Abriu esta segunda-feira, e por duas semanas, o período de consulta pública da proposta de Acordo de Parceria do Portugal 2030, um documento que serve de base ao novo quadro comunitário de 2021 a 2027 e que vai distribuir 23 mil milhões de euros ao país. O Governo já disse que o Acordo final não será assinado com Bruxelas antes das eleições de janeiro para dar alguma margem ao próximo Executivo de fazer alterações, mas o ministro do Planeamento, Nelson de Souza, acredita que “nunca será trabalho perdido”. A intenção do Executivo é agora “deixar o processo tão adiantado quanto possível para que ele não pare” e para que o próximo Governo, se o entender, assine o Acordo logo que tome posse.
Numa apresentação aos jornalistas sobre o Acordo de Parceria Portugal 2030, Nelson de Souza foi questionado sobre se teme que, depois das legislativas de janeiro, um novo Governo altere de tal forma o documento que o trabalho feito até aqui tenha sido “em vão”. Na resposta, o ministro indicou que a equipa do Executivo decidiu “não parar” o processo de construção do PT2030 mesmo apesar do novo “contexto político”, mas que não quer assumir compromissos “definitivos” e “irreversíveis” aos olhos da Comissão Europeia. Os partidos políticos e o conselho de concertação territorial, com quem reuniu, “concordaram unanimemente” que “não valia a pena congelar o processo, mas avançar com ele, naturalmente, sem prejudicar nem condicionar qualquer Governo, seja ele qual for, nas suas tomadas de opção”.
Estamos aqui a fazer o nosso trabalho legitimamente, sem qualquer condicionamento e cumprindo a nossa missão que é governar até que a vontade popular se expresse e determine a composição do novo Governo. Nunca será trabalho perdido porque é um trabalho conduzido pelas nossas estruturas técnicas [a Agência para o Desenvolvimento e Coesão], que em parceria com outros órgãos técnicos desenvolveu este trabalho”, disse Nelson de Souza.
A intenção é agora “deixar o processo tão adiantado quanto possível para que ele não páre, para que o próximo Governo, se assim entender, assine assim que tomar posse”. O ministro mostra, aliás, confiança em relação aos resultados eleitorais. Diz que o Executivo está “plenamente convencido” que os portugueses vão “reforçar a confiança” no partido que suporta o Governo “para que esta maioria possa governar com mais estabilidade e maior segurança”.
Ministro ainda quer ouvir as confederações patronais
Na semana passada, o ministro do Planeamento tinha convocada as confederações patronais para uma reunião de apresentação das linhas orientadoras do PT 2030, mas estas faltaram ao encontro. Ao Observador, João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) justificou a ausência com o facto de considerar que a reunião foi marcada como uma forma de o Executivo “ultrapassar” o impasse na concertação social (à qual os patrões regressam esta terça-feira depois de terem suspendido a participação).
Questionado sobre a ausência das confederações patronais desse encontro, Nelson de Souza desvalorizou. Diz que foi informado que os patrões não estiveram presentes por motivos de “agenda”, mas assegura que não quer criar à volta disso “celeuma” e que “certamente” ainda quer reunir-se com as associações empresariais, seja ou não na concertação social. “A reunião não se realizou, tem de se realizar e vai-se realizar durante o período da consulta pública. Não será no âmbito da consulta pública”, frisou o ministro, embora essa opção também possa ser usada pelas confederações. “Mas além disso conto ter uma reunião, não quero é criar celeuma à volta disto.”
Quanto ao processo de consulta pública, que começou esta segunda-feira, Nelson de Souza adiantou que não tem “ambições menores” face à participação no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que contou com três mil contributos de cerca de 1.700 entidades e particulares. No caso do PRR, a adesão foi “notável”, pela quantidade e qualidade dos contributos, refere. No PT2030, embora espere uma “participação significativa”, também coloca a hipótese de a adesão não acontecer na mesma dimensão. “Não sei se agora vai ser possível repetir-se [a participação no PRR]”, diz, recusando fixar metas.
Por onde quer o Governo distribuir os “ovos”? Seis mil milhões vão para as empresas
Nelson de Souza confirmou ainda que as empresas vão ter direito a seis mil milhões de euros por via do PT2030 — dos quais, uma parte tem como destino a transição climática e a descarbonização. Conjugado com o PRR, o tecido empresarial vai receber cerca de 10 mil milhões de euros.
Segundo informação transmitida pelo ministro aos jornalistas, e que está agora acessível no site do programa, o PT 2030 vai mobilizar quase 23 mil milhões de euros para Portugal, em cinco eixos prioritários definidos a nível europeu:
- “Uma Europa mais inteligente”, que se foca nos apoios às empresas, na promoção da competitividade, na utilização de conhecimento por parte das empresas de forma a que se converta em bens e serviços transacionáveis. Estão em causa 5,3 mil milhões de euros.
- “Uma Europa mais verde”, que inclui compromissos decorrentes do Acordo de Paris, ao focar-se na transição climática, na descarbonização e na mitigação das alterações climáticas. Incorpora também uma “parcela muito significativa de apoios às empresas“, diz Nelson de Souza. Totaliza 5,3 mil milhões de euros.
- “Uma Europa mais conectada”, com objetivos a nível da mobilidade sustentável, na ferrovia. Representa 1,9 mil milhões de euros.
- “Uma Europa mais social”, que inclui medidas para a qualificação dos trabalhadores, o combate às desigualdades e a proteção dos mais vulneráveis. Totaliza 7,8 mil milhões de euros.
- “Uma Europa mais próxima dos cidadãos”, com apoio a estratégias de desenvolvimento local, urbano e sustentável. Inclui 1,5 mil milhões de euros.
Dentro desses objetivos, o Governo vai optar por criar quatro programas temáticos: um destinado ao mar, outro à ação climática e sustentabilidade, um terceiro a inovação e transição digital e outro para a demografia, qualificações e inclusão. São estes dois últimos que mobilizam mais recursos (3,9 mil milhões e 5,6 mil milhões, respetivamente).
No que toca aos programas regionais, a maior parcela vai para o Norte (3,3 mil milhões de euros) e a menor para Lisboa (381 milhões, uma discrepância expectável dado que é a região mais rica do país).
Nelson de Souza afirma que o Governo pretende que sejam postas em prática medidas de simplificação dos processos que ajudem a “diminuir as barreiras” de acesso das empresas aos fundos, com menos entraves à apresentação de candidaturas. O objetivo é “termos um maior número de candidaturas”, para que sejam escolhidas as melhores entre as melhores.
O documento agora apresentado apenas inclui “opções estratégicas”, ressalva o ministro, sublinhando que “ainda não estão definitivamente tomadas todas as decisões e opções”.