A filha do antigo Presidente de Angola Tchizé dos Santos assumiu, esta quinta-feira, que o pai, José Eduardo dos Santos, foi um “ditador” que soube sair a tempo do poder. A declaração da antiga deputada do MPLA surgiu no meio de novo apelo ao atual Chefe de Estado angolano, João Lourenço, para que não se “imiscua” num assunto familiar ao exigir que JES seja enterrado no país. “Eu não queria que o meu pai fosse ditador. Ao sair do poder pelo pelo próprio pé e ao apoiar eleições em que ele não participasse, o meu pai deixou de ser um ditador. O meu pai não morreu ditador, morreu reformado”, declarou numa entrevista à RTP.

A realização das cerimónias fúnebres de JES continua envolta em polémica e Tchizé assegura que vai recorrer para o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos se a Justiça espanhola não recuar na decisão sobre a entrega do cadáver à ex-mulher. Mas não vai ficar por aqui. “Vou apelar ao Presidente da República portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa, e ao Secretário-geral da ONU, António Guterres, ambos portugueses, que façam um telefonema ao Presidente João Lourenço. Que apelem ao bom senso e peçam que este pare de se imiscuir num processo familiar”, declarou numa entrevista à RTP, na qual assumiu receio de ser “presa ou até morrer” caso se desloque a Angola para assistir ao funeral.

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“Qual é a diferença entre mim e os manifestantes que levaram tiros na cabeça dados pelos militares do Presidente da República [João Lourenço] na zona do perímetro do palácio presidencial”, questionou durante a mesma entrevista, garantindo que a sua opinião é também partilhada pelos irmãos Isabel dos Santos e José Eduardo Paulino dos Santos, mais conhecido por Coréon Dú. “Sentimos os três que não temos segurança jurídica ou física para irmos para Angola. O meu próprio pai foi a Angola por uma semana, ficou lá retido cinco meses, perdeu 30 kg e morreu ao fim de dois meses”, declarou, voltando a insinuar que a morte do pai foi culpa do regime de Luanda.

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Esta opinião e todos os processos a envolver a família Dos Santo em Angola levaram a antiga deputada do MPLA a preferir apoiar o candidato da UNITA nas eleições gerais de 24 de Agosto. Tchizé não tem dúvidas que “Adalberto da Costa Júnior é um democrata, alguém com quem se pode dialogar e alguém com quem partilha a forma de ver o Estado”. “E é o que Angola precisa”, acrescentou.

Mais tarde, em entrevista à SIC, Tchizé voltou a insistir na ideia de que Angola é uma ditadura e que tanto ela, como os seus irmãos, são perseguidos pelo regime. “Eu entendo perfeitamente o que os judeus sofreram no III Reich porque o que está a ser feito com a família Dos Santos em Angola é exatamente o que o Hitler fez com os judeus. Nós não temos direitos em Angola”, declarou, dizendo que o pai quis estar perante a Justiça para lutar pelo seu bom nome e que tal não foi permitido. “Só não nos põem em campo de concentração porque… no meu caso, eu tenho segunda nacionalidade, mas o meu irmão José Filomeno [ndr: condenado a cinco anos de prisão em agosto de 2020 diz não poder viajar porque o passaporte não lhe foi devolvido apesar do levantamento das medidas de coação] está, neste momento, refém do estado angolano e não conseguiu dar um adeus ao pai”.