Era mais do que um jogo da Liga dos Campeões. Era mais do que um jogo daqueles que valem uma fortuna de 2,7 milhões de euros só pela vitória. Era mais do que um jogo seguido por milhões na principal prova de clubes da Europa. Esta noite, em Dortmund, era um jogo pelo orgulho. Dos jogadores e de um clube.

Sporting perde em Dortmund pela margem mínima e mantém último lugar do grupo na Champions

“Obviamente que não falámos muito a seguir ao Ajax porque tínhamos um jogo do Campeonato mas depois conversámos. Relembrámos o momento do 3-2 [o golo anulado a Paulinho pelo VAR], um bocadinho do corpo muda o jogo, sofrer um golo na primeira jogada do encontro muda a estratégia de uma equipa… Não dissemos apenas que temos melhorar isto e aquilo mas também que o futebol tem coisas que não acontecem sempre. É preciso estar concentrado mesmo quando a bola está no guarda-redes. Mostrámos muitas coisas aos jogadores”, explicara Rúben Amorim na análise antes da partida na Alemanha.

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Não tem sido normal este tipo de conversa do treinador com os jogadores depois de um momento mais um adverso. Por exemplo, e em relação ao Estoril, a estratégia passou por perceber o que tinha falhado no 1-1 em Famalicão e relativizar a goleada sofrida em Alvalade com o Ajax. Daí que este fosse mais do que um jogo. Houve mais pontos que condicionaram essa partida como a ausência de Coates, a lesão de Gonçalo Inácio ou o amarelo de Palhinha ainda na primeira parte. No entanto, aquilo que ficou também foi o guia de como desmontar em termos defensivos este Sporting, fosse pelo espaço central/lateral mais pelo lado esquerdo, fosse pela vantagem numérica que fazia diferença nas transições pelo corredor central.

Os leões voltaram à Champions quatro anos depois pela vitória do Campeonato mas os próprios números mostravam que esta não é uma competição feita pelos leões. Pelas presenças, pelos resultados. Até hoje, e em 49 jogos, o Sporting conseguira apenas 14 vitórias, oito empates e 29 derrotas. Na Alemanha, o registo era ainda mais negativo: 13 partidas, 12 desaires, apenas um empate sem golos em 2006 quando a equipa de Paulo Bento foi a Munique travar o Bayern e assustar ainda mais na parte final com um remate à trave de João Moutinho. Aí, o segredo foi ser fiel às ideias de jogo da equipa. Amorim seguiu o mesmo.

“A vontade de ganhar é igual. O resultado com o Ajax foi muito mau mas não temos outros para comparar contrariamente a outras equipas. Eles não têm de ter receio de nada, queremos outras sensações desta competição. Agora já temos mais noção da qualidade da Champions e vamos fazer por merecer um resultado diferente. Juventude? Tem os dois lados. A juventude traz irreverência mas eles já têm mais um jogo, com Ajax. O B. Dortmund é um adversário difícil, defrontamo-los após uma derrota tão pesada numa estreia, mas o foco é como melhorar a nossa equipa, sem olhar tanto a essas diferenças de experiência. Vamos a jogo, com as nossas ideias. O foco é o que podemos melhorar em relação ao último jogo”, frisou.

Foi dentro desta base que Rúben Amorim preparou uma equipa verde e branca que voltaria a não contar com Gonçalo Inácio e Pedro Gonçalves, uma baixa de peso que se tem feito sentir na produção ofensiva do Sporting – além de rematar menos, marca em média metade dos golos olhando para os dados da presente temporada. Lançou Matheus Reis no lugar de Vinagre, trocou Nuno Santos por Tiago Tomás, fez regressar Coates ao centro da defesa. A equipa melhorou mesmo sem profundidade e perdeu com um B. Dortmund que sem Haaland perde muito em termos ofensivos. Sempre em 3x4x3, sempre mantendo a mesma ideia e filosofia, sempre assente no que foi feito ao longo do último ano e meio. Se é verdade que Rúben Amorim não perdeu pelas ideias, perdeu com as ideias. E essa é a sua maior vitória.

O encontro começou acidentado para o lado dos germânicos e a evitar possíveis acidentes por parte da equipa leonina: já depois da saída de Dahoud por lesão num lance em que torceu o joelho no impacto da bola com Tiago Tomás (demorando depois mais de quatro minutos para ser substituído porque o jogo não parava), o Sporting teve a primeira grande aproximação de perigo depois de uma arrancada fortíssima de Matheus Nunes pelo meio antes de Paulinho chegar ligeiramente atraso ao cruzamento de Porro (5′) e, não tendo bola de forma assumida mas explorando as possibilidades de saída em transição, foi controlando a partida com a racionalidade pedida para evitar aquele início que foi um dos problemas com o Ajax.

O B. Dortmund sentia dois problemas no seu jogo: 1) tinha uma circulação de bola demasiado lenta para poder depois encontrar os espaços que permitissem desequilibrar no último terço; 2) encontrava os seus avançados quase sempre em fora de jogo quando tentava explorar a profundidade. Assim, numa e noutra baliza, o perigo acabou por chegar por culpa própria, primeiro num lance em que Sarabia atrasou mal, Coates fez uma rosca e Reus rematou na área à figura de Adán que também só agarrou à segunda (19′), e depois em dois lances em que Paulinho ganhou a Hummels perto da área mas atirou muito por cima (22′). Quando a pressão leonina era bem feita logo na área contrária, os germânicos também tremiam.

Tudo apontava para que o nulo chegasse de forma quase natural ao intervalo, até porque não foram muitas as ocasiões em que  Sporting errou em termos individuais ou coletivos na organização defensiva. Todavia, bastou um momento mal calculado para o B. Dortmund chegar logo ao golo: saída a partir de trás sem pressão sobre Akanji, grande passe a encontrar Bellingham no espaço entre linhas nas costas dos médios que tinham subido um pouco mais, assistência de primeira para Malen e remate cruzado para o 1-0 com que se atingiria o intervalo sem que o conjunto português esboçasse uma reação à desvantagem (37′).

A partida recomeçou sem alterações nos nomes mas com mudanças nas dinâmicas, tendo um Sporting a tentar defender mais alto na zona de pressão inicial e a jogar com bola no meio-campo contrário e um B. Dortmund com processos acelerados e a explorar de outra forma a profundidade. Foi assim que Marco Reus, lançado nas costas de Feddal, conseguiu entrar na área e marcar antes de ver o golo invalidado por fora de jogo (48′). Foi assim que Paulinho, num cruzamento mais bombeado após uma insistência no lado esquerdo, cabeceou com pouca força para defesa de Kobel (55′). O jogo tinha mudado de feição.

O Sporting tinha entrado naquela fase em que teria de jogar algo para fugir à derrota, aproveitando todos os metros que foi ganhando com bola para tentar chegar ao último terço e reforçando a velocidade na frente com Nuno Santos e Jovane Cabral nas alas. No entanto, e quando chegou esse momento decisivo, faltou muita coisa à equipa. Matheus Nunes ainda teve uma fantástica saída pelo corredor central apenas travada em falta por Hummels mas faltou depois capacidade de transição, disponibilidade física e discernimento nos minutos finais para criar situações de finalização. Se a defesa esteve literalmente à altura até na forma como foi colocando sempre os atacantes contrário em posição irregular, o ataque foi sempre curto. E o 1-0 manteve-se até ao final de um jogo que espantou fantasmas mas não escondeu problemas.