O Presidente da República promulgou a lei da iniciativa do Governo que permite a intervenção administrativa na fixação das margens da cadeia de formação do preço combustíveis. Mas avisa que a medida é “paliativa” e “insuficiente” para responder a aumentos sucessivos e prolongados dos preços. E apesar de urgente no contexto da escalada dos preços, não enfrenta várias situações, como o nível de impostos elevados nos combustíveis que resultam de escolhas políticas sobre a transição energética.
Marcelo assinala “escolhas políticas” para enfrentar situação que se pode prolongar
Nos comentários à promulgação, Marcelo Rebelo de Sousa começa por assinalar que o decreto-lei aprovado no Parlamento há pouco mais de uma semana adota medidas “indispensáveis e urgentes”, mas também “paliativas, porque visando atenuar sacrifícios e suavizar, parcialmente, os custos sociais do presente preço dos combustíveis”.
O presidente entende que é uma iniciativa indispensável porque os custos com o aumento dos combustíveis “atingem, de forma muito agravada, as famílias e as empresas”. E urgentes, atendendo aos efeitos económicos e sociais imediatos desses sacrifícios. Mas avisa também que “estas medidas paliativas não enfrentam várias outras questões da situação atual”.
- Não reequacionam globalmente os impostos sobre os combustíveis, que há muito existem e são elevados, correspondendo a escolhas políticas, quanto à substituição de energias fosseis pelas novas energias limpas, e, também, quanto à facilidade e eficácia do recurso a esses impostos indiretos no quadro da política fiscal e da despesa pública a cobrir.
- São de curta duração, por natureza, sendo insuficientes para enfrentar aumentos sucessivos e prolongados, por efeitos desta fase da pandemia, que não terminou, por desajustamento entre procura e oferta, por travagem no investimento nas energias renováveis, pela contingência no fornecimento de gás, pela necessidade de posições comuns dentro da União Europeia e com as principais potências energéticas do mundo.
- Finalmente, não podem iludir uma situação que se vive à escala do globo, na realização das metas de substituição de energias e transição energética e um período de tempo mais longo e mais custoso nesta fase de utilização das novas energias.
Apesar das “evidentes limitações”, Marcelo Rebelo de Sousa conclui que estas medidas “são um pequeno passo para mitigar uma situação de emergência económica e social, que mais do que justifica a intervenção do Estado no mercado”.
O diploma do Governo abre a possibilidade legal de, em situações de margens excessivas, limitar as margens praticadas pelas empresas petrolíferas desde o armazenamento e transporte até à distribuição, mas remete para a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos a iniciativa de avaliar se as margens são “excessivas”, não definindo os critérios que permitem fundamentar essa analise. A decisão da ERSE tem de ser validada num parecer da Autoridade da Concorrência que já se mostrou abertamente contra esta iniciativa do Governo.
A ausência de critérios é um dos pontos que é mais contestado pelas petrolíferas que qualificam a legislação de um “cheque em branco” ao Governo para intervir num mercado liberalizado. A associação que representa o setor, a APETRO, tem pareceres jurídicos a apontar para inconstitucionalidades no diploma, mas ainda não tinha decidido se ia avançar com a impugnação nos tribunais da lei.
As empresas do setor argumentam ainda com o facto de as margens brutas de comercialização — que avisam não correspondem a lucros — serem uma pequena parcela do preço final dos combustíveis onde os impostos representam a fatia de leão, como aliás assinala Marcelo Rebelo de Sousa nos seus comentários. No entanto, ainda esta semana, o ministro do Ambiente defendeu a necessidade de o Governo poder intervir nesta componente do preço.
O Governo entretanto baixou o imposto petrolífero em um cêntimo no gasóleo e dois cêntimos na gasolina, a título de devolução dos ganhos obtidos na cobrança do IVA, medida que admite voltar a implementar. O primeiro-ministro anunciou ainda mais medidas para conter a escalada dos combustíveis, nomeadamente de apoio aos transportadores, mas avisou que serão “transitórias”.