No início de julho, em vésperas de uma audição parlamentar com o diretor do Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA), a secretária de Estado do Património Cultural transmitia à agência Lusa que “ainda durante o mês de julho” iriam começar “intervenções urgentes relativas ao sistema de ar condicionado e aos problemas elétricos e das coberturas” do museu, num total de 300 mil euros.

Os obras não aconteceram em julho e mais de três depois a empreitada permanece incompleta. Até à semana passada, não eram visíveis andaimes, operários ou quaisquer sinais de obras no interior e no exterior do museu situado na Rua das Janelas Verdes, em Lisboa. Porém a substituição do sistema de ar condicionado começou em setembro, segundo o diretor, Joaquim Oliveira Caetano, enquanto o arranjo de parte do telhado só nesta segunda-feira teve início. O mesmo responsável não soube precisar quando começaram as obras também previstas nas portas corta-fogo e nos equipamentos de videovigilância, por não ter autonomia administrativa para acompanhar obras, mas garantiu que estão em curso.

A Direção-Geral do Património Cultural (DGPC) — tutelada pelo Ministério da Cultura e responsável pela gestão dos museus, monumentos e palácios do Estado — tinha transmitido na sexta-feira ao Observador que “todas as ações pendentes e que foram consideradas essenciais no MNAA foram já adjudicadas e estão atualmente em fase de concretização”. Acrescentou que “os prazos de conclusão são variáveis, mas no que se refere especificamente à intervenção nas coberturas a previsão é que termine até ao final do corrente ano”. Apesar de questionada, não explicou o porquê dos atrasos.

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Reuniões com a DGPC sinalizam arranque de obras

As dúvidas do Observador sobre o ponto de situação das obras anunciadas em julho pela secretária de Estado do Património, Ângela Ferreira, foram apresentadas por escrito a 20 de setembro ao diretor do MNAA. Oito dias depois, o gabinete de imprensa do museu respondeu que deveria ser a DGPC a pronunciar-se sobre o assunto. Nove dias depois, ou seja, na última sexta-feira, dia 8, a DGPC deu resposta às perguntas — em vésperas do início da intervenção na cobertura do museu. O Ministério da Cultura estava ao corrente das perguntas do Observador.

Já esta segunda-feira, Joaquim Oliveira Caetano esclareceu por telefone que a direção do MNAA “só sabe que uma obra começou ou está prestes a começar quando as entidades escolhidas pela DGPC marcam reuniões para vistorias antes dos cadernos de encargos”. De resto, as decisões passam apenas pela DGPC, através da Divisão de Execução de Obras e Fiscalização.

Apesar de uma lei de 2019 dar autonomia de gestão aos museus, monumentos e palácios públicos e os tornar “unidades orgânicas dotadas de um órgão próprio de gestão, o diretor”, a regulamentação do diploma tem sido lenta e as instituições continuam a depender de decisões da DGPC, à qual neste caso compete lançar concursos, adjudicar e acompanhar obras.

MNAA tem mais de 50 mil peças, das quais são expostas cerca de 8%

300 mil euros “essenciais para estancar a degradação em área vitais do museu”

A audição parlamentar do diretor do MNAA, Joaquim Oliveira Caetano, realizou-se a 7 de julho e tinha sido convocada pelo Bloco de Esquerda para debater a “situação de colapso no funcionamento” do museu. Dias antes o Ministério da Cultura afastara o diretor-geral da DGPC, Bernardo Alabaça, por alegada inoperância e incapacidade, tendo este sido ouvido também a 7 de julho na mesma Comissão de Cultura da Assembleia da República. O atual diretor-geral interino é João Carlos Santos. Continuam “em avaliação” os concursos da Cresap (Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública) para diretor-geral e subdiretores-gerais da DGPC, concursos esses que terminaram a 17 de junho.

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Joaquim Oliveira Cateano — que assumiu a direção do MNAA em junho de 2019, depois da saída voluntária e das críticas à tutela dos então diretores António Filipe Pimentel e José Alberto Seabra Carvalho — disse a 7 de julho no Parlamento que as obras de 300 mil euros eram “essenciais para estancar a degradação em áreas vitais do museu”. Explicou que os equipamentos do museu são os mesmos que entraram ao serviço nas remodelações de 1983 e 1994, revelando-se hoje “muitíssimo envelhecidos” e “num estado de não funcionamento” na maior parte dos casos.

“É absolutamente dramático num museu que tem este espólio. As madeiras estalam, cedem à humidade, temperatura, à secagem rápida”, exemplificou. A “falta gritante” de vigilantes e outros problemas “crónicos” de recursos humanos foram também sublinhados pelo diretor.

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PRR vai ser “a resposta estruturada e estrutural que há décadas é exigida” pelo museu

As obras atuais de 300 mil euros são um extra face às verbas europeias do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), do qual vão sair 150 milhões de euros só para a área do património, de acordo com o Ministério da Cultura. A divulgação pública dos locais e projetos só deverá ser feita depois da aprovação do Orçamento do Estado. “Os procedimentos terão início a partir de 2022 e a conclusão das intervenções está prevista para 2025”, informou a DGPC, responsável pela concretização do PRR na componente relativa às empreitadas no património.

Joaquim Oliveira Caetano espera que o PRR contemple, entre outros aspetos, a remodelação da área das reservas do MNAA, a renovação de vitrines do museu e ainda a substituição de cerca de dois terços do telhado, que ainda contêm materiais com amianto e que não estão incluídos na intervenção iniciada nesta segunda-feira.

Segundo a DGPC , as obras atuais “são resposta a algumas necessidades de intervenção identificadas, mas fundamentalmente o PRR é a resposta estruturada e estrutural que há décadas é exigida para o edifício do MNAA”.

O museu da Rua das Janelas Verdes é considerado o principal museu público do país, tendo à guarda obras de referência do património dos portugueses, como os “Painéis de São Vicente”, a Custódia de Belém ou “As Tentações de Santo Antão”, de Bosch. Foi criado em 1884, como Museu Nacional de Belas-Artes e Arqueologia, e adotou em 1911 a designação atual. Tem o maior número de obras classificadas como “tesouros nacionais”, lê-se no relatório “O Futuro do Primeiro Museu de Portugal“, publicado em outubro de 2015 pelo então diretor, António Filipe Pimentel. O acervo é de mais de 50 mil peças, das quais são expostas cerca de 8%, incluindo pintura, escultura, ourivesaria, cerâmica, mobiliário, têxteis, desenho e gravura.