A Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) mandou instaurar um processo disciplinar à médica assistente hospitalar que assistiu a mulher grávida que perdeu o bebé no hospital das Caldas da Rainha, no início de junho deste ano. Foi também instaurado um processo disciplinar à assistente que recusou a inscrição da grávida. O Centro Hospitalar do Oeste (CHO) tinha determinado a abertura de um inquérito e participado o caso à IGAS, que revela as conclusões da inspeção esta sexta-feira.

Verificou-se que a atuação da médica assistente hospitalar de ginecologia/obstetrícia que a assistiu é suscetível de ter violado os seus deveres funcionais“, lê-se no comunicado enviado à comunicação social.

Ainda assim, a IGAS alerta que a peritagem médica realizada “não conclui, de forma clara e segura”, que exista um “possível nexo de causalidade entre a atuação da médica assistente hospitalar e o desfecho que veio a ocorrer”: a morte do bebé.

Em relação à médica, o IGAS apenas recomendou a instauração de um processo disciplinar pelo Conselho de Administração do hospital porque “não possui essa competência” — dada a natureza do vínculo laboral da médica, um contrato individual de trabalho. No entanto, já o pôde fazer à assistente que recusou a inscrição da grávida e que se encontrava a desempenhar funções na admissão de utentes nas urgências. Segundo as conclusões da IGAS, a trabalhadora recusou a admissão “sem ter solicitado ao médico em funções como ‘chefe de banco’ a avaliação do estado clínico da utente”.

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A mesma [utente] só seria admitida e observada no Serviço de Urgência, na sequência de uma intervenção dos trabalhadores do CODU realizada à 1h44 junto desse responsável [chefe de banco]. Por esse comportamento, a IGAS instaurou já um processo disciplinar à trabalhadora em causa”, lê-se no comunicado.

As conclusões da IGAS revelam que, no Centro Hospitalar do Oeste, trabalham dez médicos com a especialidade de ginecologia/obstetrícia. “Destes, apenas oito têm uma parte do seu tempo de trabalho afeta ao serviço de urgência. E, destes oito, um deles apenas realiza trabalho de urgência diurno e outro apenas o efetua com uma periodicidade quinzenal”, lê-se. Assim, de forma a garantir o preenchimento da escala do Serviço de Urgência do hospital das Caldas da Rainha, é necessário recorrer à “contratação de trabalho médico em regime de prestação de serviços”.

Grávida perde bebé alegadamente por falta de obstetras no hospital das Caldas da Rainha

A grávida deu entrada nesta unidade hospitalar entre a 1h00 e 1h15 da madrugada de 9 de junho — neste dia, tal como no dia anterior, o Centro Hospitalar do Oeste, “não conseguiu completar a escala de ginecologia/obstetrícia”, indica a IGAS. Este tinha sido, aliás, um problema para o qual a diretora clínica do Centro Hospitalar do Oeste tinha comunicado dois dias antes: que, “entre as 8h00 da manhã do dia 8 e as 8h00 da manhã do dia 9 de junho”, a unidade das Caldas da Rainha “não iria dispor de médicos dessa especialidade”. E, por isso, pediu o encaminhamento de “todas as urgências obstétricas” para outras unidades”.

A insuficiência de médicos para completar a escala do Serviço de Urgência de Ginecologia/Obstetrícia na unidade das Caldas da Rainha era do conhecimento do Conselho de Administração do CHO. Contudo, este órgão não procedeu à elaboração de um plano de contingência para assegurar a continuidade deste serviço, não definiu uma estratégia de comunicação interna, nem comunicou à população a existência de restrições”, lê-se ainda.

A IGAS aponta ainda que a diretora clínica do Centro Hospitalar do Oeste “não só não definiu procedimentos de atuação claros, como emitiu orientações contraditórias relativamente à admissão e triagem” e “não deu o devido conhecimento destas orientações a todos os trabalhadores afetos ao Serviço de Urgência, designadamente ao ‘chefe de banco’”.

Além dos processos disciplinares, a IGAS deixou ainda algumas recomendações ao CHO. Nomeadamente, a “redefinição da estratégia de comunicação interna”, uma “comunicação atempada à população” sobre os “constrangimentos no funcionamento do Serviço de Urgência, sobretudo quando implicam o seu encerramento”, uma “avaliação das áreas de risco no CHO” e uma “avaliação dos planos de contingência das entidades hospitalares”.