Afirmar que a primeira mulher a ocupar a liderança de um governo no mundo árabe tem pouca experiência em momentos de crise pode ser redutor. Afinal, a nova primeira-ministra tunisina está habituada a explorar ao detalhe alguns dos eventos mais destruidores e tenebrosos que um país pode vivenciar e é a eles que se tem dedicado desde que se formou na Escola Nacional de Engenharia de Túnis: os sismos. Foi precisamente nessa área que se formou na Escola Nacional Superior de Minas de Paris, onde se especializou em geociências.

Najla Bouden Romdhane, apresentada esta quarta-feira para o cargo governativo pelo Presidente tunisino Kaïs Saïed, é geóloga de formação e especializou-se em avaliar riscos sísmicos — tanto que surge como primeira autora em dezenas de estudos científicos, nomeadamente num redigido ao abrigo do Programa Ciência da Paz e Segurança da NATO, em que calculou o risco sísmico na agitada capital da Tunísia, assente numa cama de sendimentos que cobre uma rocha com 34 milhões a 56 milhões de anos.

Najla Bouden Romdhane sabe muito sobre geologia, mas é pouco experiente em matéria governativa. Mas não totalmente: em 2011, há precisamente dez anos e no ano da  Revolução de Jasmim, era ela a diretora-geral de qualidade no Ministério do Ensino Superior da Tunísia, cargo que abandonou quatro anos mais tarde para se tornar gestora de projeto de Slim Choura, o detentor daquela pasta nessa altura. Desde 2016 até agora, foi uma das coordenadoras do projeto para a reforma do ensino superior e investigação científica.

Presidente da Tunísia nomeia pela primeira vez uma mulher para chefiar o governo

Nascida em Cairuão, a “cidade das 50 mesquitas”, em 1958, sem qualquer cor política reconhecida publicamente, Najla Bouden Romdhane foi a escolhida por Kaïs Saïed para formar um novo governo o mais depressa possível. O antigo governo tinha sido destituído e o Parlamento dissolvido pelo Presidente tunisino, eleito em 2019, já este verão, num gesto que foi classificado de “golpe” pelos seus opositores. Na semana passada, suspendeu a maior parte da Constituição e anunciou que governaria por decreto durante um período “excecional” sem tempo limitado.

Agora, num vídeo que apresenta Najla Bouden Romdhane como primeira-ministra, Kaïs Saïed sugeriu que o gesto era representativo do seu respeito pelas mulheres e afirmou que a geóloga iria formar governo muito em breve porque “já perdemos muito tempo”. Mas Najla Bouden Romdhane terá menos poder decisivo do que os governos anteriores à conta da profundas alterações do Presidente às leis de 2014.

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