A economia portuguesa irá ter em 2023 uma “desaceleração significativa da atividade“, avisa o Banco de Portugal no Boletim Económico divulgado esta quinta-feira. No relatório, o supervisor financeiro revê em alta as projeções de crescimento para 2022, para 6,7%, mas também reconhece que a inflação será neste ano mais intensa do que se previa: 7,8%, com pico no “final deste ano”. Para contribuir para que o pico da inflação seja mesmo neste final de ano – e não mais tarde – o Banco de Portugal sublinha que os efeitos da subida dos preços são “diferenciados” entre os diferentes “segmentos” da população e, por isso, o Governo apenas deve tomar “medidas temporárias e específicas” para proteger os “mais vulneráveis”.
Como é habitual no Boletim Económico que o Banco de Portugal divulga anualmente em outubro, não são quantificadas as projeções do supervisor para o crescimento económico (nem inflação) do ano seguinte – isto porque muito depende do Orçamento do Estado que só será apresentado na próxima segunda-feira e votado nas próximas semanas. Ainda assim, embora não divulgue números concretos, o Banco de Portugal já adianta que 2023 será marcado por uma “desaceleração significativa” da atividade económica face a 2022.
No ano de 2022, o crescimento de 6,7% – a confirmar-se nos próximos meses – será obtido graças à recuperação do turismo e do consumo privado. “A evolução da atividade ao longo do ano é marcada pela
recuperação do nível pré-pandemia no primeiro trimestre e por um abrandamento posterior, que se traduz numa relativa estabilização do Produto Interno Bruto (PIB)” a partir do segundo trimestre, afirma o Banco de Portugal.
“O enquadramento externo e financeiro tem vindo a deteriorar-se devido aos choques gerados pela invasão da Ucrânia, que resultaram no aumento da inflação e das taxas de juro”, afirma o Banco de Portugal, valorizando sobretudo a guerra na Ucrânia como a causa da inflação elevada (embora ela já estivesse a acelerar – sobretudo nos EUA mas também na Europa – desde meados de 2021). Ainda assim, o supervisor destaca que “os efeitos adversos destes choques têm sido atenuados pelo bom desempenho do mercado de trabalho, pela poupança acumulada durante a crise pandémica e pelas medidas de apoio“.
A inflação em 2022 é calculada pelo Banco de Portugal no valor de 7,8%, num reflexo das “crescentes pressões externas sobre os preços”. Por outro lado, além dos fatores externos, o supervisor também refere que “a forte procura dos bens e serviços, cujo consumo foi condicionado durante a pandemia, também contribui para a trajetória ascendente da inflação“.
A expectativa do Banco de Portugal é que o pico das pressões sobre os preços acontecerá no final deste ano, admitindo-se uma “inflexão” – ou seja, a partir do final do ano, o supervisor acredita que as taxas de inflação vão começar a desacelerar. Trata-se aqui, das taxas de inflação calculadas em termos homólogos, ou seja, essa “inflexão” poderá ser conseguida em parte devido ao “efeito-base” do cálculo (ou seja, pelo facto de se estar, a cada mês, a comparar com a subida dos preços que se registava no mesmo mês do ano anterior).
Outro fator que poderá – e deverá, diz o Banco de Portugal – contribuir para que se atenue a pressão de subida dos preços está nas mãos das empresas. Com Portugal e a Europa a viver um “choque negativo sobre os termos de troca”, desde logo devido à quebra da cotação do euro face ao dólar, o Banco de Portugal sublinha que este fenómeno “implica uma perda de rendimento real da economia que deve ser partilhada por todos os agentes“.
Em concreto, neste ponto, o supervisor pede que se “evitem aumentos das margens das empresas e de salários que possam gerar pressões persistentes sobre os preços”.
“Rendimento disponível real estagnou”, diz o Banco de Portugal
A projeção de um crescimento de 6,7% em 2022 é uma revisão em alta face aos 6,3% que se previam em junho (tal como a inflação, que se estimava nos 5,9%).
“O consumo privado cresce 5,5% em 2022, beneficiando da eliminação das restrições associadas à pandemia e da realização de despesas adiadas”, diz o Banco de Portugal, salientando que “o rendimento disponível real estagna, condicionado pelo perfil da inflação, enquanto a taxa de poupança se reduz de 9,8% para 4,9%”.
Já “o investimento abranda, crescendo 0,8%, num ambiente de restrições de oferta, aumento dos custos de produção, agravamento das condições de financiamento, baixa execução dos fundos do PRR e elevada incerteza”, diz o supervisor.
Por outro lado, “as exportações de bens e serviços mantêm um dinamismo elevado (17,9%), acima da procura externa, implicando ganhos adicionais de quota de mercado”. Porém, “esta evolução é impulsionada pelas exportações de serviços, em particular os relacionados com o turismo“.
“Num enquadramento externo e financeiro mais desfavorável, é urgente acelerar a prossecução das reformas no âmbito do PRR e promover uma utilização efetiva e eficaz dos respetivos fundos, para sustentar o crescimento económico no curto e médio prazo”, afirma o Banco de Portugal.