O músico e compositor norte-americano Bright Sheng viu-se obrigado a abandonar o cargo de professor na Universidade do Michigan, nos Estados Unidos, depois de ter exibido numa das suas aulas o filme clássico Othello, de 1965, onde o ator britânico Laurence Olivier surge com a cara pintada de negro para representar o protagonista, o mouro Otelo da peça de Shakespeare.
A prática, conhecida como blackface, tem estado no centro de algumas controvérsias com figuras de relevo por ser hoje conotada com a perpetuação estereótipos e de um pensamento racista, ao simbolizar a impossibilidade de um ator negro ter acesso aos principais papéis de representação, sendo preterido por um ator branco com o rosto pintado. O primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, por exemplo, recentemente teve de pedir desculpa por ter pintado o rosto de negro para uma festa em 2001.
Bright Sheng, um aclamado pianista e compositor que já viu o seu trabalho interpretado por orquestras de topo, incluindo a Orquestra Filarmónica de Nova Iorque, viu-se envolvido numa polémica dentro da universidade depois de alguns alunos do primeiro ano da escola de música da Universidade do Michigan terem denunciado em público que o músico havia exibido o filme numa das aulas — um seminário dedicado às obras de Shakespeare.
Uma dessas alunas disse ao jornal The Michigan Daily que ficou “abismada” quando viu o filme. “Numa escola que prega a diversidade e se esforça por compreender a história das pessoas de cor na América, fiquei chocada por ele mostrar algo como isto num lugar que é suposto ser seguro”, disse Olivia Cook.
O mesmo jornal recorda que a controvérsia em torno do blackface no filme não é nova: na verdade, já em fevereiro de 1966, pouco depois da estreia, o The New York Times publicou uma crítica dura contra o filme justamente porque já naquela época o recurso a atores brancos pintados de negro era considerado uma ofensa.
Na sequência da polémica, o próprio Sheng fez um pedido de desculpas público, assumindo que foi “insensível relativamente à raça e antiquado” e cancelando os projetos letivos que se preparava para levar a cabo na faculdade.
Dentro da própria instituição, o compositor foi criticado pelo corpo académico. “Mostrar o filme hoje, especialmente sem um enquadramento substancial sobre o conteúdo e centrado no racismo inerente do filme é, em si próprio, um ato racista, independentemente das intenções do professor“, disse Evan Chambers, professor de composição musical na mesma universidade. A academia enviou também o registo do ocorrido para as autoridades públicas responsáveis pelo combate à discriminação — o reitor da faculdade emitiu um pedido de desculpas público, distanciando-se de Sheng.