Era apenas uma etapa e não mais do que uma etapa. Aliás, tanto era só uma etapa que o foco esteve quase sempre em Luis Ángel Maté, veterano espanhol da Euskaltel-Euskadi que voltou a arriscar uma longa fuga quase desde início e que garantiu mais 175 árvores para a reconstrução da Sierra Bermeja, zona do sul de Espanha fustigada no último ano por um incêndio de grandes proporções. Ander Okamika (Burgos-BH) ficou com esse “prémio” de corredor com mais minutos de fuga nesta Vuelta mas a iniciativa de Maté, que se propôs a plantar uma árvore por cada quilómetro a rolar destacado do pelotão, continua a juntar cada vez mais atenções. A cerca de 15 quilómetros, os dois fugitivos foram intercetados. A partir daí, as várias tentativas de descolar falharam. Nos últimos três quilómetros, tudo mudou. E fez mudar.

Evenepoel furou, Roglic caiu, Pedersen ganhou: final de loucos na etapa em que Luis Ángel Maté doou mais 175 árvores

Capítulo 1: Primoz Roglic teve um movimento com tanto de corajoso como de arriscado e tentou uma fuga para reduzir alguns segundos em relação à camisola vermelha. Capítulo 2: Remco Evenepoel teve um furo, encostou na berma da estrada para trocar de bicicleta e podia sofrer maiores consequências se tivesse sido um pouco antes, na zona “não protegida” dos últimos três quilómetros. Capítulo 3: na última reta antes da meta, quando se preparava para discutir a vitória com Mads Pedersen e Pascal Ackermann, Roglic caiu, sofreu algumas lesões e não conseguiu chegar às bonificações, cortando assim apenas oito segundos para o belga. No entanto, de pouco ou nada valeria perante o que acontecera e o esloveno desistiu da Vuelta.

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Múltiplas contusões e feridas do cotovelo ao joelho foram algumas das explicações dadas pela Jumbo equipa do tricampeão da prova ainda em título antes da 17.ª etapa que ligava Aracena ao Mosteiro de Tentudía. “Recupera rápido campeão! Obrigado por todos os momentos bonitos que nos deste na Vuelta deste ano. Tinhas planos ambiciosos para os últimos idas mas lamentavelmente não estava destinado a ser”, escreveu o conjunto que fica agora apenas com corredores que estão fora do top 30, casos de Chris Harper, Sam Oomen ou Rohan Dennis. Mas também nas outras equipas a notícia mudava “contas”.

Logo à cabeça, a Quick-Step ganhava uma folga bem maior na defesa da camisola vermelha de Evenepoel, cada vez mais próximo do primeiro triunfo numa grande volta aos 22 anos (por sinal, a primeira que vai terminar). Depois, a Movistar, mais confortável com a subida de Enric Mas à segunda posição e com a ténue esperança de arriscar algo nas duas últimas etapas de alta montanha para recuperar os 2.01 minutos de desvantagem. A seguir, a Ineos, equipa que à partida não teria grandes ambições no plano individual mas que ganhava uma janela de oportunidade para colocar Carlos Rodríguez no pódio perante o atraso de 27 segundos para a terceira posição. Por fim, a UAE Emirates. E um “misto” para João Almeida.

Por um lado, o português subia à sexta posição, igualando a segunda melhor grande volta da carreira (só superado pelo quarto lugar no Giro de 2020), e podia ainda tentar aproveitar um dia mau de Miguel Ángel López para se aproximar do top 5. Por outro, era possível que ganhasse uma nova responsabilidade na ajuda a Juan Ayuso, agora terceiro classificado confirmando o seu nome como grande revelação da Vuelta, e na defesa da liderança por equipas da UAE Emirates. Contas que começariam a ser feitas esta quarta-feira, na última etapa plana para sprinters até Madrid, antes de três dias de alta e média montanha.

A ligação entre Aracena ao Mosteiro de Tentudía começou com várias tentativas de fuga anuladas até que um grupo ainda extenso conseguiu fazer prevalecer a sua vontade e partir para a frente com Clément Champoussin, Bob Jungels (AG2R-Citröen), Rigoberto Urán (EF Education), Gino Mäder, Fred Wright (Bahrain), Marc Soler (UAE Emirates), Elie Gesbert, Simon Guglielmi (Arkea), Quentin Pacher (Groupama), Lawson Craddock (BikeExchange), Alessandro de Marchi (Israel Premier), Kenny Elissonde (Trek) e Jesús Herrada (Cofidis). 40 segundos de vantagem, três minutos, sete minutos, um avanço que entretanto estabilizou mas que praticamente sentenciou aquele que seria o destino da etapa.

Lá atrás, entre todos os corredores no top 10, Juan Ayuso acabou por dar mote para redobrar os cuidados nesta etapa que antecedia as verdadeiras decisões na Vuelta: o espanhol da UAE Emirates sofreu uma queda, não demorou depois a levantar-se e a colar de novo no grupo mas teve de ser assistido pelo carro médico da corrida naquilo que os meios que acompanhavam a 17.ª etapa descreveram como “uma queda só com chapa e pintura” (que é como quem diz, sem danos de maior). E o grande duelo entre os da frente chegou a dois quilómetros do final, já depois de Rigoberto Uran ter ganho a etapa: Enric Mas teve um primeiro ataque aproveitando a inclinação na parte final, Remco Evenepoel reagiu e foi João Almeida que foi embora, ganhando alguns segundos aos adversários que podem mudar as contas, nomeadamente na luta pela quinta posição que ficou agora um pouco mais próxima (ou menos longe).

O português terminou a etapa na 13.ª posição, a 5.02 minutos de Uran (que subiu ao nono lugar da geral), ganhando nove segundos a Remco Evenepoel e Enric Mas, 11 a Juan Ayuso e Carlos Rodríguez e 18 a Miguel Ángel López, corredor da Astana que ocupa o quinto posto agora a 1.18 minutos. Em paralelo, Almeida alargou e muito a vantagem para Arensman, que passa a estar a 55 segundos do corredor da UAE Emirates. Se nas outras grandes voltas realizadas o português mostra sempre que surge mais forte na terceira e última semana, o início da parte final da Vuelta está a começar a confirmar essa regra.