(Artigo em atualização)
O juiz Carlos Alexandre e a funcionária judicial que com ele trabalhava no Tribunal Central de Instrução Criminal não vão a julgamento pelos crimes de abuso de poder, falsificação praticada por funcionário e denegação de justiça, decidiu esta sexta-feira o Tribunal da Relação de Lisboa. Em causa está um processo movido pelo ex-primeiro-ministro, José Sócrates, que os acusa de terem feito um sorteio manual para que o processo da Operação Marquês fosse atribuído a este juiz, violando a lei que prevê a distribuição eletrónica. “A versão não se mostra minimamente fundada na prova produzida”, disse o juiz desembargador Jorge Antunes.
“A resposta é clara: Perante o acervo probatório não é de todo provável que o tribunal em julgamento se convença, além de toda a dúvida razoável, dos factos imputados pelo assistente aos arguidos. Os factos não estão indiciados nos autos. Nada mais se revelou suportado, quer por meios de prova direta, quer indireta”, afirmou o juiz desembargador.
“Em fase de julgamento seria merecedora de igual aceitação. Tudo aponta (…) para a mais que provável absolvição dos arguidos quanto aos crimes imputados pelo assistente”, observou o juiz desembargador, continuando: “Em face do exposto decido não pronunciar os arguidos Carlos Alexandre e Maria Teresa Santos pelos crimes de abuso de poder, falsificação por funcionário e denegação de justiça imputados pelo assistente José Sócrates”.
O caso partiu do próprio juiz Ivo Rosa aquando o despacho de pronúncia da Operação Marquês, depois das suspeitas levantadas por Sócrates e outros arguidos. O magistrado decidiu mandar abrir um processo para investigar como foi feita a atribuição, o Ministério Público investigou, mas não encontrou qualquer indício de crime e arquivou. No entanto a defesa do ex-primeiro-ministro socialista pediu a abertura de instrução e queria que tanto Carlos Alexandre como a sua funcionária judicial de então, Maria Teresa Santos, fossem mesmo julgados.
A defesa de José Sócrates acusava o juiz e a sua funcionária de terem combinado uma forma de o processo do Marquês ficar nas mãos de Carlos Alexandre por “gosto em exibir poder” e para “devassa da vida privada” do ex-primeiro-ministro. Mas para o juiz desembargador da Relação não há qualquer prova direta no processo que o ateste. E, fazendo um juízo de prognose, o caso nunca vingaria numa julgamento.
Depois de duas sessões de debate instrutório, e um adiamento, o juiz desembargador Jorge Antunes, do Tribunal da Relação – onde corre o processo por tratar-se de um magistrado – acompanhou a mesma decisão que já tinha sido tomada pelo Ministério Público, quando considerou que no caso não existem indícios de crimes e que ambos os arguidos não devem ser julgados. Uma tese diferente da que foi apresentada em tribunal por Pedro Delille, o advogado de Sócrates, que considerou Carlos Alexandre “superjuiz dos tablóides” e de ter pretendido ter o processo que lhe traria protagonismo.
A distribuição do processo Marquês coincidiu com a reorganização judiciária, em 2014, e a passagem dos processos no sistema informático CITIUS levou ao registo de várias falhas. A defesa de Sócrates sustentava que na altura, quando havia dois juízes no Tribunal Central de Instrução Criminal, não se registou falha alguma, contrariando a advogada de Carlos Alexandre, Fátima Esteves. Na leitura da decisão, o juiz desembargador leu vários testemunhos que sustentam problemas no CITIUS, pelo menos até novembro de 2014, altura em que um técnico do IGFEJ fez uma intervenção a pedido do próprio TCIC e colocou os computadores a zeros.
A distribuição de processos no TCIC foi também auditada pelo próprio Conselho Superior da Magistratura, que não encontrou motivos para qualquer processo disciplinar embora tenha depois mudado procedimentos no tribunal.
O advogado de José Sócrates, Pedro Delille, considera esta decisão como “corporativa” e pondera recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça depois de ter acesso à decisão integral,