Ficou conhecido como o documentarista que morreu com a câmara na mão, em Mariupol – mas a morte de Mantas Kvedaravičius não aconteceu quando o seu carro foi atingido por um míssil, como foi inicialmente noticiado. Segundo a provedora dos Direitos Humanos do parlamento ucraniano, Liudmyla Denisova, o cineasta foi raptado pelas forças russas e foi executado com uma bala no peito e outra na cabeça. E foi atirado à rua o corpo deste documentarista lituano que passou por Portugal em 2011, no DocLisboa.

“Surgiram novas informações relacionadas com as circunstâncias da morte do cineasta lituano Mantas Kvedaravičius, em Mariupol. Ele foi tomado prisioneiro por parte de fascistas russos, que mais tarde o balearam fatalmente. Depois, os invasores atiraram o seu corpo para a rua”, indicou a provedora, citada pelo portal Ukrinform.

Anteriormente, tinha sido indicado que o lituano tinha morrido devido a um projétil que atingiu o carro em que tentava fugir da cidade. Mas essa informação foi difundida para proteger a segurança da mulher, que arriscou a vida para ir a Mariupol – uma cidade que está cercada pelos russos – e tentar resgatar o cadáver do marido para o levar para a Lituânia.

“Mantas era reconhecido como um dos principais cineastas lituanos”

O documentarista ganhou notoriedade internacional sobretudo graças à obra “Barzakh“, que passou no DocLisboa em 2011 — a única passagem de Mantas Kvedaravičius por Portugal. O mesmo documentário recebeu, entre outros, o Prémio de Cinema da Amnistia Internacional no Festival de Berlim.

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Em Portugal, Mantas Kvedaravičius participou na categoria de competição internacional, mas “Barzakh” não ganhou nenhum prémio. Ao Observador, Miguel Ribeiro, diretor do DocLisboa, reconheceu que “o cinema de Mantas não é tão conhecido em Portugal”, apesar de ser “reconhecido com um dos principais cineastas lituanos — dos mais relevantes, dos mais mostrados e dos mais reconhecidos” a nível internacional.

O documentário que passou pelo auditório da Culturgest conta a história de uma cidade chechena que tenta recuperar da guerra. Este foi o seu primeiro filme e o olhar de Mantas Kvedaravičius não estava tão focado na dimensão histórica, mas sim “na dimensão humana, nas histórias de intimidade e nas histórias pessoais que existiam nestes contextos de guerra ou de pós-guerra”, explicou Miguel Ribeiro.

Não tinha tanto a dimensão pedagógica, ou informativa. Era uma dimensão mais intima da vivência da guerra”.

Em 59 minutos, a lente de Mantas Kvedaravičius acompanhou a história daqueles que procuram um homem que desapareceu. E nome “Barzakh” descreve exatamente esse limbo entre vida e morte, numa perspetiva de continuidade além da morte.

[o trailer de “Barzakh”:]

Quando foi noticiada a morte do cineasta, o realizador de cinema russo Vitaly Mansky indicou que Mantas Kvedaravičius tinha morrido “com a câmara nas mãos” enquanto trabalhava para documentar “uma guerra do mal”. Em 2016, o lituano tinha estreado no Festival Internacional de Cinema de Berlim o documentário “Mariupolis”, onde oferecia um retrato da cidade portuária que lutou contra forças apoiadas pela Rússia em 2014.

No filme, o cineasta pretendia capturar “como as pessoas comuns continuam com suas vidas quotidianas a poucos passos de uma zona de guerra, tiros, explosões e morte”, acrescentou Vitaly Mansky.

Além de contar a verdadeira história da morte de Mantas Kvedaravičius, a provedora também homenageou Yevhen Bal, escritor e jornalista de 78 anos que terá sido torturado ao longo de vários dias, depois de ser capturado na própria casa. Os militares russos terão encontrado fotografias do escritor no tempo em que serviu nas fileiras do exército ucraniano e, por isso, o homem foi levado e torturado durante três dias.

Acabou por ser libertado mas morreu poucos dias depois, a seis dias de chegar à idade de 79 anos.