Mais de 800 páginas de guião com as propostas de alteração, mais de sete horas de votação seguidas de uma longa discussão sobre a aceitação de duas propostas do PS e do Livre (que o plenário vai decidir esta terça-feira) e poucas surpresas no primeiro dia de votos na especialidade do Orçamento do Estado para 2022 (OE).

O PS votou contra todas as propostas que pediam aumentos salariais no Estado ou de pensões, tendo tido ao seu lado quase sempre a Iniciativa Liberal. Foram muito poucas as propostas da oposição que passaram e a maioria têm sobretudo um valor simbólico — há várias de formação — na medida em que não comprometem valores significativos de despesa nem receita.

O PAN foi, para já, o partido que mais conseguiu convencer os socialistas — cujo voto é determinante em maioria absoluta — a votar as suas alterações. O Livre também marcou pontos tal como a Iniciativa Liberal. O PSD conseguiu apenas ver aprovada uma proposta. O Chega e os antigos parceiros Bloco e PCP não marcaram nesta primeira ronda de votações.

O dia arrancou com notícias de uma proposta do Livre que teria o acordo do PS — a aplicação da taxa reduzida de IVA a produtos menstruais, que afinal, como foi esclarecido durante o debate da manhã já estava em vigor. A proposta acabou por ser apenas uma clarificação do texto da lei.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

À tarde, durante as votações, o tema voltou a estar em destaque com duas propostas recusadas pelos socialistas. Uma do PAN (Partido das Pessoas, Animais e Natureza) para a criação de uma licença menstrual para as mulheres (rejeitada também pelo PSD, Iniciativa Liberal e Chega) e outra do Chega para combater a “pobreza menstrual” com a distribuição gratuita em escolas e centros de saúde, que foi rejeitada apenas pelos socialistas.

O partido de Rui Tavares viu outras propostas viabilizadas, como o reforço da formação para forças de segurança nos temas LGBTQI+, igualdade e racismo, o reforço das juntas médicas para avaliar o grau de incapacidade das pessoas com deficiência. O PAN conseguiu o compromisso de mais apoio a vitimas de tráfico de seres humanos, divulgação de financiamentos a entidades privadas e a garantia de que serão contratados 20 intérpretes de língua gestual para os serviços do Estado, uma proposta que foi aprovada por todos depois de o PSD ter corrigido o voto inicial contra.

A Iniciativa Liberal viu aprovadas as propostas para dar formação a magistrados sobre violência sexual. Numa área vizinha, assegurou que a formação dos trabalhadores do Estado no combate à violência doméstica vai ter avaliação semestral.

As propostas do PSD para o reforço dos meios humanos e financeiros para o combate à corrupção foram aprovadas com o voto de todos os partidos. Uma das alterações prevê a criação de centros de competência e redes de conhecimento, integrando peritos e especialistas do sistema de controlo interno da administração financeira do Estado, da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), do Núcleo de Assessoria Técnica da Procuradoria-Geral da República, da Unidade de Perícia Financeira e Contabilística da Polícia Judiciária, da Unidade de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária e da Unidade Nacional de Combate ao Cibercrime e à Criminalidade Tecnológica da Polícia Judiciária.

O dia ficou ainda marcado por uma entrada mais dura do PSD sobre uma proposta socialista que chegou já durante a votação, e que, de acordo com Duarte Pacheco, é todo um novo artigo que substituiu a proposta de alteração entregue dentro do prazo. Uma alteração que, afirmou, “cheira a manhosice”, tese que o PS contestou.

Em causa está um novo artigo, 95-A, relativo ao Fundo Social Municipal, que aumenta a margem de endividamento das autarquias para 40% exclusivamente para assegurar o financiamento nacional de projetos cofinanciados na componente de investimento não elegível. A votação do artigo 95 sobre acordos de regularização de dívidas das autarquias foi chamada ao plenário.

Com a votação também suspensa ficou uma proposta do Livre que foi substancialmente alterada (provavelmente no quadro da negociação como PS) sobre o alargamento do subsídio de desemprego a vítimas de violência doméstica e a pessoas que abandonem o emprego para acompanhar um parceiro que se mude para o interior do país para aceitar um posto de trabalho. O problema identificado é que o partido de Rui Tavares introduziu um número novo sobre a criação de um programa de licenças para formação, o que no entender de Hugo Carneiro, presidente em exercício da comissão de orçamento, desvirtuava a proposta inicial.

A aceitação e votação das duas propostas inovadoras vai ser debatida esta terça-feira em plenário, depois de muita contestação a uma primeira decisão de Hugo Carneiro do PSD, de recusar aceitar uma parte da alteração nova do Livre, e da proposta do PS, uma vez que o tema das finanças locais já tinha sido discutido em plenário.