira quando o recandidato tem um processo a decorrer na justiça. “É por isso que não gosto de políticos, não se pode confiar”, atira, enquanto se queixa do trânsito e do tempo chuvoso.
Os resultados são conhecidos no próximo domingo, ao Porto candidatam-se 11 pessoas, mas nem uma palavra para a grande maioria dos candidatos. A grande maioria dos motoristas não conhecia ninguém além de Rui Moreira, Tiago Barbosa Ribeiro e Vladimiro Feliz. Exceção para duas referências passageiras a António Fonseca e Ilda Figueiredo.